domingo, 30 de dezembro de 2012

As aventuras de PI

Ang Lee fala de si mesmo e daquilo em que acredita ao criar o personagem PI. As aventuras de PI conta a saga do menino que sobrevive no mar em companhia de um tigre de Bengala, por mais de duzentos dias. O diretor faz uma reflexão sobre questões existenciais, de fé e humanidade. Fala também de como nossas vidas se transformam, como qualquer um de nós pode ser capaz de se reerguer nas piores e mais difíceis situações. Através do menino PI, fala de si mesmo e de você. PI mostra sua religiosodade desde pequeno. Mãe e pai o advertem dizendo que não é possível acreditar em três deuses ao mesmo tempo.

As aventuras de PI é própria relação do menino com Deus, com a vida e com os animais. Ele acredita mais na companhia dos animais do que dos seres humanos. Explica que a origem de seu nome, a décima sexta letra do alfabeto grego, não se refere ao número 3,1416, mas ao nome de uma piscina localizada em Paris, onde seu tio Mamadi nadava. Era a mais límpida piscina do mundo e chamava-se Piscine Monitor Patel, daí o nome PI. Embora o menino conseguisse preencher muitos quadros negros com os números de PI, colegas e professores o chamavam de Pipi.
O filme fala de Karma e destino, da energia transcendente, invisível e imensurável que deriva das ações dos seres humanos. Nas aventuras de PI, os caminhos do Karma são os caminhos de Deus. Em sua vida, tudo é mediado pela relação com Deus. Os efeitos do Karma são vistos como experiências mutantes no passado, no presente e futuro. Cada um pode escolher entre fazer o bem ou o mal, mas deve arcar com as consequências. Entre tantas opções religiosas PI opta por ser hindu católico. Relata como conheceu a Deus nas montanhas, quando fez uma aposta com o colega e bebeu água benta na igreja. Descobre o amor e a fé em Deus através de seu filho Jesus. Leva uma vida calma e feliz, quando conhece Anadi, a jovem que conquista seu coração.
Até que o destino o leva ao mar em companhia da família e dos animais do circo. A grande tempestade arrasa com tudo e PI se vê em alto mar, dentro de um bote, com uma zebra, uma hiena, um orangotango e um tigre de Bengala. PI conhecerá a força de sua fé quando precisar testá-la. Assim, se prepara para enfrentar o desconhecido. Descobre que não é tão forte para enfrentar Richard Parker, o tigre, mas que sua astúcia e fé poderão salvá-lo.

Impotente, vê a hiena matar a zebra e o orangotango. Descobre a força de Richard Parker, quando este de um salto acaba com a hiena em segundos. Descobre também que precisa alimentar o tigre para os dois sobreviverem.
 
Assim em completa solidão vemos cenas belíssimas, de PI e seu companheiro no mar. E como PI encontra-se frente a Deus, como conversa com ele. Quando não tem mais como lutar contra a natureza, se entrega a Deus, sabendo que não poderia estar em melhores mãos. A simplicidade da relação emociona, nada é muito complicado. Quando a tempestade insiste em destruí-lo, reza: "Deus, me entrego a você , sou o seu canal, o que vier depois eu quero saber, me mostre". E o menino fala alto quando está sozinho, acima de tudo sabe que não pode perder a esperança!

Descobre que o olhar do tigre não é apenas o reflexo do próprio olhar. Para ele Richard Parker tem alma. O tigre cai no mar e se apóia no barco. Seu olhar para PI é um verdadeiro pedido de socorro. Como alguém se atreve a dizer que no olhar do tigre vemos o apenas o nosso próprio reflexo?

Em desespero dá violentas marteladas no peixe que deve ser a próxima refeição de Richard Parker. O olhar do peixe o traz de volta à razão, chora e agradece a Deus por ter vindo sob a forma de um peixe para salvá-los. Enfim, a fome pode mudar tudo o que você sabe sobre você mesmo, não é verdade? E se fazemos pouco caso de questões tão importantes , não devemos esquecer que nesta questão nunca fomos testados. Você consegue perceber a beleza que Ang Lee deseja compartilhar conosco?

Se Richard Parker não pode ser domado, com a vontade de Deus pode ser treinado e os dois se testam, dividindo o espaço exíguo no barco. PI também descobre que Richard Parker salva sua vida. Atender às necessidades dele lhe dá um propósito na vida. E você descobriu seu propósito na vida?

Finalmente o barco bate nas areias da praia da salvação. Richard Parker desce, caminha em direção à floresta e desaparece. Sem sequer voltar a cabeça para trás, sem olhar para PI, como numa despedida. Richard Parker o abandona sem a menor sem cerimônia! E PI deixa para trás a infância e a adolescência, amadurece.

Você lembra, se de fato se despediu de seu pai quando o viu pela última vez? ou se despediu-se de seu bicho predileto? Claro, como aconteceu com Richard Parker e PI, não era possível uma despedida...
 

 

quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Hobbit: uma jornada inesperada

Hobbit: uma jornada inesperada,  por enquanto é o melhor da série de Peter Jackson. John Ronald Reuel Tolkien, tornou-se famoso com suas histórias Hobbit, O Senhor dos Anéis e Smilgram. Ele cria a idéia de um Mundo Secundário, onde Arda é a Terra povoada de magia e seres fantásticos como os Valar,  Maiar, os hobbitt, elfos, anões, ocs e trolls. Hobitt se passa na Terceira Era, 2463 quando o reino dos anões - a Montanha Solitária - é destruído pelo dragão Smaug. Bilbo Bolseiro (Martin Freeman), o hobitt vive em uma casa subterrânea, uma espécie de tubo com uma decoração rústica e ambiente cheirando a lar doce lar. Liderado pelo Mago Gandalf (Ian McKellen), Hobbit é convidado a reunir-se a um  grupo de treze anões, apesar dos protestos destes, que não acreditam em sua capacidade. Bilbo, o Bolseiro tem papel importante na luta dos anões para recuperar o Reino de Erebor.
Liderados por Thorin Escudo - de - Carvalho (Richard Armitage), os anões precisam vencer os obstáculos interpostos pelos inimigos Trolls e Ocs. É uma eterna luta do bem contra o mal, onde os heróis precisam sofrer muito antes de atingir seus objetivos. Como Ulisses antes de voltar para casa. Precisam descobrir a saída dos túneis para encontrar a salvação.
Hobbit encontra-se com um anão, Gollum, interpretado por Andy Serkis, o ator que especializou-se em interpretar personagens de computação gráfica, onde seu corpo serve de molde para a criação digital. Andy Serkis era o King Kong, o César de Planeta dos Macacaos e agora o Sméagol, ou Gollum. Em priscas eras, Sméagol matou seu primo Déagol para apoderar-se do Um Anel, pertencente ao Senhor das Trevas Sauron. Dominado pelo mal, Sméagol passou a fazer um som horroroso na garganta. Ganhou o apelido de Gollum e seu corpo sofreu profundas modificações. Ficou magro e disforme. Os olhos se dilataram, viraram duas enormes pedras azuis, o cabelo caiu e a boca virou um horror de  dentes sujos e caquitos em ponta.
O encontro entre Gollum e Hobbit é uma das melhores partes do filme. Por obra do destino o Um Anel de ouro, mágico e poderoso encaixa no dedo de Hobbit. Gollum, morto de fome de gente, quer comer a macia e gostosa carne de Hobbit. Para vencê-lo o homenzinho lhe propõe, decifrar charadas. Gollum não consegue vencer o jogo e Hobbit torna-se invisível por mérito do Um Anel maravilhoso.  Assim em 2941 Hobbit rouba o Um Anel que tem vontade própria.
Gandalf aconselha e oferece a Hobbit a espada prodigiosa, que fica azul quando o perigo se aproxima. O pequeno segue à risca o conselho do Mago: a coragem não está em saber quando tirar uma vida, mas em saber quando poupá-la! E Hobbit poupa a vida de Gollum quando foge da caverna.
Finalmente o clímax ocorre durante na batalha final, em cenas tão perfeitas que a gente pensa. É isso, Deus, cinema é esta sequência magistral de Peter Jackson. O diretor cria um herói anão, mais  alto que um verdadeiro anão. Talvez a razão seja porque ele é o herói?! Como se anões, ou heróis, com  corpos e caras de anões não pudessem ser belos e heróis!? É isso! a estética grega ainda domina sobre o mundo. Com uma vasta cabeleira negra e um mantô escuro,  Thorin - lindo de morrer - luta contra o monstro de quem tinha cortado a mão. Mas, perde a batalha. Vencido, parece morto, quando aves gigantescas entram na luta  para vencer. Arrancam Thorin das garras do inimigo, como o fazem contra suas presas  na hora da rapina. Desta vez a rapina é a forma de proteção. As patas gigantescas seguram o pequeno Thorin, como um bebê que deve ser protegido. Tudo está conectado e tem parte com a magia de Gandolf que conta com a proteção da única mulher do filme, Galadriel, a belíssima Cate Blanchett . Visão do paraíso, ela é como uma efígie com vestes azuladas e transparentes, que se movimentam como num desenho de Klimt, mas de um Klimt leve e esvoaçante que nunca existiu .  Não perca, as sequências de luta são perfeitas. Aliás tudo é beleza no filme de Peter Jackson, que nesse aspecto supera o Avatar de James Cameron.

 

sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

Entre o Amor e a Paixão

Como quer o título, o filme de Sarah Polley fala de amor e paixão.Diz ainda mais dos problemas psicológicos dos personagens. Tudo muito escondido e camuflado, sob o manto do belo. Tudo é muito bonito. A atriz Michele Williams, a ex de Heath Ledger é uma garota linda, magra, loira, parece uma visão de sonho, com roupas despojadas de menina moça. Vive com o marido, mas sente atração pelo vizinho.
O décor é perfeito: objetos de decoração na casa do jovem casal criam a ilusão do lar perfeito, do sonho de felicidade. A louça vermelha e verde, os quadros nas paredes, tudo é meticulosamente pensado. O sol bate nas madeixas louras de Michele, que abre um sorriso lindo.
Mas algo se esconde por baixo da perfeição.  Margo ( Michele Williams) tem medo de conexões aéreas. Sente-se insegura quando está entre um e outro (avião). No caso, o problema se repete na vida real. Ela também vive entre  um amor e uma paixão.
O marido Lou (Seth Rogen) é a única criatura por onde a beleza passou correndo. É chef de cozinha, um chato, especialista em cozinhar frangos, que se esquiva dos carinhos da mulher.  Como pode?
O candidato a amante é lindo, gostoso, tentador. Quando finalmente consegue ocupar todo o espaço no coração de Margo, a situação volta ao ponto zero.
A lacuna que existia na vida de Margo se abre como uma chaga, aumenta, toma conta de tudo. Ninguém sabe, ninguém explica as razões dos sentimentos de Michele. Depressão? Lacuna? Vazio existencial? Você sabe o que é isso?   
 

Na Terra de Sangue e Mel

Angelina Jolie, a bela, faz um filme sobre o tema mais doloroso da face da terra. Sobre o tema mais difícil de entender - pelo menos para nós, brasileiros- a "Guerra da Bósnia", um país onde as diversas etnias têm problemas seculares e irreconciliáveis entre sérvios cristãos ortodoxos, croatas católicos e bósnios muçulmanos.
Em sua vertente de defensora das causas humanitárias, Angelina faz uma veemente denúncia dos abusos e crimes contra a humanidade que aconteceramn na antiga Iugoslávia, entre 1992-1995. Desde a Segunda Guerra Mundial nada de tão violento e criminoso tinha acontecido. Os militares sérvios dominam pela força, adotam métodos de extermínio e limpeza étnica semelhantes aos do nazismo.
Em Na Terra de Sangue e Mel assistimos à cenas repulsivas e de extrema covardia. Os créditos mostram a extrema violência contra as mulheres, duas em cada dez mulheres foram violentadas. Os números oficiais confirmam entre 20.000 e 44.000 mulheres que foram sistematicamente violentadas pelas forças sérvias.
A população fica à mercê da barbárie. Bombardeios e execuções destróem praticamente tudo. A Bósnia é um país devastado, onde não seria difícil contar os poucos que sobraram.
O foco está em dois personagens que tinham uma relação amorosa antes da guerra. E o que poderia ter sido amor se corporifica em conflito entre homem e mulher, em  relação doentia entre vítima e torturador. Psicólogos explicam a relação de dependência abjeta que existe entre  a vítima e seu algoz. Danijel (Guran Kostic) o militar sérvio,  tem a ambiguidade característica de filho dominado pelo pai, ditador-totalitário.
Na Lista de Schindler sentimos a ambiguidade do nazista, que empregava mão-de-obra judaica em benefício próprio. Mesmo assim, ele construiu sua lista e salvou muitas vidas. Danijel,  ao contrário, viveu atraído por Ajla (Zana Marjanovich), mas foi incapaz de amá-la, dominado pelo preconceito contra os muçulmanos.
Ajla também é ambígua. Se lutou em prol de suas crenças e de seu povo, isso a diretora deixa para o espectador concluir.
Sentia atração é ódio por Danijel, infiltrou-se para fazer o papel de espiã, e o fez? Quando foi abandonada pelo amante no museu em ruínas, caminhando de salto alto, com um mantô azul, delicada e feminina, teria avisado seus companheiros?
Danijel é o covarde, o filho fraco. Apanha do pai como um menino levado, mas não tem coragem de enfrentá-lo. Mesmo sabendo que foi ele quem ordenou o estrupro de sua vítima por um soldado raso. Humilhado e desesperado Danijel reage. Emprega o método de execução nazista, que conhecemos do cinema. Um tiro rápido na cabeça da vítima , que não percebe a própria morte. Forte com os fracos, perde a voz diante do pai dominador. Que nojo!
A dúvida permane Ajla lutou por seus princípios ou entregou-se à dolorosa dependência na relação com seu dominador- amante-torturador?
É preciso conhecer a Guerra da Bósnia para saber onde está o inferno. Imagine , Angelina Jolie disse que algumas cenas foram cortadas simplesmente porque não suportaríamos.
 
 
 
     

domingo, 16 de dezembro de 2012

Infância Clandestina



O relato de Benjamin Ávila possui muito de autobiográfico. O próprio diretor pode ser o menino Juán (Teo Gutérrez) que teve uma infância clandestina e cancelada. Desde os 13 anos, desejava ser diretor de cinema. Benjamin mostra o horror da vida na Argentina entre 1976-1983.
 
Trinta e seis anos depois, a história emociona. Nós brasileiros estaríamos distantes de tanta dor? Não, aqui o sofrimento e o cancelamento de muitas vidas e infâncias também existiu. Os jovens dos anos 70, hoje estão com mais de sessenta anos. Ao participarem das lembranças de Benjamin, podem refletir e pensar que as vidas de cada um de nós também foram roubadas durante a ditadura militar no Brasil.
 
Benjamin conta que muitas cenas são lembranças verdadeiras, outras ficção imitando uma realidade assustadora. Lembra a última vez que viu a mãe, quando ela foi visitar uma amiga e nunca mais voltou. A história do massacre, desrespeito a qualquer tipo de direitos humanos sangra em violenta exposição. Os pais, Daniel (César Troncoso) e Charo (Natália Oreiro), exilados políticos, optam por voltar à Argentina de forma clandestina. Nomes e vida falsa, lutam com o grupo de guerrilheiros montoneros. Benjamín fala que seu pai e o tio Beto ( Ernesto Alterio) não lutavam para sacrificar a própria vida em nome de um sonho, mas  sim por uma nova vida.
 
Assim Júan se transforma em Ernesto, em homenagem ao Che. O ator tem 12 anos. Juán teria a mesma idade quando passou a viver na clandestinidade atendendo pelo nome de Ernesto, o menino que veio de Córdoba. Na família de Ernesto,  mãe e  pai estão seguros de estarem fazendo a coisa certa. A avó não compartilha dos mesmos sentimentos, por isso são duras as palavras e farpas entre mãe e filha. Trinta e seis anos depois a avó teria um pouquinho de razão?
 
O Ernesto adolescente consegue ter uma vida normal, na escola, por alguns momentos apenas. Pelo menos ele gostaria de ser um menino normal, que pudesse estudar, brincar e namorar, difícil para um adolescente entender e compreender. Tanto mãe como pai, para suportar a situação são duros, persistentes e focados nos objetivos. Cego de dor e sofrimento o adolescente critica ambos. A relação com o tio é doce como o "dulce de chocolate com mani", que ele vende. Beto ensina ao pequeno Ernesto  alguns truques de bem viver, aprender a namorar, e de como aproximar-se de Maria, a menina dos sonhos de Ernesto. O tio em verdadeira preleção afirma que a vida e o sexo devem ser saboreados como o  "dulce de chocolate com mani". Você coloca um pedaço do chocolate na boca, deixa derreter, sente gosto e sabor em verdadeiro  prazer. É preciso aprender a degustar a vida e o sexo. Saborear, ensina o Tio.  Ernesto nunca esqueceu as lições. Beto, o mais sonhador e intempestivo,  contraditoriamente não hesita um segundo em acabar com a própria vida ao ser descoberto. 
 
Se o Ernesto dos doze anos queria libertade para viver seu amor com Maria,  não aceitava as limitações de vida que seus pais lhe impunham, ao realizar "Infância Clandestina"- acredito- ele encontra a paz e se reconcilia com a mãe. É como se o diretor, ao realizar o filme se libertasse do sofrimento, da dor e do medo. É como se a mãe, em sonho viesse  abraçá-lo e apertá-lo entre os braços. Benjamin Ávila está livre da dor e do ressentimento. Nos créditos dedica o filme à memória da mãe. 




Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/cultura/benjamin-avila-conta-como-sua-familia-inspirou-filme-infancia-clandestina-6942429#ixzz2EmFjt3Jk
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