Neil Jordan dirige Ondine, um filme que mistura lendas, mitologia e realidade. Ondine é uma das divindades da água. Na mitologia germânica as ondinas se assemelham às ninfas. O barco de Syracuse (Colin Farrell) corta as águas do mar, em uma paisagem sem sol, triste e desbotada. O filme não tem luz, a Irlanda não tem luz. Paisagem pressaga e misteriosa, com o farol a atestar a solidão. O que os pescadores vêem todo dia é céu, mar, muita chuva e neblina. Tudo é cinza e sujo, esverdeado pelo limo e corroído pela ferrugem. A vida de Syracuse não é diferente. Ex alcoólatra, sua única alegria é cuidar de Annie (Alison Barry), a filha de quem gostaria de ter a guarda.
Syracuse tem a vida virada do avesso quando recolhe Ondine das águas. Impressiona-se com aquela bela mulher recolhida do mar, dobrada dentro da rede de pesca. Não somente ele, a cena é emocionante. Ondine transita entre o fantástico, o misterioso, as crendices, os presságios e a dura vida real. É um conto de fadas moderno. Se Syracuse é o anti herói, é ele que consegue enfrentar o mar e salvar a misteriosa Ondine. Uma ninfa, uma sereia ou uma mulher aquática? O mistério e o preconceito rondam a vida dos três.
Annie - a garotinha de 11 anos - é uma graça de menina. Leva vida dura, com sérios problemas de saúde, em muitos momentos não consegue andar. É levada nos braços do pai para a hemodiálise. Mas Annie, a menina triste, sente-se iluminada com a presença de Ondine, que se transforma na mãe dos sonhos, que poderá substituir a verdadeira mãe - má. Tão má, que bêbada quase mata a própria filha.
Syracuse e Ondine são frágeis, precisarão rever e assumir suas novas vidas. Dar uma volta nos acontecimentos. Assumir o que realmente desejam para formar uma família. A criança Annie sonha - a seu modo - tenta alterar o rumo dos acontecimentos. Cabe aos adultos a decisão e as responsabilidades. As crianças não são agentes dos acontecimentos, são vítimas.
Ondine explora o lado frágil do personagem Syra - como ele gostava de ser chamado. Syra preocupa-se demais com o que os outros pensam. Rola o preconceito contra a sua namorada aquática, que como as sereias, pode ser uma fada das águas, maléfica, que seduz os pescadores no meio da neblina e da bruma para levá-los para as profundezas do mar. Ou ainda pode ser uma foca que tirou a pele e escondeu-a. Ondina simboliza os sortilégios da água e do amor ligados à morte.
As ondinas tem uma cabeleira verde-mar que elas vêm graciosamente pentear nas superfícies das águas; são todas belas, maliciosas e às vezes cruéis. O belo jovem arrastado pela ondina não revê mais o dia e morre, exaurido em seus braços e arrastado para o fundo mar. Qual será o destino de Syra? nome inspirado em uma colônia grega?
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