segunda-feira, 29 de junho de 2009

JEAN CHARLES

Jean Charles é um filme que fala sobre o Brasil fora do Brasil. Fala daquele Brasil criado no imaginário dos brasileiros que saem em uma busca de um sonho.

Jean Charles é Selton Mello. O filme é dirigido por Henrique Goldman. O caso assumiu proporções alarmantes quando foi confirmado que a polícia britânica o assassinou pelas costas, no metrô de Londres, quando o confundiu com um muçulmano.

Jean Charles nasceu em 1978, e morreu em 22 de julho de 2005, aos 27 anos. Era natural de Gonzaga, município de Minas Gerais.

Henrique Goldman é um cineasta paulistano, de 46 anos, radicado em Londres. Até por isso, Goldman sabe falar da vida dos brasileiros fora do Brasil. Daquele Brasil criado lá fora onde está presente a bandeira verde amarela, o futebol, o samba, a feijoada, a pipoca, o pagode e tudo que significar Brasil. Muitos desses imigrantes não possuem documentação e se recusam a aprender inglês. Falam o português somente.

Jean Charles de Menezes era eletricista e tinha um pouco mais de lustro. Falava inglês e servia como intérprete para seus compatriotas. Era popular entre a comunidade brasileira. Tentava ajudar e dar apoio aos brasileiros desorientados que chegavam a Londres. É certo que para sobreviver dava seus pequenos golpes, que lhe valeram muitos dissabores. Mas no filme torcemos por Jean Charles, sofremos com ele, quando vemos seus fracassos.

O filme é triste, os primos chegam a Londres e são apoiados por Jean Charles. Não sabemos se ele tinha namorada. Quando a prima chega acompanhada, depois de ter passado a noite fora, ele faz uma pequena cena de ciúmes.

O que cai fundo nos brasileiros é a forma como somos destratados fora do Brasil. Aqui não me refiro aos jovens de classe média que vão à Europa para aprender inglês e trabalham em restaurantes, mas que têm suas famílias atentas aqui no Brasil, prontas para atendê-los em qualquer eventualidade,

Penso nos “desposseídos”- adoro essa palavra em espanhol porque diz tudo muito mais do que em qualquer outra língua. Henrique Goldamn se refere a essas pessoas, ele fala da grande massa de brasileiros, que vive amontoada em quartos, juntando dinheiro para enviar a seus familiares no Brasil. O filme trata dessas pessoas, que vivem e se divertem muito pouco, que saem em busca de um sonho e de uma esperança e encontram uma dura realidade.

Jean Charles, interpretado por Selton Mello é um cara doce, de bom coração. Ele fica mal quando prejudica seus companheiros, que lhe pagaram por um passaporte que não veio, e que normalmente Jean Charles conseguia por meios excusos.

O filme tem cenas emocionantes. Choramos junto com Jean Charles quando ele telefona para sua mãe. Quem sabe, nos lembramos de nós mesmos ligando para nossos familiares. Ele tem a voz embargada ao telefone, mas já estava triste. De longe ela sente que o filho não está bem. Afinal mãe é mãe. E toda mãe lembra seu filho ou filha distante. Jean Charles tenta dissimular. Quando pendura o telefone no gancho se entrega e chora. Choramos junto, quem sabe mais por nós do que por ele.

Henrique Goldman antes do golpe final, que sabemos irá acontecer, faz com que nos divirtamos. A comunidade brasileira providencia um grande evento com a apresentação de Sidney Magal - nada mais cafona e mais brasileiro. Magal sempre foi o ídolo das domésticas. Mas eu também gosto do Magal. Há tempo que assumi meu lado brega e kitsch.

Quando os equipamentos de som não funcionam Jean Charles, como bom eletricista que era, os conserta e ganha o novo emprego. O genial mesmo é a festa, pura brasilidade, breguice e cafonice, no requebro simpático de Magal cantando “O meu sangue ferve por você”!

Oooohhhh!
Eu te amo!
Oooohhhh!
Eu te amo meu amor
Oooohhhh!
Eu te amo!
E o meu sangue ferve
Por você...

O mambo de Magal enlouquece os brasileiros e a platéia. É pura alegria.

E de repente aquilo termina, termina muito rápido. Goldman deveria ter nos dado um pouquinho mais de tempo. Para termos coragem de encarar o que estava por vir.

Quando Jean Charles entra no metrô, não há o que fazer. Ele não sabe do que está para acontecer, mas nós sabemos. É muito triste, pensamos em nossa morte. Pode acontecer a qualquer momento, nunca estaremos preparados para a morte, nossa ou de quem quer que seja. Nunca estaremos preparados.

O diretor mostra a morte de Jean Charles de forma rápida e distanciada. Vemos seu corpo caído no chão do trem, como numa foto de jornal.

A hipocrisia da polícia britânica vem à tona. E a melhor cena é quando a polícia envia seus representantes ao Brasil para oferecer ajuda monetária à família de Jean Charles. Alex, o primo e amigo fala muitos desaforos aos policiais e pede ao intérprete que não traduza. Não traduz, diz ele, pois para nós, quando estamos lá, nada é traduzido! Temos que nos virar! Eles que me entendam pelos meus gestos!

Para mim, muitas vezes as cenas mais emocionantes num filmes são as finais. Se o filme é sobre animais, como “O Urso”, de Jean Annaud, eu desmorono. Desabo quando leio que nenhum animal foi machucado ao participar do filme. Em Jean Charles, pensei que teria sido melhor se tivesse ido sozinha, para chorar à vontade, sem a minha amiga Miriam ao lado.

No final lemos o texto que fala, nenhum policial foi indiciado pela morte de Jean Charles, embora um júri tenha reconhecido a culpa da Polícia Britânica. Até hoje, passados quatro anos a família e os amigos lutam por justiça.

Sem a menor dúvida Jean Charles é um belo filme.

DESEJO E PERIGO

"Ele machuca o meu coração. Entra dentro de mim e deixa marcas em minha alma, como de uma cobra". Essas são as palavras de Mai Tai Tai, a jovem chinesa que se entrega a seu algoz acreditando estar servindo à pátria.

Ang Lee em Last Caution lança um olhar corrosivo e desencantado sobre seu país, durante a Segunda Guerra Mundial, quando o Japão ocupou a China.

Wang Jiazhi (Wei Tang) é a jovem chinesa que entra para um grupo de resistência contra o governo chinês. Os jovens se encontram, para contracenar uma peça de teatro e decidem formar um grupo para eliminar alguns membros do poder, que dominam o país com mão de ferro. Eles se preocupam com o fato que consideravam um problema: eles, jovens intelectuais não matavam o bastante. Não participavam efetivamente da luta sangrenta. Wang infiltra-se na casa do chinês Mr. Yee (Tony Leung Chiu Wai) colaborador dos japoneses, como parte de um plano para matá-lo.

Ang Lee mostra os dois lados de uma mesma moeda, como afirmava o filósofo inglês Benjamin Disraeli. O grupo de jovens é imaturo e não menos corrompido que os membros do poder. Agem como se os meios justificassem os fins. A atitude dos jovens os avilta e corrompe tanto quanto eram corrompidos os membros do poder. Quando eles gritam, a China não sucumbirá! Não fazem a menor idéia do alto custo que aquilo irá representar para cada um.

Wang Jiazhi adquire uma identidade falsa, transforma-se em Mai Tai Tai, a esposa do jovem Auyang Ling Wen (Johnson Yuen), que assume a falsa identidade de Mr. Mak.

Ninguém conquista a simpatia do público, não nos identificamos com nenhum dos personagens, todos de uma forma ou outra são vilões.

Ang Lee faz sua homenagem ao cinema. Wang Jiazhi, artista e intelectual amava o cinema, seu passatempo predileto era assistir aos filmes com Ingrid Bergman, Cary Grant e Joan Fontaine. No cinema vemos os cartazes de Penny Serenade, um drama de 1941, de George Stevens.

O diretor faz o contraponto do maior interesse, entre as cenas em sociedade - quando Wang freqüenta a casa de Mr Yee-, as cenas de rua - onde todos se espreitam e se perseguem - e as cenas de cama, entre quatro paredes, onde não existe qualquer tipo de moral, tudo é devassidão. Messalina seria aprendiz de sexo com os chineses. Decameron é casto perto das cenas mostradas no filme, sequer poderia imaginar o que os chineses podiam fazer na cama. A grande preocupação da mídia é se as cenas são mera interpretação dos atores ou se são verdadeiras.

O décor da mansão de Mr. Yee é sofisticado. Ele surge como um homem contido, frio, de modos elegantes e bem educado. Seu harém é formado por belas mulheres, a esposa e as amigas, chinesas da alta sociedade - mulheres de pele bonita, lábios pintados, e vestidos caros. A aparência, os sorrisos, os olhares e os abraços, tudo é suavidade e beleza. Mulheres e homens fazem pose enquanto fumam. Aliás, fumar era extremamente elegante na época. Mai Tai Tai freqüenta a mansão. Seus gestos, sua silhueta feminina, seu vestido justo, com estamparia acetinada, as mãos delicadas movimentavam-se como se ela própria fosse uma obra de arte.

Tudo era uma casquinha, um verniz podre que se desmancha no quarto de hotel, quando Mr. Yee espera por ela, sentado numa cadeira dura, tal qual um lorde. O sexo entre o casal é brutal. As cenas são de submissão e sadismo. Ele rasga a roupa dela, submete-a. É um desamor, não existe amor naquilo, é paixão e sexo violento. E ainda para o cúmulo ele bate nela! Não dá para agüentar! Pior, como em qualquer relação entre vítima e carrasco, surge a dependência mútua. O sentimento de amor-ódio entre dominado e dominador. Vem à tona aquela atração fatal que destrói. Mai Tai Tai é ambígua. No fundo sente prazer naqueles sentimentos confusos de escravidão e sofrimento. Em uma relação sexual de humilhação, dor, paixão e submissão. E que para o espectador parece que não vai terminar, dura uma eternidade e causa tanto mal estar quanto o sexo de O Império dos Sentidos. Se Mai Tai Tai ama e odeia, que voz será a mais forte?

Constatamos o equívoco dos jovens quando Mai Tai Tai “treina”, a melhor forma para transformar-se na mulher fatal, que deverá atrair Mr. Yee. Ela faz seu treinamento transando com o colega. Começou aí a sessão de auto- humilhação e destruição. Mas as pessoas fazem o que querem, e ninguém obrigou Mai Tai Tai a fazer aquilo. Se ela faz um jogo perigoso de sedução e sensualidade, vai se envolvendo na teia tecida por si mesma.

Os jovens concretizam seus planos de morte em uma das cenas mais violentas. Um dos homens de Mr Yee descobre seus planos. O grupo toma a si o encargo de matá-lo a sangue frio. Ele é apunhalado muitas vezes e demora muito a morrer. Jorra o sangue vermelho, todos ficam manchados. O punhal é mais uma vez cravado nas costas do inimigo. A vítima olha fixo para seu assassino na hora da morte. O impacto da violência é terrível. Os jovens percebem o que fizeram. Mancharam suas mãos com sangue e caíram fundo no poço da violência e do crime. Quando o companheiro decide revelar seu amor à Mai Tai Tai é tarde demais.

Finalmente, para ela, a paixão louca por Mr. Yee fala mais alto e na hora decisiva Mai Tai Tai o alerta contra o perigo. Cai na armadilha montada por si mesma, sela sua própria destruição e dos amigos. Mr. Yee não precisou fazer muita coisa, fez o que sempre fez, comportou-se como um ditador sem honra, corrupto, sanguinário e autoritário. Afinal ele sempre foi assim e nunca deixou de sê-lo.

COMENTÁRIO

Querida Noêmia, que bom que gostaste do texto Tinha Que Ser Você. Achei o filme muito bom, vale a pena assistir. Diga para o seu neto Gustavo, que não deixe de acessar o blog (Ins)piradas - das meninas da Insights Núcleo Criativo. A Lucia, uma das meninas, é minha filha.

Bjs,
Doris Maria

segunda-feira, 22 de junho de 2009

TINHA QUE SER VOCÊ

Dustin Hoffman e Emma Thompson juntos. Vocês já imaginaram? Só poderia resultar em um belo filme.

Last Chance Harvey, como o próprio nome diz traz a história de Harvey, um compositor de jingles, que se vê de forma distorcida. Se sente menor perante o mundo, tem um enorme complexo de insegurança ou complexo de inferioridade, que o impedem de ver as coisas como elas são. Mas, como muita história de americanos não tem problemas de dinheiro.

Harvey é interpretado por Dustin Hoffman. Desde The Graduate (1967) de Mike Nicholson, que Dustin Hoffman mostra o seu talento. Ele era o estudante Braddock, que contracena com a inesquecível Anne Bancroft, que fazia Mrs. Robinson. Se ambos são inesquecíveis, o mesmo pode-se dizer da trilha sonora do filme, Mrs. Robinson, que foi imortalizada por Simon e Garfunkel. Dustin Hoffman participou de filmes inesquecíveis como Cowboy da Meia Noite, Pequeno Grande Homem (1970), Lenny, Tootsie, Kramer versus Kramer, Rain Man (1988) e tantos outros.

Assim, nos habituamos a observar o rosto do ator, seu gingado para caminhar, seu físico e suas maneiras de homem comum, que de qualquer forma o transformam em um grande ator e contribuem para o seu sucesso.

Harvey viaja à Inglaterra para o casamento da filha, Susan (Liana Balalan). Ele sabe que nessa família não tem a menor chance. É visto como um estranho. Sua filha e a ex o tratam com menosprezo. Brian Scoot (James Brolin), o padrasto de Susan é tratado por ela como se fosse seu verdadeiro pai. Por si só, isso é suficiente para criar um enorme drama.

E lembramos quantos Harveys devem existir pelo mundo. Maltrados pela família, pelas filhas, pelas esposas, ou ex, muitos terminam morrendo cedo. Nenhuma mulher jamais revela, nem ousa pensar as outras razões, que levariam seus maridos fracos, a adoecer e morrer precocemente. Não é pura imaginação desta que escreve. Enfim, no caso do filme não existe drama maior.

Harvey não morre, chega ao fundo do poço da decepção, consigo mesmo e com a família. Quando tenta se aproximar da ex- mulher e da filha, em Londres, é rechaçado pelas duas. No fundo ele sonha em levar a filha ao altar. Mas Susan profundamente magoada com o pai, afirma que o padrasto a levará ao altar.

Harvey também se sente culpado. Diz que não foi um bom pai, que as duas sempre demonstraram ter vergonha dele. Ele sempre sentiu isso. Porque essas coisas acontecem? Existem mistérios na alma humana que um comum mortal não consegue desvendar. Os outros sentiam que ele não se valorizava e o menosprezavam. É isso, com certeza. Se eu não me amo, não consigo que ninguém me ame, não é mesmo?

Para o cúmulo, Harvey foi obrigado a ouvir o que ele próprio tentava impedir. Quando Marvin (Richard Schiff), o chefe, lhe telefonava, dos Estados Unidos, ele falava e interrompia tanto que não o deixava falar. Finalmente o chefe consegue dizer: Harvey, já eras. Estás demitido.

Pobre Harvey, outro já poderia morrer. Mas o destino estava ao seu lado. Bem curioso ainda em relação ao mundo, no bar onde afogava as mágoas, ele puxa conversa com Kate (Emma Thompson), uma mulher solitária de 40 anos, que cuidava da mãe, mas não morava com ela. Thas is the diference!. Cuidar da mãe e morar com a mãe. E sobre isso daria para escrever um livro.

Profundamente magoado Harvey conta seu drama a Kate. Dustin Hoffman tem um jeito de movimentar os lábios, quando ele conta sua história para Kate, tem um jeito de falar, que sabemos que Harvey está mal mesmo. Está muito triste e arrasado. Dustin é pura emoção.

Os dois sentem-se atraídos um pelo outro. Kate tem medo de se entregar ao amor. E Harvey vai se apaixonando. O filme mostra esse jogo de sedução, esse namoro na maturidade, como algo belo e redentor. A risada cristalina de Kate - Emma Thompson é de lavar a alma!

Finalmente a cena chave do filme, a cena em que Harvey reage, mesmo sem o apoio do terapeuta. Se o terapeuta Paul Weston (Gabriel Byrne) da série Em Terapia o estivesse ajudando seria mais fácil para ele.

Na festa de casamento, quando o mestre de cerimônias convida o pai da noiva para fazer um discurso, o padrasto começa a falar como se fosse verdadeiramente, o pai da noiva. Imagine como não deve ter sido difícil para Harvey levantar timidamente o braço e dizer ao padrasto: - “Brian ele pediu para o pai da noiva fazer o discurso, e eu sou o pai da noiva!”. Esse foi o gesto de coragem e rebeldia que salvou a vida de Harvey. Se a ex Jean (Kathy Baker) não gostou azar. Ela não importava mais. Para completar, Jean é feia, como o diabo. Aquele tipo de mulher conservadora e calculista, com o cabelo duro de laquê.

Depois de ter a coragem para enfrentar o mundo, a vida, a festa de casamento da filha, a parentela. Harvey podia sair em busca de felicidade e saiu. Correu atrás de Kate. Moveu montanhas para conquistá-la.

Assista ao filme e confirme. Você vai adorar.


A MULHER INVISÍVEL

Amanda (Luana Piovani) é a mulher invisível. A Luana de verdade todos conhecem, mas não custa repetir: Luana é alta, loura, cabelos longos, encaracolados, um rosto bonito e um corpo perfeito. No filme, Amanda é doce, muito doce, é uma mulher perfeita. Não exige nada, é puro amor. Luana Piovani foi uma escolha perfeita para o papel, sua sensualidade e beleza transitam pelo universo do imaginário masculino. Os homens sonham com ela, que nem o Selton Mello, embora não contem seus sonhos para suas mulheres, é claro. Mas para os amigos sim.

O filme revela não apenas a solidariedade masculina, mas também a falta de qualquer compromisso entre eles, os homens, os amigos, quando o caso é a paixão por uma mulher. Aí está chave do sucesso dessa história tão bem bolada e dirigida por Cláudio Torres. Todo homem um dia deve ter sonhado que Luana é a sua musa. Puro sonho é claro. A Luana do filme não existe, é perfeita demais, é apenas um sonho.

Pedro (Selton Mello) é apaixonado pela mulher, Marina (Maria Luísa Mendonça). Um belo dia, chega em casa com flores, e recebe a bomba. Marina está grávida, ele não é o pai e ela vai embora com um alemão. A queixa de Marina revela o segredo de Pedro: “Você vive a sua vida e só vê o quer ver”. E crash! Seu mundo cai em ruínas.

O jovem dá um tempo para o mundo. Transa com uma, com duas, ou com gêmeas, não se encontra nunca. Vive na fossa. A última é uma doidinha que vê mortos o tempo todo. Pedro dá um basta. Entra em surto. Vai para o fundo do poço e nunca mais quer ver mulher em sua vida.

Eis que alguém bate à porta. Ele se admira e diz que ninguém bate em sua casa há muito tempo. Isso os solitários sabem muito bem. Aqueles em cujas vidas o telefone deixou de tocar de longa data. Aqueles, que façam o que fizerem não conseguem atrair as pessoas. Bom, Pedro está nessa fase. Ainda bem, que para ele é uma fase.

É ela, Amanda, a vizinha que pede uma xícara de açúcar. É como se Pedro vivesse as miragens do deserto. Ele “vê” o seu grande amor. Quantos seres humanos nunca viram ou até desistiram de pensar nele? Muitos gostariam de estar na pele de Pedro, de ser um pouco louquinhos como ele, que pelo menos “via“ a grande paixão. Quando Amanda entra, ele diz e pensa: “Nossa como você é linda!” Isso todos nós repetimos em coro. “Nossa como você é linda!” - linguagem paulistana; gaúcho diria: “Bah! como tu és linda!”.

Aquela mulher que não existe, entra na vida de Pedro como um furacão. Lê suas cartas, revira sua vida e o faz feliz. A risada de felicidade de Selton Mello, quer dizer - Pedro - vale a pena ver, só assistindo ao filme. Assim como está só de calcinhas e soutien, limpando o piso; está a sua espera, na cama, envolta em lençol de seda. Que homem agüentaria? Além do que, Luana está linda como a mulher invisível, linda de dar dó, de fazer qualquer mulher chorar de feia! Amanda não existe mesmo, até discute a partida de futebol entre Luziana e Sobradinho!

Pedro desconhece, nunca viu a vizinha Vitória ( Maria Manuella), que tem um marido, grosso como ele só, que graças a Deus morre de enfarte! É a melhor coisa que acontece a ela. Vitória, por sua vez, sonha acordada com Pedro, sabe tudo de sua vida pelo estetoscópio colado na parede, que agora tem ouvidos.

O amigo, Carlos (Vladimir Brichta) descobre que tudo estava na imaginação de Pedro, que pensa que está noivo, quer entrar com a noiva no cinema. O leite vai derramando... O amigo vê tudo e pede uma foto para comprovar. A situação chega num ponto em que Amanda precisa encorajar Pedro para que ele volte à razão. Ela afirma que não interessa sua vida, não interessa o que fez, não interessa onde esteve. Amanda precisa de Pedro para existir, porque ela não existe, existe somente em sua imaginação e só Pedro pode fazer com que ela desapareça. Amanda, chamando Pedro à razão, diz: ”Eu sou o que você é”.

Mesmo que Pedro faça a declaração de amor para Amanda: “Quero construir algo com você, quero dividir com você a aventura que é viver”, não é para Amanda que ele tem que dizer isso, é para uma mulher verdadeira.

E melhor, a mulher verdadeira existe, mas Pedro terá que passar por muitas para saber que ela não é apenas um sonho, que a mulher magra e morena, de cabelos castanhos e lisos, que bate à sua porta pedindo uma xícara de açúcar! É a mulher verdadeira!

sexta-feira, 19 de junho de 2009

COMENTÁRIO

Ana, tua opinião sobre o blog é muito importante para mim. Espero que continues lendo os meus textos.

Um grande abraço,
Doris Maria

terça-feira, 16 de junho de 2009

O EXTERMINADOR DO FUTURO: A SALVAÇÃO

Exterminador do Futuro (The Terminator), dirigido por James Cameron foi o primeiro filme da série. A história é bonita. Arnold Schwarzenegger é o ciborgue, que significa uma criatura que tem um tecido vivo, colocado sobre um esqueleto de andróide. Sua inteligência é artificial. O ciborgue pertence à série Cyberdyne Systems Model 101-800. Ele vem do futuro e cai na terra em 1984 para alterar o presente e o futuro. Vem para matar a mãe, Sarah Connor e impedir o nascimento de seu filho, John Connor, futuro líder da resistência contra as máquinas. Mas John Connor não pode ser morto, ele é a chave do enigma.

A atriz Linda Hamilton transformou-se em mito. É como se a moda da mulher magra e musculosa tivesse nascido no dia 12 de maio de 1984, dia em que o ciborgue voltou ao passado. A moda pegou, as mulheres redondas de Goya e dos artistas renascentistas caíram mesmo em desuso. Até a beleza da mulher greco-romana tombou ante a musculatura de Linda Hamilton, a mãe, magra, forte e musculosa, que pega em armas para defender o filho. As mulheres querem ter o corpo de Linda Hamilton.

Quanto a Schwarzenegger, se já era famoso, virou coqueluche. Se a Califórnia ganhou um governador, a série perdeu o grande ciborgue. Mas é ele mesmo que aparece no último filme? Junto com O Exterminador vem Kyle Reeves (Michael Biehn) que passa uma noite com Sarah Connor e torna-se o pai de John Connor. O filme lança ao estrelato outros atores como Bill Paxton e Lance Henriksen.

O primeiro filme originou quatro sequências,
O Exterminador do Futuro 2: O Julgamento Final, O Exterminador do Futuro 3 : A Rebelião das Máquinas e O Exterminador do Futuro : A Salvação, que está em cartaz nos cinemas de Porto Alegre. Em 2008 foi lançada a série de televisão Terminator: The Sarah Connor Chronicles, que conta a vida de Sarah e seu filho, John Connor depois dos acontecimentos do segundo filme.

O Exterminador do Futuro: a Salvação traz Christian Bale no papel de John Connor. O filme inicia com a execução de Marcus Wright (Sam Worthington), um homicida que “doa” seu corpo à ciência. Na verdade a Skynet, a organização das máquinas o transforma em um ciborgue. As únicas lembranças de Marcus são confusas. Ele vislumbra vagamente seus últimos minutos de vida e a imagem de sua médica, a Dra. Serena Kogan (Helena Bonham Carter) - que tem câncer - e por quem é apaixonado. Marcus tem certeza absoluta que é um ser humano. Mas de humano ele possui somente um coração muito forte.

O filme se passa num futuro pós-apocalipse, onde não existe lugar nenhum. O décor desolado tem inspiração na arquitetura construtivista. Nem o Google Earth encontraria a posição. E os poucos prédios que aparecem lembram os desenhos do arquiteto futurista Sant’Elia. A cor da película, com tons prateados do deserto do Novo México foi cuidadosamente escolhida pelo diretor. O tom seco e prateado tornou o décor belíssimo, nítido e contratipado e se refletiu na imagem da dupla. Por isso os outros heróis da história ficaram nublados.

Em 2018, John Connor (Christian Bale) é designado, para liderar a resistência dos seres humanos contra o domínio das máquinas, coordenadas pela Skynet e seu exército de exterminadores. Quando Marcus surge, John Connor não sabe que ele é um ciborgue. Antes disso, Marcus tinha salvado a vida de Blair Williams (Moon Bloodgood). Uma química irresistível se estabelece entre os dois. E uma química também irresistível se estabelece entre a platéia e o casal.

Se Christian Bale não está tão bem no filme o mesmo pode-se dizer da atriz que faz Kate Connor (Bryce Dallas Howard), muito sem graça. Assim, capazes de serem comparados ao carisma de Linda Hamilton e Arnold no primeiro filme da série, temos somente os dois atores, Moon Bloodgood e Sam Worthington. Ela é belíssima e é tão charmosa quanto Linda Hamilton, com aquela roupa marron e surrada, colada ao corpo escultural. A atriz é californiana, tem traços orientais. Possui uma pele morena que a torna verdadeiramente linda. Porém, no fundo, no fundo Moon é muito mais a herdeira de Ursula Andrews do que de Linda Hamilton. Sam Worthington- possui traços de Ewan MacGregor- é um homem muito bonito, ou seu personagem patético me emociona.

A cena que cai fundo, e faz a platéia gritar mesmo e colocar as mãos na cabeça acontece em uma das muitas vezes que John Connor tentava reanimar James Wright. Ele pega um desfibrilador, dois fios grosseiros com um par de eletrodos em cada ponta e dá um choque no coração de Wright. Meu Deus! Foi como se ele desse aquele choque em cada um de nós, espectadores!
Se Christian Bale foi o Batman e é um ator muito cotado no mundo do cinema, em O Exterminador do Futuro: a Salvação teve sua imagem eclipsada por um ciborgue, metade gente, metade máquina. O John Connor é quase esquecido no filme. Até esquecemos a sua péssima dicção. Esquecemos que ele não tem nada de bonito. É quase um brutamontes. É desejado mesmo pela gurizada que quer sua imagem nos jogos de vídeo game. E, só prestamos atenção em Marcus Wright, na injustiça que foi feita ao transformarem-no em um ciborgue, numa máquina. O diretor McG faz uma reflexão sobre os limites da tecnologia e sobre os limites da existência do ser humano e da vida.

Se o ciborgue caiu na terra para representar as máquinas, ainda tinha dentro de si um coração muito humano, que foi mais forte, fez com que se apaixonasse por Blair Williams e salvasse a vida de John Connor. Nos raros momentos em que estão juntos e se abraçam, Blair encosta o rosto em seu peito e ouve as batidas fortes de seu coração. Ela adora ouvir o som da bomba que manda sangue para o corpo. Aliás, o último gesto de Wright é de extrema generosidade. Doa seu coração a Connor e salva a sua vida. Esses ingredientes são a atração do filme. E paira a voz que ressoa: “O que nos torna humanos não é algo que se programe, é a força do nosso coração”.

INTRIGAS DE ESTADO

Cal McKaffrey trabalha no ''Washington Globe''. Está tão bem caracterizado que lembra o Antonio Oliveira, aquele jornalista da Zero. O cabelo desgrenhado e comprido, balança quando ele caminha - não sei como. McKaffrey é o típico jornalista que não se cuida. Alimenta-se mal, mas é o rei por onde passa. Pelo menos é muito bem recebido na loja de fast food, onde diariamente se empanturra com cheeseburgers e hot dogs, com muita gordura trans. Essas preocupações não passam por sua cabeça. Ele pensa somente na matéria que precisa fazer para descobrir os crimes que aconteceram. Sony Baker, a principal acessora de Stephen Collis - seu amigo e político - foi assassinada. Ao mesmo tempo, outros dois personagens anônimos também foram assassinados, um deles era entregador de pizzas. Tudo parece estar relacionado. Esse é o mote do thriller Intrigas de Estado.

O filme é dirigido por Kevin Macdonald e estrelado por Russel Crowe (Cal McKaffrey) e Ben Affleck (Stephen Collins). Collins é deputado do Congresso americano. É um político esperto, aliado a George Fergus (Jeff Daniels), uma velha raposa, que tem ligações perigosas com a PointCorp. Não se sabe o que houve, mas o ator adquiriu obesidade mórbida. A empresa foi fundada por militares aposentados, que tem facilidades dentro do Congresso para ganhar concorrências de serviços privados de segurança para o governo americano. O filme é uma denúncia sobre a corrupção dentro do governo. É um alerta sobre os perigos da privatização da segurança pública e da guerra. Apenas mercenários atuam no Iraque segundo as denúncias.

Yunzer - apelido carinhoso de Cal- foi encarregado pela editora Cameron Lynne (Helen Mirren) de escrever a matéria. Mas para isso, ele precisa descobrir a verdade. Quando desvenda os podres, é ameaçado por Lynne, que fica estarrecida com as repercussões do caso diante dos poderosos. Helen Mirren é uma mulher charmosa, uma excelente atriz e continua linda no auge dos seus 63 anos.

Della Fry (Raquel McAdams), a jovem jornalista tem interesses profissionais na edição do caso e forma uma dupla com Cal. Para isso eles precisam disputar as evidências e provas do crime com o detetive, encarregado do caso, que não aceita a intromissão dos dois.

Corrupção, crime, favorecimentos e enriquecimentos ilícitos, paixões ocultas e exploração, todos são ingredientes do filme. Resta ao espectador acompanhar os passos de Russel Crowe. Ele é o personagem forte, que nos dá um pouquinho de segurança. Desajeitado para caminhar, tem um barrigão e uns olhos verdes penetrantes que o deixam mais forte ainda. Nunca entendi o ator. Ele é sexy? Para mim não é. Mas acho que o resto das mulheres discorda de mim. O que os homens pensam... Não sei. Mas que é um ator muito bom, quanto a isso, não resta a menor dúvida.

O personagem Cal se revela. O jornalista não liga para nada que não se relacione ao seu ofício. Tem seu recanto de trabalho coberto de recortes de jornais. É um solitário que não tem sequer um bicho para cuidar. Teve um affair com a mulher do amigo, Stephen Collins, que foi eleito para o Congresso e está em maus lençóis. Sony Baker, sua amante e principal acessora foi assassinada no metrô.

O interesse do filme fica por conta da atuação de Crowe, de suas aventuras e do fio da meada da corrupção, que vai desvendando até a surpresa final, embora o espectador desconfiasse desde o início.

Stephen é a própria cara da corrupção, embora faça um discurso politicamente correto, para ocultar seu verdadeiro caráter. O filme trata dos dois personagens, opostos em tudo. Ben Affleck é o protótipo do deputado; alto, magro envergando um sobretudo negro, de aparência impoluta, exatamente o contrário de seu verdadeiro caráter. Está muito magro e sem graça, com os dentes brancos e uniformes, parece que usou aparelho ortodôntico. Cal, gordo e desleixado é o paladino da verdade e da luta contra a corrupção. Ele é o jornalista sério que deseja tornar público os crimes contra o bem comum. É o defensor da liberdade de imprensa e representa com perfeição o seu papel.

A esposa do deputado, Anne Collins é interpretada por Robin Wright Penn. Desde o início, ela tenta parecer uma mulher séria e traída que sempre interessou a Cal. Mas seu ar problemático deixa o espectador desconfiado. Aliás, Robin sempre teve esse ar problemático, era a namorada do maluquinho Forrest Gamp.

O filme vale a pena ser visto porque mostra que na América, se existe a corrupção - e existe - ela pode ser denunciada e os culpados serão punidos. De fato, os valores americanos de liberdade e democracia são muitos fortes. A liberdade de imprensa é um valor caro aos americanos e isso sim, emociona o espectador e deve servir de exemplo ao Brasil, principalmente quando nos lembramos dos anos 60 e 70, quando os jornalistas tinham seus textos autocensurados para não falar em DOPS e censura verdadeira.

Faz-me lembrar o jornalista de nome Adroaldo Correa, que outro dia me abordou na Feira do Livro para explicar, que tinha demitido o Merten (meu ex), da Rádio Continental, onde os dois trabalhavam, nos idos anos 70, pelas mesmas razões de autocensura. Merten não tinha se autocensurado. Criatura! ninguém mais lembrava daquilo. Porque desenterrar uma história do passado? Eu desconhecia as razões da demissão. Deve ter sido problema de consciência. Fiquei profundamente enojada com tanta mediocridade e pobreza de espírito! Saí dali sem maiores explicações.

Assim, a sequência final é um assombro. Não sei se a platéia percebeu a beleza daquelas cenas. A filmagem mostra os passos necessários para a edição de um jornal. O papel é preparado e carregado em caminhões. As máquinas não param. A high tech imprime jornais com uma tecnologia completamente diferente da dos velhos tempos. Os jornais sobem, presos a um trilho, em uma rapidez emocionante. Finalmente são distribuídos ao público. O mundo todo sabe dos podres de Stephen Collis. E essa parte final, acompanhada por um rock balada, por si só vale o filme.

É uma emoção de fazer chorar qualquer um, não precisa ser jornalista, não precisa ter vivido no Brasil nos anos 60. A sequência é uma ode à liberdade de imprensa e os heróis são o casal que caminha tranqüilo: ela, a jovem delicada e inexperiente, ele, o gordão e balofo, que virou o grande herói. As cenas são incríveis e merecem o nosso aplauso!