sábado, 29 de agosto de 2009

ENQUANTO O SOL NÃO VEM

O título do filme em português é tão sem graça que não vale a pena escrever. Parlez moi de la Pluie é bem mais interessante e fala um pouco da impaciência dos personagens com a própria vida, colocando a culpa de muitos problemas no tempo e na chuva. O filme é dirigido e interpretado por Agnès Jaoui, que faz Agathe Villanova, uma mulher bem sucedida que resolve entrar na política. O roteiro é de Agnès Jaoui e Jean Pierre Bacri. A diretora ganhou o prêmio de melhor roteiro em Cannes por seu segundo filme, Questão de Imagem. Foi indicada ao Oscar de melhor filme estrangeiro, em 2000 pelo primeiro, O Gosto dos Outros.

Os conflitos são amenos. O filme tem um toque delicado e feminino, e passa livre de peso pelos dramas familiares, problemas da imigração e mulheres na política.

Agathe viaja para a cidade onde viveu no sul da França, para ajudar a irmã Florence (Pascale Arbillot) a resolver os problemas do espólio da falecida mãe.

O tom do filme é leve. A história é contada com um humor sutil e inteligente. Karim (Jamel Debbouze) é o personagem problemático. É um imigrante argelino, filho da empregada. Sente-se rejeitado pelas patroas de sua mãe, Mimouna ( Mimouna Hadji), e não crê que qualquer das duas possa ter afeição por ela. Karim sentia-se duplamente jogado fora, por ser um imigrante franzino e ter um defeito físico. Isso não foi mencionado, mas era visível.

Karim resolve fazer um documentário com seu amigo, o jornalista Michel Ronsard (Jean-Pierre Bacri). A personagem do filme dentro do filme é Agathe. Ela é a política e a feminista. Se a história se passasse no Brasil, a mulher poderia ser Dilma. Karim vê a vida através da janela do filme e tenta contar uma versão nada lisongeira de Agathe, simbolicamente queimando o seu próprio filme.

Florence é a irmã, sempre tensa e cheia de problemas que não faz a menor questão de tentar resolvê-los. Florence trai o marido, um dos poucos homens medianamente bonitos no filme. O outro homem interessante é o companheiro de Agathe.

Engraçados mesmo são Karim e Michel. Os dois querem fazer um filme, mas entendem muito pouco de cinema. Não combinam nada entre si, antes do trabalho e começam e a se desentender diante de Agathe. Karim interrompe as filmagens, puxa Michel para um canto e começa o bate-boca. Agathe assiste a tudo, impaciente, quase não acredita no que está vendo. Guardando as proporções são dois “clowns” e parecem o Gordo e o Magro.

Em uma das cenas mais divertidas o grupo vai filmar em um lugar distante e muito alto. Chegam cansados ao topo da montanha. Nada dá certo. Karim faz perguntas agressivas para Agathe. Quando a coisa vai engrenar, ele verifica que Michel não filmou. Recomeça o bate-boca. Agathe chega no limite. Quando tentam filmar novamente, um coro de ovelhas rodeia o grupo e parece que responde mé, mé, mé! Recomeçam a filmagem e termina a bateria. Michel, obviamente levou a bateria errada. Quando vão embora irritados, são seguidos pelo rebanho das dóceis ovelhinhas. Para o cúmulo, Michel deixou o carro mal estacionado. Ao chegarem à estrada, verificam que o carro está batido e virado. Cai uma chuva torrencial, hi, hi, hi... Vão para uma estalagem onde o proprietário irritado com o governo responsabiliza Agathe, por tudo de ruim que acontece em sua vida. Para o cúmulo, o marido traído dirige o carro que irá socorrer o grupo onde está Michel, o amante de sua mulher. Mas como todo marido traído, ele é o último a saber ! É muito engraçado e vale assistir!

Michel parece ser daquelas pessoas que passaram a vida inteira sem saber que tinha déficit de atenção. Ninguém lhe disse, ninguém percebeu, e quem sabe, ninguém diagnosticou o seu déficit de atenção. Acho que foi melhor para ele. Por isso mesmo é engraçado. Quando Michel vai filmar o batizado de uma criança, filma a criança errada, e deixa cair uma bolinha - que era parte do equipamento - na testa do bebê. A bolinha faz poing !! Tadinha da criança! O pai fica fulo!
Esse senhor trapalhão era o amante da equivocada Florence que não sabia o que fazer de sua vida. Ele não se contém a conta para Agathe, que ele e a irmã dela são amantes. Agathe fica meio pasma ante tanta besteira a sua volta. A nossa Dilma é a melhor na história.

Agathe e Florence pelo menos conseguem se reunir, separar fotografias e se queixam que a mãe preferia uma das duas. Existem irmãs que não conseguem nem isso, muito menos dividir suas memórias. Nas lembranças passadas a limpo, alternadamente, cada uma sentia-se preterida pela mãe. Florence achava que mãe era muito dura com ela. Enfim o acerto entre as irmãs não é tão difícil. Agathe constata que havia em torno de noventa e seis fotos suas e uma meia dúzia de Florence. Não era sem razão, que esta se sentia o patinho feio da história.

Parlez moi de la pluie fala de personagens que fazem muito pouco para resolver seus problemas. Tentam mudar seus caminhos, sem muita convicção. Ninguém consegue tirar o pé do barro. As pessoas até que arriscam sair da mesmidade. No final, os vemos tentando acertar e buscar seus verdadeiros
valores. Agathe efetivamente é a personagem positiva que tem sonhos e vai em frente.


terça-feira, 25 de agosto de 2009

A TETA ASSUSTADA

Entre nós, o nome do filme não poderia ser mais jocoso. Me faz rir, pois para mim teta é de vaca. E chamar mulher de vaca, é meio grotesco, embora algumas mereçam. E aí muitas vezes não encontro a palavra adequada para as mamas? (é da área médica), seio? busto? Tetuda ainda é um adjetivo aceitável. Para mim teta é que não é aceitável! He, he, he.

Gostei de La Teta Asustada, porque ele fala da América Latina, pobre e explorada. Fala de uma América, de língua espanhola que é muito pouco conhecida e valorizada no Brasil. O Peru é um país belíssimo. Sempre me identifiquei com a literatura fantástica peruana, em minha busca por minhas raízes indígenas.

Vejam o filme e observem a beleza da atriz que faz Fausta (Magaly Solier). A cor da pele é linda, as feições têm traços incaicos, o cabelo é quase azul, um azul ruano, liso, não precisa chapinha. É quase uma Pocahontas, de tão bonita.

E mostra também a paisagem suburbana de Lima, uma cidade onde não chove. Por isso as casas não precisam de telhado de telhas francesas, por exemplo. As coberturas são retas, mas não possuem a acepção de Le Corbusier, com seu terraço jardim. Acho que poderíamos falar em uma estética da pobreza muito semelhante à estética da fome de Glauber Rocha. Eu diria que é uma estética do kitsch, mas esse kitsch retrata tão bem as pessoas e o lugar, que é o mais atraente.

La Teta Asustada é um filme de Claudia Llosa, sobrinha de Mário Vargas Lhosa, a qual ganhou o Urso de Ouro no Festival de Berlim de 2009. No Festival de Gramado de 2009 ganhou o Prêmio de Melhor Longa Estrangeiro, enquanto Claudia Lhosa ganhou o Prêmio de Melhor Direção.

La Teta Asustada é uma crença popular de que as mulheres que foram estupradas no Peru transmitem às filhas através do leite, o medo, a angústia e o pavor que sofreram. Quando o filme inicia, a velha mãe índia canta - num dialeto muito estranho - seus males e suas tristezas para a filha. A mãe estava grávida de Fausta quando foi violentada e estuprada por terroristas. O filme fala do medo, dos problemas do Peru, agravados pela ditadura e pelo terrorismo.

Assim, a filha Fausta tem pavor ao sexo. O filme não mostra cenas de sexo, não mostra cenas de violência e estupro, mas fala de sexo o tempo todo.

Fausta mora com o tio e assiste ao casamento da prima sem o menor interesse. A cena é cativante, mostra o casario sobre um morro sem vegetação, cor cinza-ocre. Os casebres se organizam, em torno de um pátio onde a noiva experimenta, e suja de poeira o vestido branco. A cena lembra o neorealismo italiano de Pasolini, em Gaviões e Passarinhos. Ao fundo, presa na fachada da casa há uma grande ilustração alusiva ao casamento, tudo é brega e kitsch e por isso mesmo tem seu encanto.

O filme fala da vida e da morte. Enquanto a família e as primas estão preocupadas com a vida, Fausta sofre da Síndrome da Teta Assustada. A mãe morre enquanto cantava sua dor. E a filha passa a cultivar a mãe morta de quem não consegue se separar. Psicologicamente, Fausta identifica-se com a mãe, assume seus medos e sua dor. Não fala com ninguém, não se interessa por homens, não possui amigas. Não consegue realizar-se como mulher.

Mesmo morta a mãe não liberta a filha. O culto aos mortos é característico dos povos latinos. Alguns quadros do filme são verdadeiras obras de arte. Em uma das cenas o corpo da mãe é lavado e envolvido em panos numa espécie de mumificação. O cadáver está coberto por um lençol e as mulheres ajoelhadas o limpam, uma delas levanta o lençol, para lavar a “teta” da defunta. Essa visão o espectador não tem, imagina somente...

Claudia Llhosa usa a câmera parada. Daí a beleza de muitos enquadramentos, como a cena do sofá, que aparece ao fundo, em cores fortes e características da arte latino-americana. Fausta passa de um lado a outro da tela. Outra cena belíssima surge quando as pérolas do colar da patroa caem ao chão. Fausta e a senhora as recolhem. As mãos delicadas das duas mulheres surgem ao mesmo tempo, com movimentos lentos, de lados opostos da tela, recolhendo as pérolas uma por uma. A fotografia é belíssima, preste atenção.

Afundada em suas crenças Fausta vive em pânico. Nenhum homem pode passar por perto, que ela pensa que vai ser violentada. Dorme com a mãe morta. Tenta comprar um caixão, mas este custa 800 soles, demais para suas posses. Anda com o corpo da mãe para cima e para baixo. Outra cena belíssima é a da escadaria enorme que corta o morro onde moram. Fausta quase vive no céu, mora em cima do morro. A subida do morro carregando o corpo da mãe é antológica.

O corpo morto permanece em baixo da cama, enquanto em cima da mesma cama o vestido de noiva celebra a vida. Fausta puxa o corpo da mãe e visualmente, a morta parece que veste o vestido de noiva. Enquanto Fausta não deixar de celebrar a morte não terá saída. O filme lembra o culto aos mortos, cultivado pelos mexicanos. E lembra também o realismo fantástico de Mário Vargas Lhosa e Manuel Scorza.

Para evitar todo e qualquer perigo de estupro, Fausta tem uma batata na vagina. Num primeiro momento pensei que era um tumor a que o médico chamou de “papa” na vagina. O médico alerta que a batata crescia e tinha muitas bactérias. Periodicamente, Fausta corta os ramos da batata que crescem dentro dela, e saem de seu corpo, como se ela fosse uma árvore! Dá-lhe realismo fantástico. Mas a diretora Claudia afirma que a doença e o ato - que tanto espanto causou - são comuns em seu país...

Enquanto Fausta não assumir seu lado feminino, enquanto simbolicamente não matar a mãe, irá literalmente transformar-se em vegetal. Não poderá ter um homem, nem viver a sua feminilidade.

Começa a trabalhar na casa de uma pianista. Enquanto canta seus males espanta. A pianista em crise encontra inspiração nos versos da empregada e lhe promete pérolas. Fausta sofre a traição e o abandono da patroa, que a deixa sozinha na rua, o que mais temia.

Mas ainda restam as pérolas, Fausta as ama e deseja. Emerge o lado feminino da personagem. O desejo de ser mulher é mais forte. Nessa busca, Fausta sofre e se perde nas ruas da cidade. Noé (Efraín Solís) é a presença masculina que a traz de volta e provoca a reviravolta.

O apelo pela vida faz com que corte o cordão umbilical, mate a identificação com a mãe e com a morte... Agarra-se às pérolas, aperta-as na mão e não as solta, enquanto não lhe for restituída a sua porção mulher.

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

BEM-VINDO

Em menos de um ano, assim rápido, sem pensar muito lembro três filmes sobre os problemas dos imigrantes na atualidade: Território Restrito, Rio Congelado, Jean Charles e agora Bem-vindo. O título do filme é uma alusão irônica ao tratamento que é dado aos imigrantes ilegais no mundo inteiro. A questão da imigração é um problema mundial, que precisa ser tratado, estudado e deve excluir a xenofobia.

Nos filmes citados, que estrearam nos cinemas de Porto Alegre, em menos de seis meses temos o sofrimento de Mireya Sanchez (Alice Braga), em Território Restrito, de Ray Eddy (Melissa Leo) e Lilá (Misty Uphan), em Rio Congelado, do brasileiro Jean Charles (Selton Mello) e de Bilal (Firat Ayverdi) em Bem-vindo.

Se filmes como Em Tempos de Paz mostram os grandes problemas do Brasil, vemos com espanto, que a França não possui problemas menores. A intolerância em relação ao imigrante ilegal atinge níveis alarmantes no mundo inteiro.

Bem-vindo é uma denúncia contundente contra o pensamento e o comportamento xenófobo da sociedade francesa. O diretor é Philippe Lioret.

O filme acompanha a trajetória de Bilal, o jovem curdo que sai do Afeganistão e leva três meses para chegar à França. Seu objetivo é chegar à Inglaterra onde vive sua namorada, Mina (Derya Ayverdi). Na vida real Derya e Firat são irmãos e fazem o par apaixonado. Firat foi indicado pela irmã, quando ela foi escolhida por Lioret para fazer a personagem Mina.

Os imigrantes ilegais em qualquer lugar do mundo vivem a pior das vidas. O momento da partida, o abandono da pátria marca suas existências, como o ponto inicial de uma viagem sem volta. Será tudo ou nada. Poucos pensam em voltar. Os imigrantes pobres são os mais desprotegidos. Em geral são vítimas de intermediários inescrupulosos, desonestos, quando não, criminosos. O sentimento dos jovens imigrantes é de estranhamento perante um mundo novo e diferente.

Coragem, não sabemos onde eles a encontram para seguir adiante! A experiência dos imigrantes é limite. Com Bilal não foi diferente.

Você já passou por um caminhão cheio de animais para o abate quando viaja de carro? Galinhas, porcos, gado? Até cavalos? Sentiu-se mal? Sempre sinto muita tristeza pelo sofrimento dos animais, que dependem de nós, seres humanos. A situação de Bilal é semelhante. É pior ainda. Escondidos em caminhões, os imigrantes ilegais tentam atravessar a fronteira da França. Devem ficar encapuzados com sacos plásticos, para evitar que o gás carbônico expelido pela respiração seja detectado. A polícia faz a revista, auxiliada por cães farejadores. Bilal não suporta a situação, entra em pânico. Os imigrantes são descobertos, presos e julgados. Muitos são repatriados. Bilal consegue permanecer na França.

A narrativa não fala da experiência de Bilal, pela boca do personagem. O filme é quase um documentário. Bilal não narra seu sofrimento. A dor do abandono em um lugar estranho, do ser caçado como um animal, da fome e do frio são experiências inenarráveis. Bilal vive esses tempos difíceis e tenta levar seus planos adiante.

Simon (Vincent Lindon) o ex-atleta, professor e medalhista de natação vive uma situação diversa, mas também de dor e desespero. Simon está separado da mulher Marion (Audrey Dana), por quem continua perdidamente apaixonado. Os dois trabalham em um grupo que dá apoio aos imigrantes ilegais. Simon em uma belíssima cena de amor acaricia a ex-mulher, que naquele momento, pelo menos se rende ao sexo e a um amor desejado por ela também.

O professor ensina Bilal a nadar, para transformá-lo em campeão de natação. Mas, percebe que o desejo do jovem é outro. Assume o risco de treiná-lo. Bilal se transforma no filho do coração, no filho adotivo de Simon, que revê sua vida e seus valores através deste novo papel de pai. Em seus sonhos de menino de 17 anos, Bilal persiste na idéia fixa de encontrar a namorada. Determinado, não pensa em outra coisa. A teimosia é a característica do personagem, que persegue seu alvo à exaustão, nada o demove. A jovem afegã é submissa aos desejos do pai, que já lhe escolheu outro noivo.

Bilal ama Simon como pai. Mas o preconceito e a xenofobia vêem de forma diferente. Para vizinhos, para a França que enxota seus imigrantes, a relação entre os dois é homossexual. Os que não se enquadram nos papéis pré-determinados por uma sociedade preconceituosa são classificados como pertencentes às minorias e não são aceitos. Simon passa a ter sérios problemas com a polícia. Vê sua casa invadida por policiais. Precisa apresentar-se diariamente às autoridades. É tratado como criminoso. É classificado como homossexual, no sentido de diminuí-lo através da intolerância. Simon tenta uma reconciliação com Marion, mas os dois precisam mudar para pensarem na possibilidade de se reencontrar.

Bilal deve abrir mão do seu amor ao pai para atingir a sua experiência extrema como imigrante. Deve buscar o próprio caminho, já delineado em sua mente para concretizar seu sonho. Para crescer, Bilal deve abdicar do amor ao pai.

Nessa busca encontra no esporte, uma forma de superar obstáculos e elevar a autoestima. No caso, é uma luta e uma competição consigo mesmo. Ao treinar, prepara-se para superar seus próprios limites e bater seu próprio recorde. A natação transforma-se em uma experiência libertadora, em todos os sentidos, que poderá resultar na possibilidade de reiniciar uma nova vida.

Em meio a esse emaranhado de acontecimentos e sentimentos, Bilal joga-se ao mar, e busca o seu limite... Volta ao meio líquido em uma experiência decisiva, para viver ou morrer.

Bilal transforma muitas vidas, em sua fragilidade de imigrante ilegal. Simon reconstrói sua vida através dele. Dedica-se a treinar jovens imigrantes na natação, para que um dia, quem sabe eles consigam alcançar seus objetivos.

Philippe Lioret denuncia a política de imigração patrocinada pelo governo francês, que dificulta e penaliza os próprios franceses, que perdem o direto de ir e vir, o direito à privacidade, o direto inalienável à liberdade e à fraternidade. Ou seja, o direito à compaixão pelo próximo, no sentido pregado por Dalai Lama. As cores da bandeira francesa simbolizam três palavras mágicas: Liberdade (Liberté), Igualdade (Égalité) e Fraternidade (Fraternité). Palavras que foram cunhadas na Revolução Francesa e viraram símbolo do país. Entretanto os franceses apoiaram leis de imigração xenófobas, que pisam no significado das três palavras. Pisaram na própria bandeira, é como se tivessem rasgado o lema do país que foi o berço da cultura e da civilização. Na França a solidariedade é enquadrada juridicamente como crime, o “crime de solidariedade”.

A Lei de Imigração que foi aprovada, na França em 2007, foi apoiada pelo então, Primeiro Ministro Nicolas Sarkozy. A Lei endurece com os imigrantes ilegais e exige exames de DNA para comprovar a filiação daqueles que possuem parentes residindo na França. Por outro lado, na França, os imigrantes são considerados desiguais e recebem tratamento desigual. A lei fomenta a imigração qualificada, o Visto de Residência, Capacidades e Talento é incentivado, e os casamentos mistos são dificultados. O pleno direito dos clandestinos com mais de dez anos no país é revogado e é substituído por uma regularização caso a caso. A exigência de provas regulares de domínio do idioma francês é recente.

Nem todos os franceses pensam assim e Phillippe Lioret é a prova cabal desta afirmativa. O filme de Phillip Lioret causou tanta polêmica, na França, que o Partido Socialista encaminhou um projeto de lei com o nome do filme, Bem-vindo, justamente para tentar revogar o que na França é considerado crime. Ou seja, o delito de ser solidário! O código de Entrada e Estadia de Estrangeiros penaliza com a prisão de cinco anos e multa de 30.000 euros, o francês que ajudar a melhorar a vida dos imigrantes ilegais. São os artigos L622-1 e L622-4 desse Código.

Não perca o filme de Philippe Lioret que é verdadeira prova de que o cinema pode mudar o mundo.


sexta-feira, 21 de agosto de 2009

EM TEMPOS DE PAZ

O diálogo entre Segismundo e Clausewitz emociona e nos leva às lágrimas. O período é o final da Segunda Guerra Mundial, quando o Brasil se preparava para os tempos de paz. O filme é uma adaptação da peça de teatro “Novas Diretrizes em Tempos de Paz”, dirigida por Ariela Goldmann e interpretada por Dan Stulbach e Tony Ramos. O texto é de Bosco Brasil e recebeu diversos prêmios em 2002. Que bom, que existe no Brasil, no meu tempo, um diretor como Daniel Filho, que traz para o cinema e para nós esse belo espetáculo.

Dan Stulbach encanta no filme, interpretando um Clausewitz inesquecível. Lembro quando o encontrei em uma cafeteria do Arteplex, em São Paulo. Ele estava conversando com o Luiz Carlos Merten, eu estava junto e timidamente tive coragem de dizer: “Bah! mas ao vivo és muito mais bonito que na televisão”. Fiquei feliz por conseguir dizer o que pensava, mesmo que passasse por bobinha. Pois, fã é fã em qualquer lugar, e continuo fã de carteirinha de Stulbach.

O ator está perfeito no papel de Clausewitz. Sua interpretação é exagerada, é perfeita para o personagem. Ele se supera numa interpretação teatral e dramática, entremeada por momentos de comicidade e sutil ironia, que aliviam a tensão do espectador. O que encanta é sua inteligência, perspicácia, honestidade e uma ponta de ingenuidade. Dan Stulbach lavou a alma, representou com afetação e fez um Clausewitz surpreendente, que provoca o riso e o choro. O sotaque polonês é um dos pontos altos da interpretação. Lembra um pouco Tom Hanks em “O Terminal”.

Poderíamos dizer que o filme é um ensaio sobre a maldade, que ronda nossas almas e nossos corações. A narrativa mostra dois personagens, opostos em tudo, Clausewitz e Segismundo.

Clausewitz é o ator polonês que perdeu tudo na guerra e chega ao porto do Rio de Janeiro, sem nada nas mãos. Sem bagagem, até o chapéu voou com o vento quando o navio atracou.

Segismundo é o interrogador oficial do Estado Novo, de Getúlio Vargas, homem de confiança do presidente. O ”padrinho” o trouxera do Rio Grande do Sul. A presença de Segismundo, em tempos de paz causa desconforto aos membros do governo. A tradição militar do Sul produziu muitos presidentes e generais de ditaduras. Todos eles provavelmente traziam seus “homens de confiança”, como Honório, o companheiro de trabalho de Segismundo.

A voz do outro lado da linha alerta a Segismundo - poderia ser o próprio Getúlio -, que muitos prisioneiros receberão indultos e poderão procurá-lo. Por isso aconselha-o a tirar alguns dias de férias em casa. O retrato do Brasil, em poucas pinceladas está escancarado no filme. Nos porões, nas masmorras, todo tipo de documento era arquivado. A maioria era obtida, quem sabe, por meios escusos.

Quando Clausewitz desembarca provoca desconfiança nas autoridades alfandegárias. Sabe português e recita versos de Carlos Drummond de Andrade:

- “Não serei poeta de um mundo caduco”.

Ao mesmo tempo, se diz agricultor. Para o cúmulo não carrega uma mala sequer. É preso e escoltado por corredores escuros e úmidos para muitos níveis abaixo do solo. Os elevadores descem para as masmorras, onde os presos políticos são interrogados. E me pergunto, por que temos tanto medo dos porões? Dos porões da ditadura sempre sentimos verdadeiro pavor, e generalizamos, tendo medo dos porões. Porque ali são liberados os maus instintos? Mas o porão é apenas um espaço a que pode ser dado um uso indevido. Oferece proteção tanto para o bem, como para o mal. Em Tempos de Paz, com certeza, os porões escondiam e protegiam os mais terríveis e sórdidos segredos... Por isso nos assustam. Em abril de 1945 eram o coração do país, o centro e o sal da terra, como afirmava Segismundo.

Ali, no escuro, sem janelas, com alguns focos de luz, no máximo, Segismundo sente-se à vontade, em seu mundo. Ali ele domina, é o todo poderoso. Entre os dois se estabelece uma espécie de duelo. Clausewitz é desafiado a fazer Segismundo chorar em dez minutos. E vem o bate e volta. Clausewitz se atreve a questionar candidamente o torturador:

- “Mas isso está no Regulamento?” (risos na platéia).
–“Eu sou o Regulamento” (responde Segismundo).

Clausewitz precisa responder às perguntas:

-“Porque é agricultor? Se na verdade mais parece um intelectual? Como é possível saber português aprendendo sozinho? Como é possível não ter bagagem, quando tantos imigrantes chegam ao Brasil, carregando malas e objetos?

Clausewitz responde:

“- Eu era ator de teatro, mas com esta guerra, este mundo não precisa de atores, agora sou agricultor, o Brasil precisa de braços para a lavoura”.

Clausewitz fica tão nervoso, quando sabe que tem dez minutos para fazer seu algoz chorar, que não consegue concentrar-se na narrativa. No impasse, explica porque é pior que Segismundo:

– “Porque eu vi tudo, vi minha família e meus amigos morrerem e não fiz nada. Eu estava presente, quando meu amigo morreu e não fiz nada, eu estava presente quando meu professor de latim morreu e não fiz nada. Eu sou pior do que o senhor porque vi tudo e não fiz nada. Eu sobrevivi, por isso sou pior que o senhor”.

Nesse momento sem saber, Clausewitz inicia o processo de sensibilização do torturador. Segismundo fica pasmo quando seu oponente vê nele alguém que talvez não seja a pior das criaturas. Segismundo sabe o quanto é mau. Então ele fala sobre o seu ofício. Diz tudo em português e escandaliza Clausewitz. Segismundo argumenta que fez o que fez porque obedecia ordens. Tenta eximir-se da responsabilidade diante de sua conduta criminosa. Tenta imputar a seus superiores a responsabilidade pela própria maldade. Para aliviar-se do sentimento de culpa, imputa ao outro a responsabilidade pela própria maldade. Desta forma, sente-se à vontade para deliciar-se com o sofrimento de suas vítimas, com seu falso sentimento de poder, com sua ânsia de destruir o outro. Mas o ser humano tem livre arbítrio. O fato é que fez o que fez porque quis. Segismundo conhece o seu “métier”, não tem problemas de consciência. Assim como a personagem do filme “O Leitor”, que não abriu as portas da igreja para salvar os judeus, porque não quis fazê-lo, e não porque obedecia ordens.

Para mostrar o seu grau de maldade, para mostrar que é pior que Clausewitz, Segismundo conta como esmagou a mão do médico que salvou a vida de sua irmã. Essa foi a única vez que usou máscara. Mas continua enxergando os olhos do médico nos olhos da irmã. Sinal que nem tudo está perdido. O grande medo de Segismundo é enfrentar o olhar do médico.

Se em um primeiro momento, parece que nada irá sensibilizá-lo, em sua condenação voluntária ao inferno, eis que Clausewitz lhe responde:

“O senhor me fez odiar o português, eu que pensava que o português era uma língua falada por bebês, velhinhos desdentados e passarinhos. Clausewitz que como ator sempre encenara a vida, fala que quando os alemães invadiram a Polônia, entendeu que tinha chegado a hora de viver a vida. Ficou em casa e viu a vida pela janela. Viu seu pai, seus amigos e sua mulher morrerem. E conclui, não vivi, colecionei lembranças. Escapei, sobrevivi, estive presente e não fiz nada, por isso – afirma - sou pior que o senhor”.

No auge da dramatização encena o que afirma ser a morte do professor de latim. Num ato infrator, Clausewitz faz o que sabe fazer. Encena e representa um texto que fala de liberdade. Diz de liberdade e da morte do amigo, sem falar nela exatamente. Recita o texto do dramaturgo espanhol Calderón de la Barca, de 1635. Casualmente o personagem também se chama Segismundo:

“Apurar, ó céus, pretendo, já que me tratais assim,
que crime cometi contra a vós outros,
nascendo; que, se nasci, já entendo
qual crime hei cometido:
bastante causa há servido vossa justiça e rigor,
pois que o crime maior do homem é ter nascido.
E só quisera saber, para apurar males meus
deixando de parte, ó céus, o delito de nascer,
em que vos pude ofender por me castigardes mais?
Não nasceram os demais? Pois se eles também nasceram,
que privilégios tiveram que eu não gozei jamais?
Nasce a ave, e com as graças que lhe dão beleza suma,
apenas é flor de pluma, ou ramalhete com asas,
quando as etéreas plagas corta com velocidade,
negando-se à piedade do ninho que deixa em calma:
só eu, que tenho mais alma, tenho menos liberdade?
Nasce a fera e com a pele
que desenham manchas bela
apenas é signo de estrelas (graças ao douto pincel),
quando atrevida e cruel,
a humana necessidade lhe ensina a ter crueldade,
monstro de seu labirinto:
só eu, com melhor instinto, tenho menos liberdade?
Nasce o peixe, e não respira,
aborto de ovas e lamas, e apenas baixel de escamas
por sobre as ondas se mira,
quando a toda a parte gira, num medir da imensidade
o'a tanta capacidade que lhe dá o centro frio:
só eu, com mais alvedrio, tenho menos liberdade?
Nasce o arroio,
uma cobra que entre as flores se desata,
a apenas, serpe de prata,
por entre as flores se desdobra, já, cantor, celebra a obra da natura em piedade
que lhe dá a majestade do campo aberto à descida:
só eu que tenho menos vida, tenho menos liberdade?
Em chegando a esta paixão um vulcão, um Etna feito,
quisera arrancar do peito Pedaços do coração que lei,
justiça, ou razão, nega aos homens- ó céu grave!
- privilégio tão suave, exceção tão principal,
que Deus a deu a um cristal, ao peixe, à fera, e a uma ave?

Segismundo pára, arregala os olhos como que atingido pelo raio da emoção. Lágrimas pingam de seus olhos. Nesse momento se estabelece a cumplicidade entre dominado e dominador, entre o bem e o mal. Sabemos, bem e mal andam juntos. Clausewitz vence porque soube reconhecer um pontinho frágil, dentro do mar de maldade que domina o ser de seu opositor.

O golpe de misericórdia no torturador foi a lágrima derrubada por Segismundo que mancha assegura o Salvo Conduto de Clausewitz. Agora Segismundo sente-se fascinado pelo outro. Não pára de pensar em Clausewitz, hipnotizado, segue-o com os olhos. Sentimo-nos elevados e inundados pela emoção.

E Clausewitz faz o que sempre soube fazer, representar:

- “Eu sou um ator, esta é a minha profissão, só sei que tenho que continuar a fazer o que eu sei fazer, para mim, basta fazer...”

E, é isso mesmo o que todos deveríamos fazer. Fazer o que sabemos fazer.


segunda-feira, 17 de agosto de 2009

MARIDO POR ACASO

Aproveite esta vida, olhe que não vai ter outra. Ouvi este conselho em um programa de televisão esta semana. Partindo desta máxima, aproveite esta vida com alguém mais intuitivo, mais sentimental, mais bonito, mais jovem, mais rude, mais sexy, mais divertido, não importa sua situação econômica, não importa se ele não é intelectual como você.

Esses são os valores do filme Marido por Acaso. O argumento é antigo e o vimos, em inúmeros filmes. O diretor Griffin Dunne dirigiu filmes como Depois de Horas, Imensidão Azul, Perfume, Shrink, Duke of Grove, Da magia à Sedução e muitos outros. Nasceu em Nova York, e as belas panorâmicas atestam o seu amor pela cidade. Da cobertura do arranha-céu da editora vemos a belíssima Nova York, com o Chrysler Building de um lado e o Empire State do outro.

O diferencial de Marido por acaso é o elenco, de primeira, Uma Thurman, Jeffrey Dean Morgan, Colin Firth, Sam Shepard, Isabela Rossellini e Brooke Adams.
Uma Thurman é ótima, é uma mulher bonita, alta e talentosa. Fez inúmeros filmes como Ligações Perigosas, Uma mulher para dois, Pulp Fiction, Batman & Robin, Gattaca, Kill Bill e tantos outros.

Jeffrey Dean Morgan ficou conhecido na série Greys Anatomy, onde é o paciente Denny Duquette; é o John Winchester em Sobrenatural e é Judah Botwin em Weeds.

Sam Shepard é famoso desde os Os eleitos (1983), Paris Texas, Crimes do Coração, O dossiê Pelicano, O assassinato de Jesse James pelo covarde Robert Ford e outros. Para quem conhece o ator, foi possível constatar que não envelheceu bem, enfim, c’est la vie... Shepard é casado com Jessica Lange, uma grande atriz. Em Cinzas no Paraíso (1978) ele contracenava com Brooke Adams. O filme era um drama daqueles inesquecíveis. Veja só, quase trinta anos depois, os dois voltam a contracenar em Maridos por acaso. Se Shepard envelheceu mal, ela está quase irreconhecível. O tempo foi implacável com Brooke Adams, que transformou-se em uma senhora idosa e muito feiosa, não dá para acreditar.

Colin Firth faz o noivo sem graça que perde para o jovem bombeiro, grandalhão e bonitão. Justamente Colin de quem não gosto nenhum pouquinho. O diretor Griffin Dunne o escolheu muito bem. Ficou perfeito no papel de Richard Bretton. Diverte a platéia quando fica nervoso e se põe a comer tudo o que vê pela frente. Parece alguém que eu conheço muito! He, he, he.

Finalmente, Isabela Rosselini, a filha de Ingrid Bergman e Roberto Rossellini veio para confirmar seu charme e simpatia.

A dra. Emma Lloyd é uma consultora sentimental, que diariamente distribui seus conselhos pela telinha, sem ter a menor noção do efeito que causa em muitas ouvintes. Inadvertidamente destrói os planos do bombeiro Patrick Sullivan (Jeffrey Dean Morgan), quando aconselha a noiva a pensar melhor sobre o casamento que estava prestes a acontecer.

Uma Thurman é uma bela mulher, mas está magra demais, é muito alta mesmo, parece uma garça. Tanto que a família adotiva indiana de Patrick a chamava de moça alta. Como ele era mais alto ainda, tudo bem!

Para vingar-se, Patrick consegue casar-se com Emma, via internet, sem que ela tome conhecimento do fato. Tudo graças aos conhecimentos de seu amigo, indiano e hacker.

A partir daí, a vida da dra. Emma vira de cabeça para baixo até ela descobrir que seu marido de papel é bem mais interessante que aquele com quem pretendia casar. Além do que é simpático e irresistível.


quinta-feira, 13 de agosto de 2009

HORAS DE VERÃO

“Ó nostalgia dos lugares que não foram
Bastante amados na hora passageira.
Quem me dera devolver-lhes de longe
O gesto esquecido, a ação suplementar.”

Esses versos dizem muito sobre a vida de cada um de nós. São do poeta Rainer Maria Rilke. Amo Rilke. Em minha opinião, por si próprios, os versos dizem sobre a sensibilidade do grande poeta.

A casa de Helène, deixada como herança para seus filhos é o tema do filme Horas de Verão, dirigido por Olivier Assayas, que foi crítico da revista Cahiers du Cinema. Quando pais, avós ou outros familiares morrem, as pessoas lembram os momentos de felicidade, que tiveram juntos. Como pano de fundo das lembranças está presente a casa, suas temperaturas e seus cheiros, o aconchego, o mobiliário, os doces, os almoços em família, os jardins e o perfume das flores, os bons e os maus momentos. Por isso a relação com Rilke. Na hora passageira os lugares não são bastante amados, embora, em nosso imaginário essas lembranças possam durar uma vida inteira. Poderíamos passear de olhos fechados por dentro desses espaços, que agora pertencem somente às nossas lembranças. Não temos consciência dos efêmeros momentos de felicidade.

Assim, em Horas de Verão, Olivier Assayas faz referência às férias de verão da família e traz um pouco do pensamento de Rilke. Mas o filme não agrada. Não aprofunda conflitos, diferenças e divergências entre os personagens. Embora a temática possua um grande potencial.

A vida da mãe Helène não teve eco junto ao espectador, embora a atriz, Edith Scob seja uma mulher interessante. Helène dedicou sua vida a preservar a memória e a obra de Paul Berthier, um pintor famoso, com quem teve um relacionamento amoroso. O caso precisou ser escondido da família. A casa era do tio, e a mãe sempre manteve a idéia fixa de conservá-la.

Frédéric (Charles Berling), o filho mais velho é o único que conhecia Berthier. Os outros dois, Adrienne (Juliete Binoche) e Jérémie (Jérémie Renier), não o conheceram e não sentiam a menor vontade de preservar a casa. Em conversa entre irmãos, um deles confessa, que sentia muito pelo sofrimento do pai, um serralheiro (ou ferreiro?), que era tratado como inferior, e sentia-se como tal. Mas era o pai quem pagava todas as contas.

Quando a mãe morre deixa como espólio toda a propriedade para os três filhos. A narrativa mostra as divergências e conflitos que surgem, mas não conta toda a história, nem as razões dos problemas familiares anteriores.

Adrienne e Jérémie pertencem a uma nova geração francesa, que não possui nenhum sentimento ou gosto pela tradição. A burguesia francesa historicamente tem cultivado os valores e a força da tradição. Na França, persiste o gosto pela tradição. Ao contrário, os franceses não apreciam a sociedade de consumo norte-americana. A geração de Adrienne e Jérémie coloca por terra os dois mitos. Adrienne é designer e mora em Nova York, pretende casar, comprar apartamento e continuar vivendo nos Estados Unidos.

Jérémie trabalha em Pequim, onde vive com a mulher e três filhos. Pretende que seu filho estude em São Francisco. Nenhum dos dois reconhece a força da tradição familiar, e não pretendem voltar à casa grande no verão. A tradição da família, os quadros de Corot, os móveis desejados pelo Museu D’Orsay, nada disso lhes interessa. O melhor é vender tudo.

Assim o conflito entre os filhos pela herança e pela tradição, que daria um drama rasgado em um filme latino americano, na França é blasé. Frédéric como única voz destoante é voto vencido e se conforma rápido demais. É o único personagem que tem a nossa simpatia. Juliette Binoche não fica bem com a cabeleira loura, e faz uma criatura insensível, que não tem muito a dizer. Também desaparece antes do final.

Frédéric no máximo faz menção à alienação de objetos expostos em galerias ou museus, que se tornam esvaziados de seu valor verdadeiro e de seu contexto, transformando-se em simples mercadorias. Frédéric acha que as obras de arte estão aprisionadas, quando as encontra em exposição. Sofre com isso. Sofre quando vê os objetos de seu cotidiano aprisionados em exposições. Supervalorizados em leilões de arte, como o vaso de bolhas, justamente o que sua mãe não gostava, igual ao que tinha presenteado a empregada, a criatura mais pura e humilde da narrativa.

Frédéric gostaria de rever sua posição. Mas é ele que está aprisionado pela imobilidade, e não as obras de arte. Falta ação e vontade ao pobre Frédéric.

Resta o olhar de tristeza da neta, impotente, diante da casa e do jardim onde foi feliz, no convívio com a avó.


terça-feira, 11 de agosto de 2009

ALMOÇO EM AGOSTO

Almoço em Agosto fala da relação mãe e filho. O caso não é exatamente o meu, ou o seu, mas o diretor Gianni Di Gregorio consegue tornar o tema universal. Pode ser eu, sou eu lá na tela, olhe! Eu e minha mãe. Pode ser você lá na tela, olhe! Pode ser qualquer um de nós!

Almoço em agosto fala de mãe. Mãe! Não existe tema que seja mais do nosso domínio ou do nosso cotidiano. Eu, você, nós somos mães, nos sentimos mães, ou somos filhas e nos sentimos como tal. Embora a minha, ou a sua mãe tenham falecido, continuamos pensando e falando com elas - até alto, quem sabe... Quando acontecem aquelas coisas imperdíveis, poderíamos dizer: “Viste mãe, esta tu ias gostar.” Ou: “Viste mãe, esta tu não ias acreditar”, ou ainda “Mãe, ainda bem que não estás aqui, esta não ias agüentar”. Como Gianni, todos nós um dia cuidamos de nossas mães...

Sou mãe também, de uma Lucia que é os meus encantos. Adoro dizer as palavras: minha filha. Ela posta este blog. Também sou mãe dos cachorros, dos passarinhos e das plantas. O dr. Vinicius (o Jockyman) dizia, há muitos anos, que as plantas que cuidamos são as filhas que desejamos. Falo com meus cachorros - na língua do L - e com o passarinho que voa no meu apê. Fiz o teste de Veja, resultado, sou uma dona de cachorros tipo - mãe. Todo dia, às 8h da manhã o passarinho me espera, abro a janela e ele entra, voando é claro! Meu apê é território dele. Isso é para ressaltar minha experiência como mãe.

Fui assistir a Almoço em Agosto como “expert”, alguém que sabe tudo sobre o tema “mãe” e só tem experiência para dividir com os outros. Achei que o diretor não aprofunda as questões vitais e relevantes. Mas é um bom filme, foi premiado no Festival de Veneza de 2008.

Gianni Di Gregorio é um solitário com mais de 50 anos, mora com a mãe (Valeria di Franciscis). O filme parece ter se baseado em fatos autobiográficos. O filho é o próprio Gianni Di Gregorio, que também foi o roteirista. Ele cuida e mora com a mãe. E aqui está toda a diferença, Gianni sabe do que fala. Assim, podemos nos identificar com os dois personagens, com a mãe ou com o filho, ou com ambos, quem sabe.

O filho não faz outra coisa que não seja cuidar da mãe. Está desempregado e não tem como pagar as despesas do apartamento onde mora. O síndico propõe que Gianni cuide de sua mãe durante o feriado de 15 de agosto, o Ferragosto, que comemora a ascensão de Virgem Maria. De mota, vem junto uma tia, Maria. Tudo para perdoar parte da dívida de Gianni, que aceita o acordo placidamente e se conforta com muitos cálices de vinho branco. Aliás, só Gianni bebe em cálice, as velhinhas bebem em copo, Deus me livre. É melhor não beber vinho, do que bebê-lo em copo.

Gianni consulta um médico, a pressão mínima é 11! É muito alta, mas ele continua bebendo o seu vinho e fazendo muita comida italiana. O médico fala que é uma angina estável! Ninguém parece preocupado, só eu. Gianni não caminha e não faz dieta, mas é um bom menino, cuida bem das velhinhas. Cada uma deve tomar seus cuidados com a alimentação e medicamentos.

As melhores cenas mostram a decoração do apartamento. Casas de pessoas idosas têm detalhes interessantes, coisas antigas, bordados e crochês sobre mesas e balcões, e tem aquele cheiro. O diretor não esqueceu o relógio, nem os silêncios que acontecem nas casas dos idosos, quando o relógio bate mais forte. Quando Gianni conversa com a mãe - deitada na cama -, não ouvimos a música, só o tic-tac do relógio. O tempo custa a passar para os idosos. Mas, de repente, passa tão rápido, que os familiares percebem tarde demais.

O filme não consegue aprofundar conflitos entre as idosas, disputas, birras ou caduquices, tensões e problemas não resolvidos entre mãe e filho. Todos nós sabemos que esses problemas existem e que não é fácil cuidar dos pais na velhice.

A questão primordial, que precisa ser anotada, Gianni desobedece à mãe. Quem não sabe que elas mandam nos filhos até a morte? Sutilmente ele explica à mãe, que ela precisa aceitar mais três senhoras para os dois poderem se livrar das dívidas.

Gianni conta uma história dramática com uma boa dose de bom humor, não há como não rir com as impertinências das avós. O que dizer do visual da mãe? O que era aquela pele, seca como terra craquelê, em tempo de estiagem? Toda escura e manchada? E o que dizer da cabeleira loura, sem um fio fora do lugar? Daqueles cabelos que voam com o vento, mas não voltam? E o batom escorrendo pelas rugas? E o vestido vermelho? Era mesmo um susto. Meu preconceito não me permite aceitar um vestido daquela cor, em uma senhora idosa e todo o resto... Só rindo...

E Marina (Marina Cacciotti) a mãe de Alfonso, o síndico? Uma senhora grandalhona, cheia de babados, que ainda pensa em sexo e quando se irrita foge para beber e fumar, não ficava atrás na cafonice. Era uma senhora muito diferente e exótica, no mínimo.

Tia Maria (Maria Calì), a que veio como gorjeta, e a mãe do médico, Grazia (Grazia Cesarini Sforza) são senhoras com uma aparência convencional, semelhantes a muitas nossas amigas e conhecidas. Grazia se fazia de morta para não fazer a dieta recomendada pelo médico. Ao que parece, Gianni, Grazia, Alfonso, Marina e Maria vivem seus próprios papéis, os nomes são os mesmos.
Gianni, com conhecimento de causa observa alguns detalhes interessantes que arranham a convivência entre filho, mãe e hóspedes: A velha mãe chama muito pelo filho, até pela madrugada. Ele não consegue dormir, sempre há alguma coisa a ser feita. Na visão das mães, o filho sempre tem uma obrigação a fazer. Na visão do filho, ele só vai descansar quando um dos dois morrer.

Os dramas se transformam em comédia nas mãos de Gianni, ficam engraçados. A mãe não aceita a presença das três senhoras, e ainda por cima precisa ceder a sua televisão! Não, isso é absolutamente insuportável para uma velha senhora. E como rimos, quando Grazia não pára de falar. Gianni não consegue dormir, fica sentado, enquanto ela matraqueia a noite inteira, lembrando detalhes da infância e juventude! Velhos, sempre velhos vivendo de lembranças... E o melhor, o que era uma obrigação para Gianni transforma-se em felicidade!


sexta-feira, 7 de agosto de 2009

INIMIGO PÚBLICO No 1

L’Instinct de mort é o título perfeito para o filme. Bem ao contrário do Dillinger de Michael Mann, o verdadeiro Jacques Mesrine, esse sim, é um bandido de alma negra. O gângster francês dos anos 30 foi um grande sucesso na mídia. No filme dirigido por Jean François Richet, o próprio Mesrine admirava-se de seu sucesso nos meios de comunicação. O roteiro é assinado por Abdel Raouf Dafri, baseado na biografia do próprio personagem.

O ator Vincent Cassel com aquela cara de francês é um homem muito feio e antipático (no filme pelo menos). Ficou pior com o bigode e os cabelos escuros. Apesar de ter engordado vinte quilos para fazer o papel, ainda parece magro, com nariz de papagaio e cara de mau. Aparte a minha opinião, atualmente Vincent é um sucesso. Muito provavelmente vão dizer que ele é sexy, e coisa e tal. Para o meio midiático isso deve ser tão verdade que, além de ator, Cassel é garoto propaganda de Yves Saint Laurent. Foi escolhido para divulgar o perfume La Nuit de l’Homme. É conhecido por sua participação em filmes como “Rios Vermelhos" (2000) e "Senhores do Crime" (2007). Gosta muito do Brasil, há vinte anos visita nosso país, sabe falar português e até está construindo uma casa em Trancoso. Faz parte do elenco de À Deriva, que estreou no Hotel Bardot em Búzios, em julho.

O filme tem alguns aspectos geniais e criativos como o início, em que aparece na tela uma composição com diversos quadros com movimento, como uma história em quadrinhos. Podemos observar cada personagem nos diversos quadros e a montagem da cena. Esses elementos se repetem nas cenas finais.

O filme narra uma história verdadeira, do gângster francês, Jacques Mesrine, passada nos anos 60. O gângster teve uma vida tão agitada e com tantas reviravoltas que o filme foi dividido em duas partes. Por isso, parece incompleta esta primeira parte.

Jacques Mesrine era um homem problemático, quando volta à França depois de ter sido combatente militar na Argélia, é recebido pelos pais. A família parece ser normal, com problemas como qualquer outra, mas ele a rejeita, principalmente o pai (Michel Duchaussoy), a quem acusa de colaboracionista no período nazista. Mas não o vemos questionar a si próprio, o personagem nunca fez uma autocrítica, agia como um trator. Se o pai não prestava, ele não era muito diferente. Somente se interessava por trabalhos e golpes sujos, que aplicava com seus comparsas de crime e farras. Mesrine nunca quis ter uma vida normal.

Ao que parece o gângster tem traços marcantes, em sua personalidade, que o levam a perpetrar atos criminosos. Não é possível saber sobre a influência de fatores genéticos, emocionais ou afetivos que possam tê-lo inclinado ao crime. Por vontade própria entra para o mundo do crime e torna-se amigo de Guido (Gerard Depardieu), um famoso mafioso. Passa a ter uma vida de emoções no submundo parisiense. Um fato incontestável, Mesrine não sentia medo, esse medo que domina e paralisa as pessoas comuns, nos momentos difíceis da vida e nos nem tão difíceis. Era um furioso, extremamente agressivo, que distribuía socos e tiros a dois por três, sem o menor problema de consciência.

Quatro acontecimentos me deixaram estarrecida no filme. Procurei e não encontrei as razões de Mesrine. Na juventude uma bela jovem espanhola, Sofia (Elena Anaya ) apaixonou-se por ele. Após um tórrido romance os dois casam e tem uma filha. Quando Mesrine resolve partir com Guido para suas atividades criminosas é barrado pela mulher. A reação do gângster é tão violenta que chega a enfiar o cano do revólver na boca de Sofia. Consegue escandalizar até Guido, o mafioso, que tinha uma atitude paternal em relação a ele. Sofia some, o abandona e aos filhos! Meu Deus, se isso foi verdadeiro, é um Deus nos acuda.

Outra sequência me deixa pasma no filme, o paradoxo, um bandido tão duro e criminoso cuida dos filhos, e deixa-os com os avós – aqueles mesmos que, em sua percepção não prestavam, agora servem para cuidar dos netos. Realmente a personalidade do gângster sempre reservava uma surpresa.

Tenazmente perseguido pela polícia e por criminosos, Mesrine foge para o Canadá. Tenta legalizar sua situação na imigração, não consegue e rapidamente entra fundo no mundo do crime. O filme mostra diversos tempos de sua vida, na Espanha, em 1960; Montreal, 1968; Paris, 1969; Arizona, 1969.

Mesrine fica famoso no Canadá, foge para os Estados Unidos e é preso no Arizona, juntamente com a nova companheira, Jeanne Schneider (Cécile De France), tão fria e criminosa quanto o próprio.

Outra sequência que escandaliza a platéia é o grau de maldade que o casal reserva para o milionário que os havia empregado como jardineiro e faxineira. Bastava desagradar a dupla para entrar na mira do tiroteio, no sentido literal da palavra. Ao milionário é reservado o pior dos tratamentos. E o que dizer da morte do inimigo desafeto, que maltratara a prostituta, amiga de Mesrine? Jacques Mesrine tinha seu próprio código de ética e comportamento.

Os atos de loucura do personagem não são a maior violência no filme, mas, o tratamento reservado aos criminosos na prisão de Saint Vicent de Paul, no Canadá. O tratamento na solitária tinha por objetivo abalar a moral do prisioneiro, destruir o seu eu e sua vontade. A tortura mostrada na tela é o horror dos horrores. Mesrine está em uma solitária, número 5933, onde é torturado moral e fisicamente. Não lhe permitem dormir, o deixam nu e repetem no microfone um som ensurdecedor. Não lhe permitem fechar os olhos, a luz fica permanentemente acesa. Ao menor sinal de recuperação recebe um banho de mangueira de incêndio. Para alguma coisa serviu a biografia do personagem, a prisão de Saint Vicent de Paul foi fechada.

O gânsgster em sua vida de emoções protagonizou fugas espetaculares, e teve atitudes de herói às avessas, como quando voltou à prisão, com um único companheiro, para enfrentar os guardas e soltar os outros prisioneiros. Jacques Mesrine não aceitava autoridade, muito menos a de policiais armados até os dentes e escoltados por cães pastor alemão.

O enigmático gângster em muitos momentos ganha a simpatia do público, afinal, todos somos contraditórios. Assista ao filme e sinta a paixão louca e o instinto de morte de Jacques Mesrine.

segunda-feira, 3 de agosto de 2009

KILLSHOT

A história é uma adaptação de um romance de 1989, de Elmore Leonard. Os policiais dos anos 30 e o gangsterismo são o tema predileto do escritor. Leonard é um ex-publicitário, nascido em 1925, que há mais de 50 anos escreve romances policiais. O escritor é autor de histórias que originaram filmes como O Nome do Jogo (1995), com John Travolta e Rene Russo, Jackie Brown (1997) e Irresistível Paixão (1998).

As frases feitas dos personagens de Elmore Leonard viraram lugar comum, e se repetiram em Killshot. Em Hot Kid, o delegado Carl Webster repete a toda hora "Se eu tiver de sacar minha arma, atirarei para matar". E o personagem cumpria à risca a promessa. Em Killshot a filosofia e a regra que regem o comportamento do inflexível Blackbird, interpretado por Mickey Rourke é a mesma. Mickey Rourke estava muito melhor em O Lutador, como Blackbird está aceitável apenas.

Aliás, ou o escritor repetia as características dos personagens, ou o diretor John Madden imitou a personalidade de Hot Kid. Os espectadores deram graças a Deus, quando o tal bordão foi concretizado em Killshot. John Madden dirigiu filmes como A Prova (2005), O Capitão Corelli (2001) e Shakespeare Apaixonado (1998).

Killshot-Tiro certo pretende ser um thriller, um policial com muita ação e violência, mas tem muita violência e pouca ação. Acho que o que mais consegue é irritar o público. Mickey Rourke é o assassino ligado à Máfia canadense, que aceita como companheiro de crimes um jovem desequilibrado, trapalhão, tarado e com um grau de maldade elevado ao máximo. O engraçado é que o diretor John Madden não se preocupa em fornecer ao espectador um mínimo de informações que expliquem a existência de um personagem tão desprezível como Richie-Nix (Joseph Gordon-Levitt). Se a desculpa de Blackbird era o desejo de substituir o irmão morto, com certeza o tal personagem ofenderia o falecido. O mais paciente dos espectadores, com certeza sentiu-se irritado com a pobreza de espírito e maldade de Richie Nix. Blackbird era um assassino de origem indígena, indesejado em sua própria aldeia e possuía um mínimo de carisma como assassino. Não dá para entender como ele aceita como parceiro de crimes o insignificante Richie.

Em suas andanças em benefício do mal fazem uma tentativa frustrada de extorsão, que é involuntariamente presenciada pelo casal Colson Wayne (Thomas Jane) e Carmen Colson (Diane Lane). Wayne e Carmen estão em crise e pretendem se separar. Com a inclusão de ambos no Serviço de Proteção a Testemunhas pela polícia, o casal precisa ficar junto.

O interesse passa a ser mais o drama do casal, que o thriller de suspense e violência. Desta forma, toda a encenação criminosa se transforma no pano de fundo para a nova tentativa de vida em comum do casal em busca de reconciliação.

O filme mostra uma polícia tão corrupta quanto os dois assassinos, e que no final é esquecida. Os policiais somem do mapa. Richie-Nix apronta tanto e atinge o clímax como bad boy, quando cercam e prendem Carmen Wayne, em sua casa.

Antes vale citar a personagem de Donna (Rosario Watson), a mulher de Richie, que era famosa na prisão por transar com presidiários. Blackbird e Rosario sentem uma irresistível química. Surge o trio, em que Richie sobra. Qual a solução? O insignificante bandido de quinta categoria enfrentaria Blackbird, os dois disputariam a mulher? Não, seria muito normal e teria um mínimo de grandeza. Antes de partir, Richie volta. Blackbird sabe o que ele fará. Não age. O problema do filme também foi, falta de ação. Ouvimos o tiro. Blackbird e Richie seguem seu caminho. A solução foi eliminar a mulher, sem reação de um contra o outro. Que tipos de pessoas agem dessa forma?

Mas os personagens de Elmore sempre afirmaram "Se eu tiver de sacar minha arma, atirarei para matar". E o diretor leva o ódio do espectador ao máximo e, quando quase estávamos nos habituando com o não faz nada de Blackbird ele se levanta, aponta a arma para Richie e o mata. Blackbird teve um mínimo de simpatia do público, e fez o que tinha que ser feito. Aleluia!

O resto? É tão previsível, como se o diretor tivesse se alongado demais nas entrelinhas e tivesse que terminar seu filme logo! Qualquer espectador de antemão imaginaria o desfecho.



COMENTÁRIO

Pedro faz dias que estou para responder ao teu comentário sobre o filme Há tanto tempo que te amo. No cinema, temas como o deste filme, nos emocionam porque tem muito a ver conosco. Mas não sabemos localizar exatamente o que. E quando acontece de fato, uma coisa parecida conosco, aí fica tudo tão difícil de enfrentar que, o queremos é fugir da dor alheia e muitas vezes o nosso lado sombrio não consegue perdoar nunca. E teima em reviver, mesmo depois do tempo passado, aquilo que - quem sabe? - poderia ser esquecido e perdoado.

Abraço,
Doris Maria

EFEITO BORBOLETA 3: REVELAÇÃO

O Efeito Borboleta seria uma referência ao efeito analisado em 1963 por Edward Lorenz, dentro da Teoria do Caos. Segundo o qual, o bater de asas da borboleta teria o poder de influenciar o curso natural das coisas, e provocar acontecimentos imprevisíveis. Na realidade é uma interpretação alegórica. Assim no filme a capacidade que Sam tinha de viajar ao passado e alterá-lo tinha o efeito borboleta de mudar o passado e provocar acontecimentos não desejados no futuro. Na verdade acontecimentos impossíveis de acontecer. Mas, no filme acontecia tudo sim! Sam Reide tem a capacidade de voltar ao passado, assistir ao tempo perdido, como quem vê um filme e mudar o passado. Segundo a Teoria do Caos, o Efeito Borboleta acontece quando movimentos caóticos são analisados através de gráficos, sua representação passa de aleatória para padronizada depois de uma série de marcações onde o gráfico depois de analisado passa a ter o formato de uma borboleta.

Efeito Borboleta 3: Revelação é o terceiro da série . O primeiro Efeito Borboleta foi estrelado por Ashton Kutscher, provavelmente era melhor, não assisti o primeiro, nem ao segundo. Acho que perdi meu tempo com o terceiro.

O primeiro filme foi dirigido por Eric Bress e J. Mackye Gruber. O segundo foi dirigido por John R. Leonetti. O terceiro manteve na equipe somente os produtores A. J. Dix e J. C. Spink. Seth Grossman é o diretor, o mesmo de The Elephant King.

Efeito Borboleta 3 especula a possibilidade do homem voltar ao passado e alterar o futuro. Pura ficção, no filme é tão boba a possibilidade de voltar ao passado que nem dá vontade rir. Sam (Chris Carmack) entra numa banheira cheia de gelo, liga-se a eletrodotos - semelhantes aqueles que colocam nas pessoas quando elas fazem eletrocardiograma - volta em qualquer tempo do seu passado, muda o acontecimento e muda o futuro.

O que atrai as pessoas para esse tipo de ficção é a possibilidade de ver o passado e alterar o futuro. Sabemos que isso não pode acontecer, mas sonhamos. Quantas vezes não desejamos com todas as nossas forças mudar um segundo no tempo? O segundo sinistro de tantas tragédias que se abateram sobre nós, quando não aceitamos a realidade. Quantas vezes andamos como autômatos, como se aquilo não estivesse acontecendo conosco, e somos tomados pela angústia e insegurança. Parece que aquilo não está acontecendo conosco, parece que é mentira, que não é real, não queremos que seja verdadeiro, mas infelizmente é, e está acontecendo....

Queríamos que fosse diferente, gostaríamos de mudar o tempo. O “se”... isto tivesse acontecido, “se”... tivessemos esperado um segundo ou dois, aquilo não teria acontecido. Tudo é pura especulação. Mas esse “se” acontece no filme e é mudado por Sam. Ele consegue fazer o que nós gostaríamos de poder fazer. Mas as consequências são graves. Cada vez que Sam altera o passado, sobrevêm acontecimentos inesperados no futuro, com mais mortes.

Quando Sam volta ao passado e salva sua irmã Jenna (Rachel Miner) do incêndio, provoca a morte de seus pais. O acontecimento que não deveria ter sido alterado é a salvação da irmã, provocou mais mortes. Assim, Sam verifica que a cada vez que tenta alterar o passado piora as coisas. Sua namorada Rebecca Brown (Mia Serafino) é assassinada. A irmã de Rebecca, Elizabeth Brown ( Sarah Habel) pede a Sam que encontre o assassino da irmã. Ela sabe que Lonnie Flennons (Richard Wilkinson) condenado como assassino, na verdade é inocente.

Sam somente deve voltar ao passado monitorado e não deve alterá-lo, somente deve observá-lo, segundo seu amigo e mentor Harry Goldburg (Kevin Yon). Mas agora tendo seus entes queridos envolvidos Sam não resiste, muda o passado e cria o monstro, um serial killer que a cada vez mata mais mulheres.

As cenas de violência, com muito sangue são apenas para atrair o público, bem como as cenas de sexo entre Sam e a vulgar Vicky (Melissa Jones), em que os dois mais parecem uma máquina a vapor funcionando do que duas criaturas fazendo sexo, sem amor e sem alma.

O desfecho nem é tão surpreendente, quando o assassino tira o capuz é bem quem imaginávamos. Mas a história parece ser mal contada. Possui pontos interessantes, mas nem suspense tem. Além do que, o filme não é bonito, é escuro e um pouco desfocado, talvez, na tentativa de criar um passado lúgubre.

E ainda é animado por uma cantiga rap, da música hip hop, meio deslocada dentro do filme, que entre outras coisas canta: o certo não está certo, então faça o errado, e que o mal ronda você e anda muito por perto.