terça-feira, 7 de setembro de 2010

Destinos Ligados

O colombiano Rodrigo Garcia dirige e escreve o roteiro de "Destinos Ligados" (Mother and Child), produzido pelo mexicano Alejandro González Iñárritu. O tema é a adoção. Mas o filme poderia chamar-se "Esqueceram a mãe adotiva". Como isto pôde acontecer? Vejam só, Elizabeth (Naomi Watts) foi dada em adoção quando ainda era bebê por Karen (Alexandria M. Sallig), uma mãe adolescente de 14 anos. Após quarenta anos, Karen (Annette Bening) não supera a perda da filha. Elizabeth por sua vez, nunca superou o trauma da rejeição e do abandono. Teme ser abandonada mais uma vez, por isso, abandona os outros antes que a abandonem novamente.

Ao referir-se à mãe adotiva, afirma que nunca teve afinidade com ela. Resume-se a esta frase a referência que Rodrigo Garcia faz à mãe adotiva. Imperdoável, na adoção ela é uma figura importante. A história não se sustenta sem a sua presença. É verdade que o diretor cita uma candidata à mãe adotiva, Lucy (Kerry Washington), cujo destino termina cruzando-se com o de Elizabeth. Mas a mãe adotiva de Elizabeth fica no limbo.

Annette Bening é uma grande atriz, daquelas mulheres que assumem suas rugas e marcas do tempo. Convence como Karen, a mulher solitária que não se perdoa por ter abandonado seu bebê, e que passa a vida procurando-o.


O elenco não poderia ser melhor, além de Annette Bening, temos Samuel Jackson e Naomi Watts, um trio imbatível. Naomi é a advogada bem sucedida que usa o corpo para conseguir o que deseja. Mas sendo tão competente profissionalmente, de fato não precisaria fazer isso, porque o faz? A jovem loura fria não aceita a adoção, não aceita a mãe adotiva. Gostaria de punir sua mãe biológica, como isso não é possível dirige seus ressentimentos e sua dor submetendo a todos com quem se relaciona. A mãe adotiva é o primeiro alvo. Não é considerada mãe. Não serve, no mínimo é considerada a mãe má, apenas uma substituição. O alvo da mágoa é a mãe que abandona, Karen. Mas que paradoxalmente Elizabeth também procura sem parar. Enquanto não a encontra, exerce seu poder sobre todos com quem se relaciona.

Paul (Samuel Jackson), o chefe, desde o início é a figura passiva no relacionamento. Veja-se a primeira cena de sexo entre os dois, onde Elizabeth comporta-se como a fêmea dominante, quase uma abelha rainha. A personagem é trágica, leva sua teimosia ao extremo. Não aceita o amor de Paul, muito menos dividir as responsabilidades da maternidade. Elizabeth somente aproxima-se de pessoas fracas, que se deixam dominar. Até o médico parece não fazer muito esforço para exercer sua profissão com a competência necessária. Deixa-se levar por Elizabeth, e seus sentimentos auto destrutivos.

Karen, a mãe que abandona é uma personagem interessante. Mal arrumada, de cara feia, com os cabelos escorridos, está sempre muito mal humorada. De início cuida da mãe, no leito de morte. Não consegue fazer nada de bom em sua vida, enquanto não souber o paradeiro da filha. Muito menos estabelecer um bom relacionamento com a mãe. Em seu desgosto, não se relaciona bem com ninguém. Até que cai do céu o homem ideal para Karen. Acreditem, esses milagres acontecem no cinema! Bradford Alex é o colega de trabalho que se apaixona por ela, apesar de suas grosserias. Existe uma certa perversidade no comportamento das duas, Karen e Elizabeth. Aos poucos vemos Karen entregar-se ao amor. Aceitar que sua mãe conseguia relacionar-se melhor com a empregada do que com ela. Aceitar que sua mãe tenha presenteado a filha da empregada com uma correntinha de ouro.

Para traçar a trama do destino, temos Lucy (Kerry Washington) a jovem que deseja ser mãe. Aliás faz qualquer coisa para ser mãe. Para ela ser mãe adotiva não é problema. O marido fraqueja, some da história e de sua vida, muito provavelmente. Lucy é uma mulher adorável. Insegura como mãe adotiva, tenta acertar. Ah! ela não desiste nunca de querer acertar. Eis o grande mérito da personagem.

Incrível é a visão do sistema judiciário americano que - no filme pelo menos- permite que mães doadoras, como Cristi ( Simone Lopez) escolham os futuros pais adotivos de seu filho, façam entrevistas com os candidatos e o diabo a quatro. No Brasil, pelo menos, esses absurdos não acontecem, um casal somente poderá adotar legalmente uma criança, quando estas questões estiverem esclarecidas; para evitar o arrependimento da mãe após o nascimento do bebê. Lucy passou por todas essas humilhações e só conseguiu seu bebê por teimosia e persistência. Dá-lhe Lucy! Ao que parece o filho de Lucy- que era a cara do Samuel Jackson- terminou sendo uma produção independente.

Não deixe de assistir a "Destinos Ligados" para entender toda a trama e ligações do destino. E vejam, o mais incrível, "Destinos Ligados" não nos pega tanto pela emoção, parece ser mais cerebral do que pura emoção, em um tema que é só emoção.


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