Mademoiselle Chambon é um filme delicado. A direção fica a cargo de Stephane Brizé. Pensei que o nome era feminino. Não, a versão sobre o doce amor de Jean e Véronique é masculina. Desde o início o filme lembra "Agnès Varda", com seu clássico "Le Bonheur". Deste lembro as paisagens iluminadas como uma tela impressionista. A delicadeza dos personagens, os gestos, tudo parece uma obra de arte. Em Mademoiselle Chambon, como em "Le Bonheur" cria-se o triângulo amoroso. Em geral o final é tristonho como o final de tarde de Le Bonheur", com seu desfecho trágico.
Romances passageiros podem abalar a estrutura familiar. As escolhas são difíceis e precisam ser tomadas. Nada dá certo. Sabemos por antecipação, esses romances de tão efêmeros somem com o vento, mas podem deixar marcas profundas. Porque não se concretizam? Porque as pessoas não vão até o fim?
Jean (Vincent Lindon) e Véronique (Sandrine Kimberlain) se apaixonam. A paixão é verdadeira, os atores são ótimos. Tudo parece tão real que esquecemos que estamos no cinema. Véronique é professora de violino do filho de Jean. Vincent Lindon compõe um personagem instigante. É um homem casado, com uma mulher alta, morena e interessante. O casal tem um filho e ela está grávida. Assim, são pesados os compromissos do homem. Além de ajudar o filho nas lições de casa, cuida do pai. Preste atenção à divertida discussão entre pai, mãe e filho sobre o objeto direto -muito instrutiva para quem estuda francês.
Até Véronique surgir na vida de Jean tudo vai bem com a família. Quando vai buscar o filho na escola, conhece Véronique, a professora de violino. É quase amor à primeira vista. Ela é linda, alta, magra, usa saias delicadas e blusinhas de malha, tudo muito simples. Não liga muito para se arrumar, mas é de uma feminilidade sem igual. Prende o cabelo, formando o mais banal dos coques. Permanece com o mesmo penteado em quase todas as cenas. Jean é um homem interessante. Observe o seu caminhar decidido e másculo, uma graça. O olhar de Jean é revelador, você já viu homens com olhos que parecem uvas verdes? (chamam-se Dedo de Dama), os de Jean são assim, pura paixão e adoração por Véronique.
De fato, se existe uma diferença de cultura entre os dois, isso não é importante, pelo menos na França. Jean é mais que um pedreiro. É uma espécie de construtor, sem curso superior. A realidade na França é diferente do Brasil. Ao que parece, lá esses profissionais, que não são arquitetos, nem engenheiros, não são discriminados, vivem bem. Aqui o preconceito é maior, e o CREA está muito preocupado com o exercício ilegal da profissão. Afinal, não é esse o caso.
Os problemas entre Jean e sua mulher se aprofundam, as trincas começam a aparecer. Mas o que chama a atenção é o silêncio dos personagens. Não falam, não discutem seus problemas. Jean leva Véronique para observar a paisagem. Do alto, eles observam a cidade ao longe. O vento balança as árvores, forte como o vento do Rio Grande na primavera. Forte como a paixão de Jean.
Afinal não foi preciso dizer nada. Na festa de aniversário do pai de Jean, Véronique toca uma belíssima melodia. A mulher de Jean olha para ele e desvia o olhar para Véronique. Não foi preciso nenhuma palavra. Soube de tudo. O cinema é a melodia do olhar...
Você sabe, eu, todos precisamos saber que devemos aproveitar as oportunidades que passam em nossas vidas. Se não, perdemos o trem, não é mesmo? O velho ditado aplica-se à Jean. O trem aproxima-se, pára devagar para pegar seus passageiros. Véronique angustiada espera por Jean, aguarda alguns segundos na plataforma. Olha na direção onde Jean deverá aparecer. Jean perde-se nos corredores de sua indecisão. O passo diminui. Ele pára. O trem, literalmente, passa na vida de Jean ele não pega... Sabíamos que isso aconteceria. Por que ele não assume o grande amor por Véronique? Falta de coragem? Conformismo? Ama a mulher e os filhos? Mas se a ama, porque a trai? Sensação do dever? E pensamos no se... Se Jean partisse todos sofreriam, mas sobreviveriam. Seria melhor?
E agora, quanta dor e quantas lembranças para Jean e Véronique pelo resto de suas vidas...
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