quinta-feira, 2 de agosto de 2012

Valente

Valente vê as histórias de contos de fadas de uma  forma diferente. O sonho e o desejo da princesinha é outro. Não acredita no destino de encontrar um príncipe encantado, não se interessa pelos jovens pretendentes e nem eles por ela. O rei  parece um truculento gaulês, feliz com sua esposa, a rainha e seus quatro filhos, a princesinha mimosa e os três gêmeos, que mais parecem três cachorrinhos. Valente possui olhos profundamente azuis, o cabelão é vermelho, fofo e encaracolado. Lembra aquele pelego vermelho, que ganhei quando criança, minha paixão por pelegos vem daí.

A rainha mãe cumpre seu duplo papel, de rainha e de mãe. Organiza um torneio para escolher o príncipe encantado que terá a honra de casar com sua filha. Para Valente aquilo tudo é um tormento. Foge, quer mudar as idéias da mãe. Rebelde como qualquer adolescente, em passeio pela floresta - cheia de perigos - Valente encontra a casa da bruxa, cheia de objetos artesanais, mágicos e encantados. Conversa vai, conversa vem, e a bruxa faz o feitiço que mudará totalmente a maneira de ser da mãe. Era com isso que a garotinha sonhava. O bolo enfeitiçado transforma a bela rainha em uma ursa preta, muito escura e adorável, como a própria rainha. Mas uma ursa tão boba, que nem sabe que para engolir peixes inteiros, basta abrir o bocão quando eles nadam contra a corrente.

Assim, Valente trata da relação mãe-filha. Mostra que as filhas podem carregar seus problemas com as mães uma vida inteira. Podem resolvê-los aos trinta, ou aos cinquenta anos. Também podem não conseguir resolvê-los nem depois da morte da mãe. Ou, ainda podem imitar Valente, cujo grande mérito é fazer do possível ao impossível para recuperar sua relação com a mamã. A partir daí, o filme é uma delícia. A grande ursa preta, quando fica em pé, é comedida e preocupada com a filha. Muito bem comportada, é uma verdadeira rainha-mãe. Lá pelas tantas, o instinto animal que também vive dentro dela, a transforma em uma enorme ursa, gulosa e feroz, que esquece qualquer pose de rainha, esquece a própria coroa! Valente passa por todos os perigos para salvar a mãe. Antes que a aurora surja duas vezes no horizonte ela precisa remendar o que o orgulho separou. Até esse tipo de charada a pobre menina precisa decifrar.

Finalmente, com a ajuda dos gêmeos que também viraram três ursinhos sapecas, Valente lutará para libertar a mãe do feitiço. Os pais reconhecerão que é preciso respeitar as escolhas dos filhos. É preciso que cada pai e cada mãe se convença que os filhos devem ser os agentes de seu próprio destino. Se a rainha mãe pensava que poderia escolher o eleito da filha, finalmente se convence que é preciso deixá-la exercer seu esporte predileto, arco e flecha. Com certeza não tardará o dia em que Valente será flechada pelo deus do Amor. Não importa quando, ela fará a sua própria escolha.

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