Eduardo Leite, o Bacuri, nasceu em 1945 e morreu assassinado pela ditadura em
1970. Vivi esse tempo, nasci no mesmo ano e fiquei impressionada. Denise Crispin
e sua filha, Eduarda Crispin Leite, nos contam uma história estarrecedora.
Denise e Bacuri se conheceram em tempos difíceis, se apaixonaram e tiveram uma
filha, que não chegou a conhecer o pai. Histórias da ditadura no Brasil são
insuportáveis. Seria menos doloroso não assistir a filmes que falam dessa
escuridão... Sei que é importante que nossos filhos conheçam essa face do
Brasil, enfim...
Denise, na foto aos 21 anos, é tão diferente da mulher sofrida que nos fala
que pensei ser outra pessoa; pensei que era uma atriz. Segundo ela, Bacuri era
um homem lindo! Além de ter sido torturado por mais de cem dias, teve o rosto e
o corpo destruídos. Denise observa que o rosto destroçado de Bacuri, para ela, é
como se sua beleza física fosse insuportável para seus algozes. Reconheci sua
foto. Deve ter saído em muitos jornais.
A história das duas mulheres é dura, um verdadeiro massacre. Mesmo assim
nesse tipo de filme às vezes, um detalhe é o que pode emocionar o espectador.
Para mim, a fala de Eduarda, no final, derruba a mais fria das criaturas.
Eduarda é linda, com os olhos do pai - adoro ver semelhanças entre pais e
filhos! A jovem fala que não conseguia dizer quem era seu pai. Tinha problemas
para assumir a identidade do pai. Não sabia o porquê, mas não queria dizer que
era filha de um prisioneiro político assassinado pelo regime militar!
Quando o governo brasileiro pede desculpas por tudo o que aconteceu, Eduarda
sente que seu sofrimento torna-se menos pesado. Sinto profunda tristeza, pelos
milhares de jovens - com a mesma idade de Eduarda - que sofreram problemas
semelhantes, e para quem ninguém pediu desculpas ou sentiu-se responsável. O
sofrimento no anonimato não é menos doloroso.
Todos os brasileiros foram privados de seus direitos, cassados de sonhos e
liberdade. Somos sobreviventes do medo e da desesperança. Maria de Medeiros é
uma mulher genial ao permitir a ambas, a realização de um ato de coragem e
libertação. Mas Denise alerta: Não vai descansar enquanto o outro lado não
contar a sua versão, sua história não terminou. Quer conhecer a versão dos
assassinos que não foram punidos até hoje. De Eduardo restam as lembranças dos
olhos azuis inesquecíveis.