quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

Ida

Ida é um filme muito bonito. Sem ser especialista atrevo-me a lembrar a frase de Glauber Rocha. Com uma câmera na mão e uma ideia na cabeça, Pawel Pawlikowski realizou uma obra de arte. Ao que parece o filme não custou os milhões de dólares das películas americanas. Em quase todas as cenas, a câmera está parada e os personagens movimentam-se contra um cenário cuidadosamente produzido, de uma beleza cinza e triste, refletindo o drama da Polônia, 17 anos depois do final da Segunda Guerra Mundial.
Preste atenção, os cenários são fragmentos pobres da cidade e das casas , mas que, na criação do artista se transformam em coisas únicas, como a cena em que Ida e o jovem trompetista estão sentados na frente de um portão de ferro. Sem a visão do diretor , seria um simples portão de uma casa humilde, na triste  Polônia. Com Pawel, transforma-se em obra de arte. O mesmo acontece quando tia e sobrinha chegam ao cemitério acompanhadas do polonês, à procura do local onde os pais da jovem estavam enterrados. Os pinheiros formam um conjunto pesado, fechado e lúgubre, como arte fotográfica. 
A beleza das cenas se repete. Ida não “pega” o espectador pela emoção, mas pela estética. Cada quadro é cuidadosamente estudado, indiferente se é um close ou um plano geral, que mostra uma estrada distante.  O formato quadrado valoriza os primeiros planos, com os rostos das personagens. Pawlikowski mostra uma cidade, onde mesmo a juíza, vive na maior simplicidade, em um ambiente gasto. Os cenários mostram a pobreza de um país desgastado pela guerra.
Ida foi deixada em um convento. Nenhum parente interessou-se por ela, nem a única tia. Antes de prestar os votos, a madre superiora à envia de volta ao mundo.
Ida é uma menina, órfã abandonada, prestes à jurar os votos e tornar-se  freira. Quando chega na casa da tia, descobre que é judia. Wanda,  a vermelha, não consegue afastar a depressão com que encara o mundo. Deixa-se levar  por um  comportamento destrutivo, bebe e fuma sem parar,  e ainda  carrega para a cama os homens que encontra nos bares…No mesmo instante em que enxerga a sobrinha, deixa cair todas as defesas e se entrega aos doces laços entre tia e sobrinha. 
Pelo menos a tia tenta mostrar o que para ela ( e para mim também) seria o melhor caminho para Ida. Quem sabe essa menina abandona essa ideia de ser freira, casa, forma uma família e tenta ser feliz?
Ida não deixa de fazer o que a madre superiora lhe propiciou - levar uma vida normal distante da reclusão do convento, com as delícias e tentações do sexo, encontrar o homem que poderia ser o companheiro de uma vida inteira.

A história se passa nos anos 60, Pawel  mostra o lado cinza da Polônia, sabe-se da perseguição e morte aos judeus, de suas casa expropriadas nào por nazistas, mas pelos próprios poloneses. De judeus não assassinados por nazistas, mas pelos próprios vizinhos! E ainda temos que ouvir a proposta indecente do assassino que troca a informação do lugar onde enterrou os pais de Ida, pelo título de posse da casa. Essa história é muito dura  para os próprios poloneses... E para retratar todo esse ambiente, ouve-se apenas a fala dos personagens, contra o cenário pesado e cinza. Trilha sonora? Raramente, apenas o som da música clássica, em um dos momentos de desespero da tia ou na explosão de vida do jovem que toca no bar em homenagem à    John Coltrane.

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