Angelina Jolie não dá a menor chance ao espectador. Os críticos podem até dizer que
seu filme está na esteira das produções de Hollywood que há um século banalizam
e pasteurizam os personagens que querem reverenciar. E daí? Garanto que o espectador
não está nem aí. Entra de cabeça e coração na alma do personagem Louis Zamperini.
Aliás, o verdadeiro Zamperini, cuja história eu desconhecia, é
um nome novo, a quem sempre poderemos
invocar como símbolo de força, tenacidade e perseverança. E ele corria! E
corria muito! Quando era adolescente, foi incentivado a correr, pelo irmão mais
velho - que doce de irmão! Mal sabia ele o quanto seu empurrão foi importante
para Louis! Eu sempre disse, o que mais as pessoas precisam é de incentivo!
Jack O’Connell, o ator, tem apenas 24 anos, é uma graça. Se
Angelina filmou em torno dele, não poderia ter feito coisa melhor. O personagem irradia força e simpatia, o sorriso com
dentes desalinhados é um verdadeiro encanto. Lembra um pouquinho o charme irresistível
de Wagner Moura. Para que mais? Passamos os 124 minutos de olho grudado em
Zamperini. Com ele, nos tornamos heróis das Olimpíadas e quase morremos na
relação de barbárie com o torturador.
Na vida real, ganhou o prêmio dos 5.000 m nas Olimpíadas de
1936, quando o herói negro teve sua medalha cassada por Hitler.
Em 1943 vai para a guerra, seu avião, um B-24, cai no Pacífico. Por
muitos dias, ele e mais dois amigos, flutuam perdidos na imensidão, ameaçados
por tubarões. Zamperini não quer nem ouvir que vão morrer. Até nisso bateram
recordes. Depois de 47 dias à deriva são resgatados e presos por um pelotão
japonês.
Aí começa o terceiro ato - drama e sofrimento. E o pior é que
tudo aconteceu de verdade. Mutsuhiro Watanabe é o japonês torturador. Não se
sabe porque uma alma se torna tão amarga e mesquinha a ponto de sentir prazer
em torturar o inimigo. Invariavelmente, explica para os prisioneiros:
- Vocês são prisioneiros de guerra, são inimigos do Japão e
receberão o tratamento dado aos inimigos.
No primeiro olhar, o torturador escolhe sua vítima. Também
ele sentiu a força de Zamperini. Watanabe, a Ave, se confundia. Não sabia até
que ponto desejava que Louis levantasse os olhos, olhasse para ele e
sustentasse um olhar desafiador. No clímax, em que o personagem é obrigado a
levantar uma enorme viga de madeira, grita, mostrando toda a pouca força que ainda
lhe resta. Mostra que é o vencedor. E, a Ave ordena-lhe que não olhe mais para ele ! Nesse instante o torturador é derrotado. É como se nesse preciso momento tivesse terminado a guerra. Enfim
Angelina Jolie explora a relação doentia que se estabelece entre torturado e
torturador.
Quando os aviões americanos sobrevoam o campo de concentração
e jogam mantimentos, Zamperini vai até o quarto de seu algoz. Encontra a foto
de um menino, pequenino, ao lado de um homem sério. Questiona-se, não entende o que aconteceu... Um ano
depois, em 1946, casa, tem filhos e ainda participa de uma Olimpíada
aos 80 anos!
O impressionante é que volta ao Japão e encontra os
japoneses que o aprisionaram. Em busca de paz e libertação, quer perdoar... A Ave,
consegue sobreviver... Sem coragem para sustentar o olhar do herói, nega-se
a encontrá-lo. Imagino que sua alma e sua vida tomaram o caminho de
Judas...
Louis Zamperini faleceu aos 97 anos, em 2014, e é um exemplo para cada
um de nós!
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