terça-feira, 16 de junho de 2009

INTRIGAS DE ESTADO

Cal McKaffrey trabalha no ''Washington Globe''. Está tão bem caracterizado que lembra o Antonio Oliveira, aquele jornalista da Zero. O cabelo desgrenhado e comprido, balança quando ele caminha - não sei como. McKaffrey é o típico jornalista que não se cuida. Alimenta-se mal, mas é o rei por onde passa. Pelo menos é muito bem recebido na loja de fast food, onde diariamente se empanturra com cheeseburgers e hot dogs, com muita gordura trans. Essas preocupações não passam por sua cabeça. Ele pensa somente na matéria que precisa fazer para descobrir os crimes que aconteceram. Sony Baker, a principal acessora de Stephen Collis - seu amigo e político - foi assassinada. Ao mesmo tempo, outros dois personagens anônimos também foram assassinados, um deles era entregador de pizzas. Tudo parece estar relacionado. Esse é o mote do thriller Intrigas de Estado.

O filme é dirigido por Kevin Macdonald e estrelado por Russel Crowe (Cal McKaffrey) e Ben Affleck (Stephen Collins). Collins é deputado do Congresso americano. É um político esperto, aliado a George Fergus (Jeff Daniels), uma velha raposa, que tem ligações perigosas com a PointCorp. Não se sabe o que houve, mas o ator adquiriu obesidade mórbida. A empresa foi fundada por militares aposentados, que tem facilidades dentro do Congresso para ganhar concorrências de serviços privados de segurança para o governo americano. O filme é uma denúncia sobre a corrupção dentro do governo. É um alerta sobre os perigos da privatização da segurança pública e da guerra. Apenas mercenários atuam no Iraque segundo as denúncias.

Yunzer - apelido carinhoso de Cal- foi encarregado pela editora Cameron Lynne (Helen Mirren) de escrever a matéria. Mas para isso, ele precisa descobrir a verdade. Quando desvenda os podres, é ameaçado por Lynne, que fica estarrecida com as repercussões do caso diante dos poderosos. Helen Mirren é uma mulher charmosa, uma excelente atriz e continua linda no auge dos seus 63 anos.

Della Fry (Raquel McAdams), a jovem jornalista tem interesses profissionais na edição do caso e forma uma dupla com Cal. Para isso eles precisam disputar as evidências e provas do crime com o detetive, encarregado do caso, que não aceita a intromissão dos dois.

Corrupção, crime, favorecimentos e enriquecimentos ilícitos, paixões ocultas e exploração, todos são ingredientes do filme. Resta ao espectador acompanhar os passos de Russel Crowe. Ele é o personagem forte, que nos dá um pouquinho de segurança. Desajeitado para caminhar, tem um barrigão e uns olhos verdes penetrantes que o deixam mais forte ainda. Nunca entendi o ator. Ele é sexy? Para mim não é. Mas acho que o resto das mulheres discorda de mim. O que os homens pensam... Não sei. Mas que é um ator muito bom, quanto a isso, não resta a menor dúvida.

O personagem Cal se revela. O jornalista não liga para nada que não se relacione ao seu ofício. Tem seu recanto de trabalho coberto de recortes de jornais. É um solitário que não tem sequer um bicho para cuidar. Teve um affair com a mulher do amigo, Stephen Collins, que foi eleito para o Congresso e está em maus lençóis. Sony Baker, sua amante e principal acessora foi assassinada no metrô.

O interesse do filme fica por conta da atuação de Crowe, de suas aventuras e do fio da meada da corrupção, que vai desvendando até a surpresa final, embora o espectador desconfiasse desde o início.

Stephen é a própria cara da corrupção, embora faça um discurso politicamente correto, para ocultar seu verdadeiro caráter. O filme trata dos dois personagens, opostos em tudo. Ben Affleck é o protótipo do deputado; alto, magro envergando um sobretudo negro, de aparência impoluta, exatamente o contrário de seu verdadeiro caráter. Está muito magro e sem graça, com os dentes brancos e uniformes, parece que usou aparelho ortodôntico. Cal, gordo e desleixado é o paladino da verdade e da luta contra a corrupção. Ele é o jornalista sério que deseja tornar público os crimes contra o bem comum. É o defensor da liberdade de imprensa e representa com perfeição o seu papel.

A esposa do deputado, Anne Collins é interpretada por Robin Wright Penn. Desde o início, ela tenta parecer uma mulher séria e traída que sempre interessou a Cal. Mas seu ar problemático deixa o espectador desconfiado. Aliás, Robin sempre teve esse ar problemático, era a namorada do maluquinho Forrest Gamp.

O filme vale a pena ser visto porque mostra que na América, se existe a corrupção - e existe - ela pode ser denunciada e os culpados serão punidos. De fato, os valores americanos de liberdade e democracia são muitos fortes. A liberdade de imprensa é um valor caro aos americanos e isso sim, emociona o espectador e deve servir de exemplo ao Brasil, principalmente quando nos lembramos dos anos 60 e 70, quando os jornalistas tinham seus textos autocensurados para não falar em DOPS e censura verdadeira.

Faz-me lembrar o jornalista de nome Adroaldo Correa, que outro dia me abordou na Feira do Livro para explicar, que tinha demitido o Merten (meu ex), da Rádio Continental, onde os dois trabalhavam, nos idos anos 70, pelas mesmas razões de autocensura. Merten não tinha se autocensurado. Criatura! ninguém mais lembrava daquilo. Porque desenterrar uma história do passado? Eu desconhecia as razões da demissão. Deve ter sido problema de consciência. Fiquei profundamente enojada com tanta mediocridade e pobreza de espírito! Saí dali sem maiores explicações.

Assim, a sequência final é um assombro. Não sei se a platéia percebeu a beleza daquelas cenas. A filmagem mostra os passos necessários para a edição de um jornal. O papel é preparado e carregado em caminhões. As máquinas não param. A high tech imprime jornais com uma tecnologia completamente diferente da dos velhos tempos. Os jornais sobem, presos a um trilho, em uma rapidez emocionante. Finalmente são distribuídos ao público. O mundo todo sabe dos podres de Stephen Collis. E essa parte final, acompanhada por um rock balada, por si só vale o filme.

É uma emoção de fazer chorar qualquer um, não precisa ser jornalista, não precisa ter vivido no Brasil nos anos 60. A sequência é uma ode à liberdade de imprensa e os heróis são o casal que caminha tranqüilo: ela, a jovem delicada e inexperiente, ele, o gordão e balofo, que virou o grande herói. As cenas são incríveis e merecem o nosso aplauso!

Um comentário:

  1. Doris, não tenho conseguido ir ao cinema por causa do trabalho, mas ler suas críticas me ajuda a elaborar uma lista do que quero/preciso ver. Gosto dos seus posts e este sobre Intriga de Estado é empolgante.

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