quinta-feira, 28 de abril de 2011

O homem que grita, de fato é mudo

"O Homem que Grita" é o filme africano, falado em francês, que está em seus últimos dias de apresentação em Porto Alegre, exclusivamente no Cinemark do Barra Shopping. Veja que o francês de "O Homem que Grita" é mais fácil de entender do que os textos da Aliança Francesa, em Porto. O diretor Mahamat Saleh Haroun relata a realidade do Chade, um país africano que antigamente fazia parte da África Equatorial Francesa. Como sabemos, os países africanos vivem em guerra permanente, a população passa por um tipo de sofrimento cuja dimensão não temos a menor idéia, mas que apavora, sim.



Adam o personagem central (Yossouf Djaro) impressionou o júri do Festival de Cannes e o filme conquistou o Prêmio de Melhor Filme Estrangeiro. O diretor dá o seu recado ao final quando se lê o pensamento do genial poeta e dramaturgo Aimé Cesairé:"Na vida você não deve se comportar como espectador, porque a vida não é um espetáculo!"



A frase sintetiza o posicionamento equivocado do personagem perante a vida. Adam é um antigo campeão de natação, que tem seu lugar no mundo africano, como cuidador de uma piscina em um hotel frequentado por brancos. Em sua vida ele pouco participou, comportou-se como um espectador destrutivo. A situação de alienação do personagem é percebida quando verificamos que tudo o que ele deseja é reproduzir diariamente a representação do homem colonizado, negro, que ambiciona aproximar-se ou assemelhar-se ao colonizador. Adam, o homem negro permanece dominado pelo homem branco. Adam como espectador da vida, descansa na piscina do homem branco desejando ser como este. A situação de alienação do personagem tem afinidades com a análise de Franz Fanon sobre o colonizado, quando ele estuda a problemática de alienação deste, no que se refere à questão racial em Peau Noires Masques Blanches.



O personagem Adam torna-se patético ao competir com o próprio filho. Quando retira do próprio filho qualquer possibilidade de crescimento e involuntariamente condena-o à morte.



Quando Abdel (Diouc Koma) assume o cargo do pai, na piscina do hotel, Adam é obrigado a servir como porteiro. Não suporta a situação e entrega o próprio filho ao exército. O Chade vive em uma luta contínua entre governo e rebeldes. A dor que tortura o personagem durante o filme e que o torna mudo, não é apenas a dor devido à situação de guerra. Mas a suprema infelicidade que toma conta de um pai judas, que trai o próprio filho, sufoca o grito de dor da nora, Djeneba (Djénéba Koné), de quem também deseja se apoderar. O pai não aceita as conquistas do filho. Em sua autoridade, destrói o outro e a si mesmo.



Os equívocos somam-se e se agrandam. O personagem Adam nunca poderá reparar seus erros, em meio a um país que desmorona diante de uma guerra sem fim. Onde todos foge sem saber para onde. Onde nem o próprio filho se pode enterrar. Onde a paz Adam não encontrará nunca.

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