terça-feira, 23 de março de 2010

Criação (Creation)

Paul Bettany é um ator carismático. Quem o viu uma vez não esquece. Entre os filmes que protagonizou, o papel do albino Silas, em "O Código da Vinci", é um dos mais perturbadores. O frade pertencente à seita "Opus Dei ", autoflagela-se acreditando com isso estar perdoado de seus crimes e pecados.
Agora temos outro Paul Bettany, diferente mas não menos atraente, interpretando Charles Darwin, o cientista inglês que escreveu "A Origem das Espécies", revolucionou a ciência e fez avançar o conhecimento da humanidade. "Criação" é dirigido por Jon Amiel, o diretor que adora falar de casais em crise. Lembram-se de Richard Gere, sumido em "Sommersby, o Retorno de Um Estranho" , com Judie Foster, ou "Tia Júlia e o Escrivinhador", uma adaptação de Mário Vargas Llosa?
A mulher de Charles Darwin, Emma é interpretada por Jennifer Connelly. Os dois são casados na vida real. Assim devem ter se emocionado em dobro vivendo o par apaixonado e problemático.
"Creation" mostra o grande dilema de Darwin inseguro entre divulgar o resultado de suas pesquisas ou aceitar o mito da Criação, que ainda vigorava no mundo, com certeza em sua cidade, na visão do reverendo local e da própria mulher. O drama maior é consigo mesmo. Embora seus estudos e pesquisas evidenciassem o contrário, segundo suas próprias palavras "não parece haver qualquer incompatibilidade entre a aceitação da teoria evolucionista e a crença em Deus". Darwin continua : "Evito colocar meu pensamento na Religião quando trato de Ciência." Quando as pesquisas avançam, afirma que está cada vez mais distante da crença em Deus. No fundo, o que mais teme é a oposição entre Razão e Fé. Sente-se profundamente inseguro das consequências advindas da publicação de "A Origem das Espécies". Podem resultar em resistência ao próprio autor, num âmbito social, religioso e no casamento.
Emma, uma mulher excessivamente austera e religiosa, não aceita o trabalho do marido, se este não envolver a palavra Fé. Ao mesmo tempo vemos o casal apaixonado, com quatro filhos, em cenas bucólicas e belíssimas. Mas, sentimos também a preferência do pai pela primogênita, Annie (Martha West). Quando a menina adoece e morre, Darwin entra em surto, fica doente, tem alucinações. Vê a filha a todo momento, fala com ela. Nenhum medicamento o salva. A medicina é atrasadíssima no século XIX.
Belo na biografia de Darwin é sua relação com Emmy. Quando o cientista, fora da realidade e tomado pelas alucinações argumenta com a mulher o quanto ama e sente falta da filha, pergunta se ela sente o mesmo. Emmy responde categoricamente: " Chega, nossa filha está morta, cuide de nós que estamos vivos!" A reação da mulher arranca o marido da confusão e do marasmo. As poções mágicas, as gotas, os banhos frios e os suadouros tornam-se desnecessários. A força e o amor de Emmy trazem Darwin de volta à vida. Hoje ele seria classificado como depressivo, tomaria antidepressivos...
Quando o gênio entrega à mulher os originais de " A Origem das Espécies" e pede uma opinião sobre sua publicação, ela constata que transformou-se em sua grande aliada, contra seus princípios religiosos. Com o aval de Emmy, Darwin sente-se seguro para publicar sua grande obra. Pasmem! O livro esgotou no primeiro dia. De causar inveja a qualquer grande escritor do século XXI, com todo o apoio da mídia.
Além de genial, Darwin é carinhoso. Observem quando ele conta para Annie a história da morte da macaquinha. Jenny praticamente falava - devia ser que nem o Rilquinho, meu cachorrinho - , esperta como ela só. Não aceita alimentos do treinador, como quem diz: "Não adianta mais". Coloca os bracinhos (?) em volta do pescoço do homem e morre. A sequência é montada em paralelo com a morte de Annie. Duas grandes perdas para Darwin, muito sofrimento, que teve de ser elaborado para que o grande gênio tivesse condições de ele próprio decidir e desenhar um novo fim para sua própria vida!


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