domingo, 22 de julho de 2012

Violeta foi para o céu

Ándres Wood, o diretor de Machuca, nos conta a vida de Violeta Parra, a cantora e compositora chilena. Desde o início Ándres nos mostra a tragédia, que fingimos não entender. O enorme olho que toma conta da tela é o olho de Violeta, mas é também o olho da galinha, do animal irracional e submisso vítima do gavião, "el gavilán". Violeta repete que "el gavilán" é devorador como o capitalismo. O povo latino-americano é também a grande vítima "d' el gavilán" . Se a música de Violeta Parra tem um enorme significado para os chilenos. Para aqueles que se sentem como eu, muito latino-americanos, o significado não é menor. Violeta retrata com perfeição a vida de uma mulher muito adiante de seu tempo. Desde criança teve sua vida dedicada à música. Num clima bem pesado de bailes e muita cachaça, até pelos  problemas de alcoolismo do pai. Porque Violeta nos impressiona tanto? Talvez por suas raízes campesinas. Algo de muito verdadeiro que transborda em suas canções e que não tem a menor relação com o tradicionalismo gaúcho inventado por Barbosa Lessa. Eu vivi na campanha quando criança, nunca tinha visto essa fantasia do gaúcho e das tradições, tão falsa e sem conteúdo como nos dias de hoje. Esses gaúchos talvez nem saibam quem foi Violeta Parra, em cujo exemplo poderiam se mirar. Entre 1969-1973 (antes do golpe de Pinochet), viajei (com Luiz) ao Uruguai, Chile e Argentina para ir ao cinema e comprar os discos com música de Violeta Parra (los Parra de Chile, Isabel e Ángel Parra) e outros como Daniel Viglietti, Eduardo Falu, Los Jairas e Quilapayun. De Alfredo Zitarrosa lembro e gosto de "Pa'l que se vá"

"No te olvides del pago
si te vas pa’ la ciudad
cuanti más lejos te vayas
más te tenés que acordar.
Cierto que hay muchas cosas
que se pueden olvidar
pero algunas son olvidos
y otras son cosas nomás.
No eches en la maleta
lo que no vayas a usar
son más largos los caminos
pa’l que va carga’o de más.
Ahura que sos mocito
y ya pitás como el que más
no cambiés nunca de trillo
aunque no tengas pa’ fumar.
Y si sentís tristeza
cuando mires para atrás
no te olvides que el camino
es pa’l que viene y pa’l que va.

No te olvides del pago
si te vas pa’ la ciudad
cuanti más lejos te vayas
más te tenés que acordar.
Cuanti más lejos te vayas

Más te tenes que acordar"  e onde ele canta que "son más largos los caminos pa'l que va cargado demás"



Quem sabe esse "cargado"  pode ser também no sentido psicológico. Por isso mesmo estou tentando esvaziar as malas da minha vida. Para seguir em frente e "adelante"!  Eu me identificava com essa milonga que falava da tristeza do que se vai em busca de novos caminhos. Fomos ao Chile e íamos assistir a um show de Isabel Parra, que foi cancelado. De resto lembro do gás lacrimogênio. Credo eu nem sabia o que era aquilo. Lembro dos garçons oferecendo dólar no elevador, dos taxistas querendo a queda de Allende, e de nada mais . Somente aceitei voltar ao Chile muito mais de 30 anos depois. Fiz um móvel especial para guardar esses bolachões que foram a parte que escolhi na divisão de bens do casal. Assim, ainda tenho o disco dos companheiros de Violeta, Los Jairas, o grupo boliviano formado por Ernesto Cavour, Edgard Joffré, Julio Godoy e Gilbert Favre, o amante de Violeta Parra e por quem ela cometeu suicídio.

Violeta era uma artista que tinha consciência de seu talento e de sua capacidade. De fato era um gênio superior aos comuns mortais. Sentia necessidade de dedicar-se à sua vida artística, nem que isso significasse sacrificar a vida de seus filhos e a sua,como mãe. E, quando no Louvre  afirma que Gilbert era apenas o homem que fazia a moldura de seus quadros, dizia a mais  pura verdade. A artista era ela, Violeta e não o louro e europeu Gilbert. Quem conseguiu expor sua obra no Louvre, foi Violeta e não seu amante Gilbert. Mesmo assim, foi vítima da xenofobia dos franceses que adoram mostrar os latinos como o elefante no circo, a última atração! E o chefe de cerimônia ordenou que Violeta fosse para a cozinha comer com os serviçais. Muitobem,  fez a corajosa Violeta que o mandou " à la gran puta". O genial em Violeta é a sua evolução como artista e intérprete. Pesquisava as letras de suas músicas através de relatos de idosos, que conheciam as letras de versos que eram passados oralmente , de geração em geração. Você ouviu falar de algum artista que tivesse feito isso um dia? Eu nunca ouvi falar de ninguém. Essa é uma das razões da beleza e autenticidade única de Violeta que pode ser considerada a maior artista da América Latina. E que docemente relembramos quando termina o filme e canta " Gracias a la vida".

"Gracias a la vida, que me ha dado tanto
Me dió dos luceros que cuando los abro
Perfecto distingo lo negro del blanco
Y en alto cielo su fondo estrellado
Y en las multitudes el hombre que yo amo
Gracias a la vida, que me ha dado tanto
Me ha dado el oído, que en todo su ancho
Traba noche y dia grillos y canarios
Martirios, turbinas, ladridos, chubascos
Y la voz tan tierna de mi bien amado
Gracias a la vida, que me ha dado tanto
Me ha dado el sonido y el abecedario
Con él las palabras que pienso y declaro
Madre, amigo, hermano y luz alumbrando
La ruta del alma del que estoy amando
Gracias a la vida,que me ha dado tanto
Me ha dado la marcha de mis pies cansados
Con ellos anduve ciudades y charcos
Playas y desiertos, montañas y llanos
Y la casa tuya, tu calle y tu patio
Gracias a la vida, que me ha dado tanto
Me dió el corazón que agita su marco
Cuando miro el fruto del cerebro humano
Cuando miro el bueno tan lejos del malo
Cuando miro el fondo de tus ojos claros
Gracias a la vida, que me ha dado tanto
Me ha dado la risa y me ha dado el llanto
Así yo distingo dicha de quebranto
Los dos materiales que forman mi canto
Y el canto de ustedes que es el mismo canto
Y el canto de todos que es mi propio canto
Gracias a la vida"

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