domingo, 22 de agosto de 2010

Um Doce Olhar

"Um Doce Olhar" sobre Yusuf, na verdade são quatro doces olhares, o do diretor turco Semih Kapanoglu sobre seus personagens, o olhar do pai, do professor e do próprio menino. Com sete anos de idade, aproximadamente, Yusuf vive com os pais em uma aldeia muito distante. Seu mundo restrito não lhe oferece oportunidades de superação e crescimento.

Semih inicia filmando a floresta, verde, úmida e escura. O pai tem "Um Doce Olhar" para o filho. Vive de criar abelhas no meio da floresta, a partir do néctar de flores. Nenhuma nota musical. Os sons do filme são os da própria realidade. Como em um documentário, ouve-se o som angustiante do vento. Interessa a relação com a natureza. O tempo é outro. Não pertence ao homem mas, à natureza soberana. É o tempo do vento, das árvores balançando, do pasto que ondula como uma vasta cabeleira. Da estrada barrenta, das nuvens pressagas, da neblina e da chuva. O som do vento sempre remete ao passado de cada um. Na aldeia turca, as casas são de madeira, escuras e sombrias. A civilização parou na luz elétrica e na mochila de Yusuf.

As pessoas não falam. Temos dúvida se a mulher que serve a refeição aos dois é a mãe ou empregada. O pai de "Um Doce Olhar" é presente, mas sai para fazer seu trabalho, sem preocupar-se com a volta. Quando está perto de Yusuf incentiva-o e procura ensinar o filho. O menino é tão desprotegido, tão assustado com o mundo que parece afundar, afundar... Como se a angústia e a depressão o amarrassem com mil fios. Yusuf sente-se ameaçado. Algum de nós pensou que ser criança e superar as próprias dificuldades pode ser muito mais difícil do que já ser adulto? Essa superação parece quase impossível para Yusuf, que mais "observa" o seu pequeno mundo do que vive.

Que lugar é esse que se uma pessoa desaparece ninguém sai à procura? A submissão feminina impede a mãe de Yusuf de gritar em alto e bom som que seu marido pode estar precisando de ajuda? Como uma Penélope continua tecendo tricô à espera de Ulisses...

"Um Doce Olhar" pode ter muitos aspectos autobiográficos do diretor, e de cada um de nós. Tantas lembranças esquecidas naquela caixinha, tão bem guardada que não sabemos mais onde se encontram. Yusef não tinha irmãos para protegê-lo ou abandoná-lo. A relação com o pai é o mais importante.

Perto de outras pessoas as dificuldades aumentam. A sensação de insegurança trás todos os problemas e fraquezas. Na frente dos colegas o menino não lê, gagueja. Mas perto do pai ele falava, não falava? Como um segundo pai, o professor é paciente, aguarda o momento do estalo no aluno.

Semih completa a trilogia, o "Ovo" foi o primeiro, "Leite" o segundo e "Um Doce Olhar" é o terceiro. No original chama-se "Bal" que significa "Mel". O filme ganhou o Urso de Ouro no Festival de Berlim de 2010.

Parece que o professor sabia, sentimos um outro olhar em Yusuf quando ele observa a tristeza da mãe, que chora a ausência do pai. Com o olhar mais doce, parece querer dizer: _"Aguenta aí Mami, que eu vou te ajudar". Momento único no filme de uma beleza só de sentir, não de dizer. E ele toma degute o copo de leite que negava diariamente. O menino precisa refugiar-se na floresta que o acolhe como uma mãe, para crescer e superar a perda do pai. A raiz tortuosa da árvore transforma-se no berço de onde deverá acordar adulto, ou quase...


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