Em "E. T. o extra-terrestre" Spielberg fala de um extra-terrestre que cai na terra e deseja voltar para casa. Crianças se dedicam inteiramente a ele. Em diversos de seus filmes, Spielberg mostra os pequenos vivendo em um mundo paralelo e separado dos adultos, suas aventuras sequer são imaginadas pelos pais, cegos para os interesses dos filhos. Se no primeiro o personagem central é o E.T., em "Cavalo de Guerra" temos um dos mais belos cavalos da face da terra. Albert Narracott é o filho de camponeses, incompreendido pelos pais e que desenvolve uma grande amizade pelo animal. Spielberg mostra a vida da família de camponeses na Irlanda, em cenas tão bonitas e estudadas, com um colorido que pareceu-me ver uma gravura antiga com animação. A paisagem da Irlanda e o casario de pedras é um pedaço do paraíso. A estrutura de madeira da casa, com esteios e escoras, lembra as estruturas de madeira da Riopardinho Strassendorf. Pensei que a visão da vida dos colonos alemães em Riopardinho em 1892, com móbiliário e tudo o mais, construído pelo próprios colonos deveria ser semelhante. Albert ainda não completou 18 anos, por isso não pode ser voluntário na guerra. Na vida real, o ator Jeremy Irvine tem 21 anos. No filme, seu pai um ex-combatente de guerra na África arremata por 30 guinéus, Joey, o melhor dos cavalos. Os pais, Ted (Peter Mullan) e Rose Narracott (Emily Watson) não têm a menor noção de como aquilo modificará a vida do filho. Com paciência e amor Albert treina o cavalo para correr, saltar obstáculos e atender a um assobio. Mas Lyons (David Thewlis) o arrendador, precisa receber o pagamento. Albert e Joey conseguem salvar a família arando milagrosamente um terreno pedregoso. O personagem do pai é contraditório. Rose o desculpa perante o filho. Em sua visão, Ted é um ex-combatente e um herói. Cheio de medalhas, se envergonha pelo que fez na guerra. Intempestivamente como compra o cavalo, o vende para um Capitão inglês, da Primeira Guerra Mundial. A data é 1918, quando Alemanha e Inglaterra tornaram-se inimigas. Albert tenta alistar-se como voluntário, para acompanhar Joey, não consegue. Spielberg aborda a guerra em "O Império do Sol', "A lista de Schindler" e "O resgate do soldado Ryan". À trilogia soma-se "Cavalo de Guerra", um épico, com cenas dramáticas que lembram "E o vento levou". Alternadamente vemos os tempos de paz com suas paisagens de paraíso e o inferno da guerra, onde todos perdem tudo. Essas palavras são pronunciadas pelo avô de Emilie - outra família que se envolve com Joey - e dão a verdadeira dimensão do conflito. Desta família sobraram apenas a menina Emilie (Celine Buckens) e o avô, interpretado por Niels Arestrup, um grande ator. Você lembra? Arestrup interpreta o pai adotivo, em "A chave de Sarah". Joey é o personagem principal. Passo a passo troca de dono, passa por agruras e sofrimentos. O capitão inglês que o comprou morre na luta desigual entre a cavalaria e o tanque de guerra alemão. Spielberg é inigualável nas cenas em que mostra o animal desesperado, fugindo, sem dono, à galope em meio à cenas de desolação. De repente o paraíso novamente. Joey com Emilie e seu avô, um produtor de geléias, numa guerra onde todos perdem tudo. De fato, ele perderá tudo, a neta e Joey, levado pelos alemães. O momento mais dramático , o verdadeiro horror surge quando o cavalo foge à galope, em meio à cercas de arame farpado. O inferno dos infernos é o tanque de guerra que o persegue sem tréguas. A imagem de destruição é impressionante. Nada consegue segurar a fúria do desespero. Era um longo traveling avante? Sei lá, no meio de tanta emoção é preciso rever o filme. Joey salta por cima do tanque, joga-se em mil trincheiras em meio à escuridão. O corredor da morte é a trincheira vista sob a ótica do cavalo. Soldados abrem caminho para a corrida do desespero. Algum filme apresentou cenas tão dramáticas? Os tons escuros contra um céu de fogo lembram Scarlet, na carroça, em "E o vento levou" atravessando a cidade em chamas. "Cavalo de Guerra" especificamente não mostra vilões, mas a insensatez da humanidade, a sua loucura ao optar pela guerra. Os donos de Joey estão de um lado e do outro na guerra. Alemães ou ingleses não são mocinhos ou vilões. A cena genial, o soldado inglês levanta uma bandeira branca para socorrer Joey que está semi morto atado por mil fios de arame farpado. Spielberg, o pacifista, mostra os mil e um alicates que saltam do nada, jogados pelos alemães para cortar os fios que prendem e matam o animal. A visão pacifista do diretor mostra o inglês e o alemão apertando as mãos, um presenteando o outro com um alicate, para não esquecer o amigo de Dusseldorf. Joey o mais belo e o melhor dos cavalos salvou muitas vidas e foi salvo por seus donos. Emilie escondeu Joey e o corcel negro que o acompanhava, em seu quarto de menina. O avô, quando soube do cavalo assombroso que tinha sobrevivido à guerra e que seria leiolado, não precisou vê-lo para saber que era Joey. Albert seu verdadeiro dono, estava quase cego em uma cama de hospital, não precisou de olhos para saber que era Joey, o seu cavalo. Um assobio do dono salvou o animal e uma amizade de uma vida inteira. Prepare-se, você não vai aguentar a emoção e talvez chore do início ao fim do filme. Não se preocupe, vá sozinho ao cinema. Você se sentirá melhor, chorando desatinado. He, he, he!
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