L'Apollonide não é o primeiro filme francês a fazer uma crítica contundente da prostituição feminina. Apesar de toda a seriedade do diretor Bertrand Bonello, L'Appolonide cansa. Talvez até devido ao tema. Da mesma forma que na vida das prostitutas, depois de uma hora de filme, não acontece mais nada, nenhuma novidade. A crítica se faz na linha de pensamento que considera a prostituição como o resultado de um processo político, social, econômico e cultural. No final do século XIX, as prostitutas são percebidas como mulheres que se negam a assumir o papel da verdadeira mulher, ser mãe. Às mulheres é negada uma sexualidade não reprodutora. Quem o faz exerce uma sexualidade perigosa, é visto com desconfiança pela sociedade. Exatamente como nos quadros dos impressionistas e de Toulouse Lautrec, as prostitutas do bordel L'Apollonide são bem vestidas. Os piqueniques ao livre, bem ao gosto francês, reproduzem as cores luminosas dos impressionistas. Desfilam saias rodadas, busto e espartilho. Nos decotes ousados, os seios balançam como se fossem dois pudins brancos e sacudidos, no compasso do andar, como numa bandeja para quem quiser devorar. As jovens de fino trato (sic!) de hoje em dia considerariam essa moda muito recatada.
L'Apollonide não possui um enredo sólido. As personagens são muitas , o espectador não se fixa em nenhuma. O tema é delicado e tão antigo quando a humanidade. Porém sempre que se houve uma história de prostitutas elas são vítimas infelizes de uma sociedade preconceituosa. Ah, e levam uma vida paralela, onde exercem o papel de mães dedicadas. Melina Mercouri foi a única prostituta feliz que vi em "Nunca aos domingos".
L'Apollonide segue à regra. A sexualidade das prostitutas é mostrada como uma prática feminina, degradante e transgressora. No filme, essa percepção é apoiada pelo governo e médicos, que desejam estender às prostitutas uma autoridade normativa e cultural. Quatro delas chamam a atenção a jovem loira com um corpão de modelo de artistas como Degas, e que usava um quimono japonês para atrair a atenção dos frequentadores do bordel. A que contraiu sífilis, a "Mulher que ri", eu diria "A mulher Coringa" - o personagem do Batman - e a magrinha viciada em ópio? O que causa estranheza é que nenhuma delas foi obrigada a ir para o bordel. Ao que parece entre as classes proletárias vigorava a percepção de que a prostituta de um bordel fechado ganhavam mais dinheiro, podia comprar vestidos caros e tinha mais tempo livre. L'Apollonide nos mostra a degradação de cada uma. O pior mesmo é ter uma sexualidade de segunda mão subserviente do prazer masculino. A sexualidade é tão perigosa que coloca em risco tanto a saúde, como a vida das prostitutas. A "Mulher que Ri" teve os cantos da boca rasgados à faca, no grito, enquanto estava amarrada na cama servindo a um senhor de rosto lindo e pacífico. Outras submetiam-se a voyeurs, criaturas taradas e degradadas, que elas tinham que aguentar ou optaram por isso? Existe uma solidariedade e um certo companheirismo entre as prostitutas. Muitas afirmam estar ali para conseguir pagar suas dívidas. Não conseguem nunca. Aquilo me pareceu um trabalho escravo. Quanto mais a criatura trabalha, mais deve. A proprietária do bordel exige um determinado comportamento de suas meninas, que inclui multas, em caso de não ser atendido. Para algumas, a vida coletiva é como um novo lar. Recebem novo nome, aprendem novos rituais. Aquilo pode funcionar como um sistema de apoio para o grupo. No final do século XIX os reformadores sociais e os médicos higienistas irritam-se com o comportamento das prostitutas. A desordem social, o contágio e a "ralé" - as prostitutas - são o verdadeiro perigo, contaminam a sociedade. São a chaga social. É preciso regenerá-alas, nem que seja através da limpeza, do banho e dos exames médicos. Alain Corbin diz que a prostituição evocava uma memória social de todos os corpos femininos resignados que serviam às necessidades físicas dos homens da classe alta em bairros respeitáveis. O Estado define seus limites, as prostitutas devem se fichar na polícia e submeter-se a exames médicos periódicos. O exame ginecológico representa a preocupação oficial com a prostituição. Mas as prostitutas consideram-no uma interferência e um ato de voyerismo. Assim, simbolicamente as meninas do L'Apollonide, la Maison Close vivem prisioneiras do sexo, em um palácio escuro e soturno. O filme não mostra nenhuma iluminação, nenhuma janela por onde possa entrar luz. Tudo são cores escuras, dourados, tapetes e decoração pesada. A janela iluminada somente enquadra a inocência quando emoldura as duas únicas crianças do filme. Veja, fique ansioso, angustiado e chateado. É isso mesmo que o diretor quer nos transmitir.
Não aguentei o filme depois de uma hora na sala. L'Apollonide parece se diluir em mil rostos e não seguir nenhum, nem mesmo o mais marcado! É um filme homeopático, se me entendem! A história...Ops, não há claramente uma história! Não acrescenta nenhuma psicologia aos personagens, que vão chegando vazios de alma e sem alma permanecendo, ao menos até uma hora ou mais de giro. Até este momento, tudo me pareceu sem propósito e meramente fotográfico. Desde a pantera negra estendida no sofá, às prostitutas andando para lá e para cá, saindo de quartos, pulando nuas no lago, lavando-se e conversando, tudo de forma a não gerar qualquer enredo, conversas ocas, tal seria estar sentado numa praça a ouvir de um e outro grupo seus diálogos. Fragmentos que nada dizem! Há esta cena chocante isolada: um cliente rasga o rosto de uma prostituta forjando-lhe um sorriso com a faca, e ali se percebe um corte logo após a tragédia (cena do rosto ensanguentado e corte) que achei abrupto desde que a história continua morna depois, não segue adiante, fica amarrada... Outro momento que sugere dar a largada no filme é quando a cafetina recebe uma carta de uma menina de 15/16 anos que diz estar interessada em ir trabalhar na casa. Tudo bem, ela chega, tem cabelos muito longos e castanhos claro, e trabalha, só! fez sentido? (Nem no filme!). Você não verá muito mais sobre esta novata até 1h e 15m de filme. Ela tem esperança de construir sua independência, sendo que verifica que as meninas trabalham para ficar devendo, a cafetina possui um caderninho em que anota as dívidas, estas se tornam tão exorbitantes a ponto de algumas garotas sonharem com um homem que lhes pague o débito e lhes torne livre da casa. É isto! Só! Não percebi o que o diretor Bonello quis contar, notei, claro, apenas o evidente: se tratava de um puteiro, se passa no fim do seculo XIX para início do XX, homens que tem dinheiro vão lá (Dãããã!). L'Apollonide precisava melhorar um pouco para ser ruim, pois transformou a sala do cinema numa sala de tolerância e haja paciência para aguentar este filminho.
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