terça-feira, 11 de agosto de 2009

ALMOÇO EM AGOSTO

Almoço em Agosto fala da relação mãe e filho. O caso não é exatamente o meu, ou o seu, mas o diretor Gianni Di Gregorio consegue tornar o tema universal. Pode ser eu, sou eu lá na tela, olhe! Eu e minha mãe. Pode ser você lá na tela, olhe! Pode ser qualquer um de nós!

Almoço em agosto fala de mãe. Mãe! Não existe tema que seja mais do nosso domínio ou do nosso cotidiano. Eu, você, nós somos mães, nos sentimos mães, ou somos filhas e nos sentimos como tal. Embora a minha, ou a sua mãe tenham falecido, continuamos pensando e falando com elas - até alto, quem sabe... Quando acontecem aquelas coisas imperdíveis, poderíamos dizer: “Viste mãe, esta tu ias gostar.” Ou: “Viste mãe, esta tu não ias acreditar”, ou ainda “Mãe, ainda bem que não estás aqui, esta não ias agüentar”. Como Gianni, todos nós um dia cuidamos de nossas mães...

Sou mãe também, de uma Lucia que é os meus encantos. Adoro dizer as palavras: minha filha. Ela posta este blog. Também sou mãe dos cachorros, dos passarinhos e das plantas. O dr. Vinicius (o Jockyman) dizia, há muitos anos, que as plantas que cuidamos são as filhas que desejamos. Falo com meus cachorros - na língua do L - e com o passarinho que voa no meu apê. Fiz o teste de Veja, resultado, sou uma dona de cachorros tipo - mãe. Todo dia, às 8h da manhã o passarinho me espera, abro a janela e ele entra, voando é claro! Meu apê é território dele. Isso é para ressaltar minha experiência como mãe.

Fui assistir a Almoço em Agosto como “expert”, alguém que sabe tudo sobre o tema “mãe” e só tem experiência para dividir com os outros. Achei que o diretor não aprofunda as questões vitais e relevantes. Mas é um bom filme, foi premiado no Festival de Veneza de 2008.

Gianni Di Gregorio é um solitário com mais de 50 anos, mora com a mãe (Valeria di Franciscis). O filme parece ter se baseado em fatos autobiográficos. O filho é o próprio Gianni Di Gregorio, que também foi o roteirista. Ele cuida e mora com a mãe. E aqui está toda a diferença, Gianni sabe do que fala. Assim, podemos nos identificar com os dois personagens, com a mãe ou com o filho, ou com ambos, quem sabe.

O filho não faz outra coisa que não seja cuidar da mãe. Está desempregado e não tem como pagar as despesas do apartamento onde mora. O síndico propõe que Gianni cuide de sua mãe durante o feriado de 15 de agosto, o Ferragosto, que comemora a ascensão de Virgem Maria. De mota, vem junto uma tia, Maria. Tudo para perdoar parte da dívida de Gianni, que aceita o acordo placidamente e se conforta com muitos cálices de vinho branco. Aliás, só Gianni bebe em cálice, as velhinhas bebem em copo, Deus me livre. É melhor não beber vinho, do que bebê-lo em copo.

Gianni consulta um médico, a pressão mínima é 11! É muito alta, mas ele continua bebendo o seu vinho e fazendo muita comida italiana. O médico fala que é uma angina estável! Ninguém parece preocupado, só eu. Gianni não caminha e não faz dieta, mas é um bom menino, cuida bem das velhinhas. Cada uma deve tomar seus cuidados com a alimentação e medicamentos.

As melhores cenas mostram a decoração do apartamento. Casas de pessoas idosas têm detalhes interessantes, coisas antigas, bordados e crochês sobre mesas e balcões, e tem aquele cheiro. O diretor não esqueceu o relógio, nem os silêncios que acontecem nas casas dos idosos, quando o relógio bate mais forte. Quando Gianni conversa com a mãe - deitada na cama -, não ouvimos a música, só o tic-tac do relógio. O tempo custa a passar para os idosos. Mas, de repente, passa tão rápido, que os familiares percebem tarde demais.

O filme não consegue aprofundar conflitos entre as idosas, disputas, birras ou caduquices, tensões e problemas não resolvidos entre mãe e filho. Todos nós sabemos que esses problemas existem e que não é fácil cuidar dos pais na velhice.

A questão primordial, que precisa ser anotada, Gianni desobedece à mãe. Quem não sabe que elas mandam nos filhos até a morte? Sutilmente ele explica à mãe, que ela precisa aceitar mais três senhoras para os dois poderem se livrar das dívidas.

Gianni conta uma história dramática com uma boa dose de bom humor, não há como não rir com as impertinências das avós. O que dizer do visual da mãe? O que era aquela pele, seca como terra craquelê, em tempo de estiagem? Toda escura e manchada? E o que dizer da cabeleira loura, sem um fio fora do lugar? Daqueles cabelos que voam com o vento, mas não voltam? E o batom escorrendo pelas rugas? E o vestido vermelho? Era mesmo um susto. Meu preconceito não me permite aceitar um vestido daquela cor, em uma senhora idosa e todo o resto... Só rindo...

E Marina (Marina Cacciotti) a mãe de Alfonso, o síndico? Uma senhora grandalhona, cheia de babados, que ainda pensa em sexo e quando se irrita foge para beber e fumar, não ficava atrás na cafonice. Era uma senhora muito diferente e exótica, no mínimo.

Tia Maria (Maria Calì), a que veio como gorjeta, e a mãe do médico, Grazia (Grazia Cesarini Sforza) são senhoras com uma aparência convencional, semelhantes a muitas nossas amigas e conhecidas. Grazia se fazia de morta para não fazer a dieta recomendada pelo médico. Ao que parece, Gianni, Grazia, Alfonso, Marina e Maria vivem seus próprios papéis, os nomes são os mesmos.
Gianni, com conhecimento de causa observa alguns detalhes interessantes que arranham a convivência entre filho, mãe e hóspedes: A velha mãe chama muito pelo filho, até pela madrugada. Ele não consegue dormir, sempre há alguma coisa a ser feita. Na visão das mães, o filho sempre tem uma obrigação a fazer. Na visão do filho, ele só vai descansar quando um dos dois morrer.

Os dramas se transformam em comédia nas mãos de Gianni, ficam engraçados. A mãe não aceita a presença das três senhoras, e ainda por cima precisa ceder a sua televisão! Não, isso é absolutamente insuportável para uma velha senhora. E como rimos, quando Grazia não pára de falar. Gianni não consegue dormir, fica sentado, enquanto ela matraqueia a noite inteira, lembrando detalhes da infância e juventude! Velhos, sempre velhos vivendo de lembranças... E o melhor, o que era uma obrigação para Gianni transforma-se em felicidade!


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