Quando terminar a sessão de cinema de "A Invenção de Hugo Cabret", olhe para trás, você verá o cinematógrafo montado por Georges Méliès- interpretado por Ben Kinsley - e quem sabe, o próprio Méliès passando o filme para você. É sobre esse encantamento do cinema que "Hugo" nos fala. No início, Martin Scorsese mostra Hugo ( Asa Butterfield) , o menino que vive entre as paredes da Central de Trens de Paris, a Gare du Nord, projetada por Jacques Hittorff, entre 1863-1864. Além da história genial de Scorsese, baseada no livro de Brian Selznick, 2007, conseguimos viver junto com Hugo em um dos melhores exemplares da arquitetura do ferro, na França. E tem mais, quando Hugo vai pesquisar na Biblioteca da Academia de Cinema de Paris, observem, o cenário é a Sala de Leitura da Biblioteca de Santa Geneviève, projetada por Henri Labrouste. Se o filme é didático, para crianças, também é uma lição de arquitetura. Aproveitem, observem as grades de ferro que os arquitetos empregavam como entrepiso, uma vez que a nova tecnologia era empregada em locais menos nobres, pois o público tinha um gosto conservador. A fachada em alvenaria revelava o gosto historicista da época.
Hugo é um menino órfão, com enormes olhos azuis, que vive escondido entre as paredes da Gare du Nord. Seu único familiar sumiu. Ninguém pode saber que ele acerta os relógios da estação em substituição ao tio. "Hugo" discorre sobre o cinema, esta máquina de fazer sonhos e enlevar o espectador para muito além de seu pequeno mundo. Se "Hugo" mostra a grande descoberta dos irmãos Lumière, 1895, mostra também a genialidade do mágico ilusionista Méliès.
Hugo é próprio diretor-menino. Como Hitchcock, Martin Scorsese se deu ao luxo de aparecer em uma única cena, procure-a. No início, o menino vive nas sombras, em um mundo limitado, como alguém que de fato não existe. Vemos o pequeno Hugo observando o mundo de dentro do número quatro do relógio, como o olho da câmera cinematográfica. Depois, Hugo observa um mundo mais amplo e vê a paisagem de Paris, também de dentro do relógio. Quando foge do guarda e se mete nos labirintos da estação, fica pendurado no ponteiro do relógio, parodiando Harold Lloyd em sua interpretação inesquecível do cinema mudo, "O Homem Mosca" (1923). Quem muito bem lembrou de Harold foi minha amiga Helena Perrone, que assistiu filmes mudos quando era criança, passados por seu tio, que tinha um cinematógrafo.
O menino vê as pequenas cenas da vida cotidiana, a senhora com seu cachorrinho que espanta um possível pretendente. O guarda (Sacha Baron Cohen), que arrasta uma perna ferida em combate, e que caça crianças órfãs; mas que também faria qualquer coisa para impressionar a florista Lisette (Emily Mortimer). O dono da pequena loja de brinquedos rouba de Hugo seu caderno de ilustrações, única lembrança do pai morto, vivido por Jude Law.
A história é esclarecida aos poucos. Hugo precisa recuperar o livro para poder consertar o fantôma. A mensagem do pai é revelada pelo pequeno robô, e tem tudo a ver com a descoberta de Hugo de seu propósito na vida. Se Scorsese não explica o que é "A Invenção de Hugo", podemos afirmar que é a sua capacidade de consertar objetos e pessoas avariados, recuperando-os e devolvendo-os a seus verdadeiros objetivos. Assim, cada um de nós tem um propósito na vida e uma razão para existir, devemos teimar e buscar nossa razão de ser. Hugo e Isabelle ( Chloe Grace Moretz) tentam devolver a Méliès sua razão de viver.
Os personagens se cruzam e se enredam. Tudo tem sua razão de ser. Martin Scorsese conta a história de Méliès, o diretor que fez mais de 500 filmes e paradoxalmente morreu na miséria. Méliès não quer ouvir falar da profissão que abandonou. Além de mostrar - agora com tecnologia 3D - os truques do diretor para seu clássico "Viagem à Lua", Scorsese, talvez lembrando-se de como foi iniciado no cinema, mostra o editor (Christopher Lee) que presenteia Hugo com um livro de Robin Hood, o proscrito.
Os personagens se cruzam e se enredam. Tudo tem sua razão de ser. Martin Scorsese conta a história de Méliès, o diretor que fez mais de 500 filmes e paradoxalmente morreu na miséria. Méliès não quer ouvir falar da profissão que abandonou. Além de mostrar - agora com tecnologia 3D - os truques do diretor para seu clássico "Viagem à Lua", Scorsese, talvez lembrando-se de como foi iniciado no cinema, mostra o editor (Christopher Lee) que presenteia Hugo com um livro de Robin Hood, o proscrito.
No enredo, Hugo encontra pessoas que amam o cinema, o professor René Tabard possibilitará resgatar Méliès de seu poço profundo. Possibilitará ao mundo rever "Viagem à Lua", e os truques de Méliès, que pintava manualmente cada fotograma de seus filmes. Se os irmãos Lumière filmavam cenas da vida cotidiana, Méliès filmava o sonho e a fantasia. Casualmente descobriu o truque do stop-action, quando deixou a câmera parada e ao voltar descobriu cenas inusitadas. Scorsese nos deixa entrever que os primeiros cineastas levaram pouco tempo para descobrir os truques da câmera; stop-action, câmera parada, close-ups, tomadas panorâmicas, quadros congelados e fusões. Levaram pouco tempo também para desenvolver as técnicas narrativas em flashbacks, flash-forwards e eventos simultâneos.
Por isso mesmo, a magia do cinema só poderia ter a grande contribuição de um mágico que fazia os truques com sua musa, a mulher amada, Jeanne Méliès. "Viagem à Lua" tem 14 minutos e foi um dos filmes mais imitados no mundo. Abriu caminho para "Flash Gordon", "Uma Odisséia no Espaço" e "Guerra nas Estrelas". Segundo Philip Kemp, em "Tudo sobre Cinema", "Viagem à Lua" é um filme sobre a violência infantil, os exploradores matam os nativos e assassinam Grand Lunar. É ligeiramente satírico, na cena do desfile, quando é dada ênfase à cerimônia de lançamento e à entrega de medalhas. A cena da Lua ficou imortalizada, no rosto humano, coberto de massa e chorando, quando o foguete entra em seu olho e em seu mundo encantado. Em ''Hugo'' atente para as cenas clássicas de perigo, quando o menino cai sobre os trilhos em busca de seu fantôma e a locomotiva se aproxima perigosamente. A cena foi repetida "n" vezes no cinema, como em "Fantômas", o empolgante policial, em cinco episódios, de Louis Feuillade.
Nos primeiros filmes, nas cenas clássicas em que o trem entrava na estação, as pessoas fugiam , levantavam correndo da sala de projeção com medo do trem que saía da tela. Não é preciso ir muito longe para sentir essa sensação. Você lembra do filme "O trem", 1964, de John Frankenheimer, com Burt Lancaster, em que o diretor abusava dessa sensação de esmagamento? Vi esse filme com meu pai, quando nós dois quase morremos esmagados, he, he, he. Agora, quando terminar o filme não esqueça de olhar para trás, você poderá ouvir Méliès lhe falando baixinho: "Você conhece a origem dos sonhos? Ela está aqui no cinema, nesta máquina de fazer sonhos! Por isso, volte sempre!"
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