quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

Lincoln

Lincoln de Spielberg é um filme diferente. É preciso estar preparado. Para apreciar é necessário despreocupar-se em querer um filme-espetáculo, com muito movimento e cenas de batalha. De fato a única cena de batalha acontece no início. Mas aguarde, tudo é uma verdadeira obra de arte. Como se você estivesse observando diversas composições de histórias em quadrinhos, que mostram cenas e atores vistos de diversos ângulos, tudo em belíssimas sequências. Afinal o que interessa nesse filme é a fala, o discurso, e o diretor utiliza recursos diferentes para trazer esta fala ao espectador. Cor, iluminação e composição lembram Rembrant, principalmente quando grupos de políticos se reúnem tramando,  intrigando e confabulando a votação da décima terceira emenda que abolirá a escravatura no Estados Unidos.  Ou ainda quando o Lincoln morto com todos a seu redor lembra a aula de anatomia, no quadro de Rembrant "A lição de anatomia do Dr. Nicolaes Tulp". 
A atuação de Daniel Day Lewis como o presidente, certamente é um marco em sua carreira. A personificação de Lincoln é absolutamente perfeita. Pergunto-me se o ator assistiu a  algum filme sobre Lincoln para recriar não apenas a figura, mas os gestos e o caminhar já cansado do grande estadista. Filme ele nunca deve ter visto, pois Lincoln é de 1865 e o cinema foi criado em 1895 pelo irmãos Lumière. É criação mesmo do genial Spielberg e de seu dramaturgo Tony Kuschner. Provavelmente vem de Kuschner a introdução da linguagem semelhante a do teatro. Há uma cena exemplar: Lincoln está sentado na sala do correio para enviar um telegrama. Dois funcionários estão sentados à sua frente, inclinados para trás e voltados para o presidente. Por alguns demorados segundos os dois permanecem imóveis, como num teatro, olhando para Lincoln, até o momento em que o presidente inicia sua fala, como no teatro.  Tudo isso é obra de gênio.
A história trata da segunda fase do governo de Lincoln, em que ele se prepara para aprovar a décima terceira emenda à Constituição dos Estados Unidos, que acaba com a escravidão.
Entre os atores coadjuvantes fico com Tommy Lee Jones, interpretando o republicano Thadeus Stevens. Quando ele discursa na assembléia argumentando com sarcasmo que votava pela igualdade perante a lei, não pela igualdade racial é absolutamente magnífico! Stevens responde à interpelação de Fernando Wood (Lee Pace), seu oponente. Assombra e surpreende o espectador com a dureza e sarcasmo de seu discurso: "Até vocês imprestáveis e indignos devem ser tratados conforme a lei." O discurso é um dos pontos altos do filme. Spielberg permite que muitos brilhem não apenas o santo Lincoln.
Como esposa do presidente, Mary Todd Lincoln (Sally Field) é uma mulher insistente, mal humorada e instável. Até Lincoln perde a paciência com ela, quando a mulher se comporta como se somente ela tivesse sofrido com a morte do filho.
Outro ator que se destaca é Michael Stuhlbarg, fazendo o democrata George Yeman, que muda seu voto e apoia Lincoln. A emoção e a figura de Yeman ao pronunciar o "sim" são  hilários! 
Enfim Lincoln mostra o grande líder dos americanos que conquistou todo um eleitorado com seu discurso de Gettyburg. Em dois minutos o presidente pronunciou as palavras mais bonitas e mais comoventes que foram capazes de mudar a história :

 "Há 87 anos, os nossos pais deram origem neste continente a uma nova Nação, concebida na Liberdade e consagrada ao princípio de que todos os homens nascem iguais....Antes, cumpre-nos a nós os presentes, dedicarmo-nos à importante tarefa que temos pela frente- que estes mortos veneráveis nos inspirem maior devoção à causa pela qual deram a última transbordante devoção- que todos nós aqui presentes solenemente admitamos que este homens náo morreram em váo, que esta Nação com a graça de Deus venha gerar uma nova Liberdade, e que o governo do povo, pelo povo e para o povo jamais desaparecerá da face da terra.''

 

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