sexta-feira, 6 de março de 2009

O CURIOSO CASO DE BENJAMIN BUTTON

O cinema entra em nossas vidas sem pedir licença e muitos filmes nos pegam desprevenidos e nos entregamos a eles, assim de cara sem termos condições de nos proteger.

Fui assistir ao “Curioso caso de Benjamin Button”, com o famoso Brad Pitt. O filme é uma espécie de reflexão sobre nossas vidas perante a relatividade do tempo. A história é baseada em um conto de Fitzgerald, de 1920, em que um homem nasce velho, com 80 anos, e aos poucos vive a vida ao contrário, vai ficando jovem com o passar do tempo.

A mãe, Daisy (Cate Blanchett ) está à morte, em uma cama de hospital. Lá fora, e entrando também através da TV, o Katrina está prestes a estourar. Faz parte da história, a preocupação da filha Caroline (Julia Ormond) em despedir-se da mãe: ela diz para Daisy que sentirá muito a sua falta.

Todos de nós passamos pelo difícil momento da morte de nossos pais. Muitas vezes não temos a coragem de falar nada para eles. Não conseguimos pronunciar uma só palavra. Se um padre medíocre, entrar no quarto do hospital e rezar, dizendo que Deus perdoe os pecados de nossos pais, nesse momento difícil, eles poderão preocupar-se com seus pecados. E então quem sabe, teremos a coragem de dizer: “Não liga mãe, Deus e os anjos com certeza estarão te esperando e nos esperando com uma banda de música, no céu”. E aí novamente poderemos ficar calados.

E meu Deus, o diário da mãe (no filme) era igual ao diário de qualquer mãe: marrom, cheio de anotações, figurinhas e fotos. Onde os parentes colocam tudo isso? Guardam dentro de gavetas, que não tem coragem de abrir jamais? Não adianta, cinema é cinema e a vida das pessoas não tem o glamour, nem a música etc. e tal.

A frase do narrador diz muito sobre tudo isso: “Nós estamos destinados a perder as pessoas que amamos, do contrário, como poderíamos saber se são importantes?“ E isso sim é verdadeiro, mas como é duro agüentar meu Deus.

Por isso mesmo, pelo tipo de reflexão a que o filme se propõe, o cenário é fechado, soturno, de cores sóbrias e sombrias. Tudo acontece a portas e janelas fechadas. Quando aparecem os exteriores, surge uma noite fantástica ou o mar, sem horizontes.

Como o período se passa entre a Primeira e a Segunda Guerra Mundial, o décor mostra uma América dos anos 30 e do Art Déco. E para os arquitetos prestarem atenção, nesse cenário surge a silhueta do Flatiron Building, na 175 Avenue, em Nova York, e o Chrysler Building. Tudo como nos cartões postais de Daisy, em tons gastos de sépia dourada. O sol aparece somente quando Benjamin é jovem, anda de moto e veste uma jaqueta de couro, como James Dean. E aquela música linda de Alexandre Desplat? Inesquecível.

Até a aventura de Benjamin com a mulher casada, Elizabeth Abbott (no filme, interpretada por Tilda Swinton) acontece a portas fechadas . O sonho de Elizabeth era atravessar, a nado, o Canal da Mancha. Ela se martiriza, por não ter conseguido seu objetivo e não ter planos para concretizá-lo.

Finalmente Benjamin fica sabendo que aos 68 anos Elizabeth conseguiu seu objetivo, afirmando o mais importante do filme, “que nunca é tarde para sermos felizes e concretizarmos nossos sonhos.” Dá-lhe Doris ainda tens algum tempo. E não esqueça, enquanto você vive: “Nunca é tarde demais para ser o que você quer ser.”

O próprio Benjamin, quando é questionado por trabalhar em um rebocador, devido a sua aparência, afirma que não há limite de idade para fazer o trabalho, basta saber e poder fazê-lo.

O filme é narrado em flashback. A mãe pede para a filha ler o seu diário, e tudo tem início com a comemoração do final da Primeira Guerra Mundial.

Os jovens mortos na guerra são homenageados pelo engenheiro cego. O pai constrói um enorme relógio que se movimenta em sentido contrário, para trás, para que simbolicamente seu filho, morto, pudesse fazer o caminho inverso e voltar para casa. Justamente nesse dia nasce Benjamin Button. A mãe morre de parto e o bebê nasce velho. Seu pai não suportando a dor, o abandona na escadaria de uma casa para idosos, onde ele é adotado por Queenie (Taraji P. Henson). E aí ele trata do abandono e do não abandono. Queenie adota Benjamin, e a adoção é uma coisa maravilhosa.

No filme, o narrador afirma que algumas pessoas nascem para ser isto ou aquilo, mas que Queenie nasceu para ser a mãe de Benjamin. Ele é o feio, o fraquinho, o velho e o diferente. Mas entre tantos idosos, até que se harmoniza com o ambiente; em que um dos moradores, a cada cena, afirma que, foi atingido sete vezes por um raio. Muitos ali com certeza já estavam vivendo com o Al (de Alzheimer)

Quantos de nós muitas vezes também estamos com o Al? Quantos de nós repetimos para nossos filhos as mesmas histórias, até que eles desabafam e dizem: “Chega mãe, não agüento mais ouvir essa história”. Viram só? Cada pedacinho de nós dentro do filme?

Benjamin sempre foi apaixonado por Daisy desde o primeiro momento em que a viu. Mas aí surge o problema da relatividade do tempo. Nesse tempo ele era velho e ela, uma menina.

Mesmo sendo o muito diferente, Benjamin consegue ir levando a sua vidinha e tendo suas pequenas vitórias. Chega a enfrentar o grande medo de voltar para casa, quando seu amigo? (quem precisa de amigos assim?) o abandona no centro da cidade, impelindo-o a voltar sozinho para casa. O que significava ter que voltar de bonde. Aquilo foi demais para o pobre Benjamin.

Quem de nós não ficou alguma vez na vida, em uma situação semelhante? Quantos de nós viemos do interior e éramos ou ainda somos tão interioranos? Quantas jovens tiveram que morar em pensionatos para poder estudar na capital? Moças do interior devem ter tido muito medo de voltar para casa depois da 11,15h da noite. Os pensionatos fechavam e as meninas não tinham onde dormir. Quantas delas não foram abordadas por carros e confundidas com prostitutas que faziam o “trottoir” noturno? Muitas até pularam os portões de entrada, ingenuamente, para evitar abordagens inconvenientes. O fato é que não estavam habituadas com aquele tipo de vida noturna nas ruas da capital. Foram motivo de deboche e brincadeiras, muitas até hoje não acharam graça nenhuma.

Benjamin, assim mesmo, com dificuldades enormes foi vencendo os obstáculos. E notou que ficava mais jovem a cada dia. É interessante observar que Button demora a parecer mais jovem. Ela, no entanto, quando inicia o namoro com Benjamin, parece uma boneca de porcelana. É uma bailarina linda, magra, belíssima.

O questionamento sobre o tempo, sobre o que podemos fazer em nossa curta existência persegue os personagens do filme, o desencontro no tempo, enquanto um fica com a aparência jovem, o outro envelhece. Surgem as dúvidas: ”Nunca sabemos o que nos espera”, ou “tudo é predeterminado ou tudo é faith”. São pensamentos que nos perseguem e devem nos tocar de alguma forma. Será que fica mais fácil dizer: “Assim estava escrito? “

Enfim esses intrigantes questionamentos surgem diversas vezes no filme, quando o narrador mostra que às vezes estamos em uma rota de colisão e não sabemos. Assim se o caminhão não tivesse se movimentado daquela forma ou o taxista não tivesse feito isto ou ela não tivesse se atrasado, Daisy não teria sido atropelada, o que modificou sua vida e destruiu seus sonhos. Enfim, assim estava escrito. E é até por isso que Daisy diz para Benjamin quando o revê, e desta vez ele está no auge da juventude: “Look at you, you are perfect”!

Quando finalmente o tempo passa destruindo todas as possibilidades de uma velhice tranqüila ao lado do bem amado, ela escreve: “A gente pode amaldiçoar o destino, mas quando chega o fim, a gente tem que aceitar”. E como uma mãe, envelhecida e enrugada Daisy embala o Benjamin-menino que já não sabe mais nada desta vida.

O filme termina com o relógio que voltou ao começo e parou, com a água do Katrina invadindo tudo, como um fim e um reinício de vida, na água, como numa placenta.

Um comentário:

  1. Olá doris!!
    Logo no primeiro parágrafo vc já descreveu tudo o q sentia sobre o cinema... "Entra em nossas vidas sem pedir licença e muitos filmes nos pegam desprevenidos e nos entregamos a eles". Este filme , O CURIOSO CASO DE BENJAMIN BUTTON me deixou por dias enamorada e me questionando sobre a vida e seus seguimentos, o filme em si é uma lição de vida!! todo conteúdo dele. houve partes em que me remetia ao tempo e pessoas que passaram por minha vida... significativas ou não!! Mas a parte em que o narrador descreve... “Nós estamos destinados a perder as pessoas que amamos, do contrário, como poderíamos saber se são importantes?“. Nossa!! foi como ser atingida em cheio pelas águas do Katrina.

    Um forte abraço...

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