quarta-feira, 11 de março de 2009

O LEITOR

O filme “O Leitor” é dirigido por Stephen Daldry, foi adaptado para o cinema da obra de Bernhard Schlink. Conta a história do jovem (David Kross), que viveu uma grande paixão na adolescência. Hanna Schmitz (Kate Winslet) é uma mulher madura que inicia o jovem Michael Berg no sexo, na paixão e num amor tão envolvente que o aprisiona pelo resto da vida.

O jovem David Kross e Kate Winslet estão perfeitos em seus papéis e merecem indicações ao Oscar. Kate neste filme está muito melhor do que em “Apenas um sonho”. Em 8 de fevereiro de 2009, um pouco depois de eu escrever este texto, Kate recebeu o prêmio de melhor atriz por sua atuação em “O Leitor’, no Orange British Academy Film Awards , no Royal Opera House em Londres. A premiação é considerada o Oscar inglês. No Oscar a atriz levou efetivamente o prêmio de Melhor Atriz.

Para o diretor interessa mostrar a personalidade de Hanna, sempre um mistério, impenetrável para o jovem Michael, e para o espectador. Todo o sentimento de inferioridade e insegurança do personagem fica escamoteado. Terminamos percebendo, quando ela fica surpresa ao ser flagrada pelo jovem, como uma simples operária, que trabalha como cobradora de um bonde, ou quando ela finge ler o cardápio, e não consegue, pois não sabe ler. Porém, a palavra analfabeta é tão forte que nem sequer é pronunciada no filme.

Percebemos também a sua condição de diferente e insegura quando ela percebe o olhar discriminatório dos estranhos, em seu passeio de bicicleta com o jovem amado, a quem ela chama de menino: “Oh boy”. Hanna poderia ser sua mãe. Se diante das fofoqueiras, Michael assume seu relacionamento com Hanna, diante da sociedade, da família e dos colegas de escola, ela sempre ficou à margem.

O filme trata também do complexo sentimento de culpa que persiste na Alemanha após a Segunda Guerra Mundial, dos que se acusam mutuamente, dos que fingem não saber e dos que como Michael involuntariamente se vêem envolvidos pela barbárie. Michael não sabia, Hanna era nazista, tinha sido guarda de um campo de concentração. O jovem não revela seu drama interior, nem para o professor, tão sábio e compreensivo. Desde o início ele era um fraco, justamente por isso ela o escolheu para amante e leitor. O menino frágil transformou-se no homem fraco, que permaneceu prisioneiro de si mesmo.

Ambos tinham seus segredos inconfessáveis. Enfim, todos têm seus segredos, não revelados, tão escondidos que muitos gostariam de queimá-los ou escondê-los de si próprios. Sabe-se lá, se um dia esses medos fossem enfrentados, talvez, poderiam parecer problemas menores.

O problema de Hanna era maior: Além de ser acusada de nazista, não aceitava não saber ler. Tinha vergonha e não suportaria jamais ser chamada de analfabeta, nunca poderia revelar essa condição. Tragicamente, preferiu assumir a culpa que lhe foi imputada - ter sido responsável pela morte de 300 judeus em um campo de concentração - do que revelar sua condição de analfabeta.

Essa condição de inferioridade seria perfeitamente assimilada no Brasil, mas não na Alemanha. Mesmo assim é o ponto fraco do filme; não existiam professoras na prisão? Como ninguém percebeu? No Brasil dos anos 60 bastaria chamar uma professora alfabetizadora, do Bernardino, na cidadezinha de Dom Pedrito, por exemplo.

Para o diretor interessa mostrar esse amor trágico, mais dramático e funesto que uma tragédia grega; e revelar a redenção dos personagens:

Michael é capaz do mais belo gesto amor, depois de negar Hanna mais de três vezes, que nem Judas negou Cristo: No bonde; quando se propõe a visitá-la na prisão, e volta atrás; quando ignora os questionamentos do professor e colegas, que percebem seu interesse pela ré; e quando fica calado no tribunal. A pedido da amante, o menino - como Hanna o chamava - lia em voz alta, a “Ilíada e a Odisséia”, a “Senhora e o cachorrinho” e outros romances. Fazia o que Hanna adorava, ouvir das pessoas e de seus amantes, a leitura de livros. Adulto, assombrado por aquele amor perdido, Michael (Ralph Fiennes) grava sua leitura em voz alta, como fazia quando jovem e envia as fitas para a prisão. Não dá para resistir, e não há como não emocionar-se com o personagem de Hanna, principalmente. E o melhor é chorar mesmo, e chorar muuiiito...

Hanna assume a culpa em um julgamento de cartas marcadas, como afirma um dos estudantes. Assume sua culpa e sua alienação. A redenção da mulher de 43 anos se faz através do gesto do amante. Ela conseguirá ler e escrever um dia, e termina lendo muito mais do que qualquer um de nós que nos consideramos alfabetizados, especialistas, mestres e até doutores. Observamos o carinho com que reúne os livros enviados por Michael. Mas não resiste é uma mulher destruída.

Quando ele entrega para a sobrevivente do campo de concentração, Ilana Mather (a belíssima Lena Olin), a latinha de chá que Hanna lhe deixara; apesar de toda a dor, ela aceita, embora esse gesto não signifique perdão, afirma.

Se até Ilana Mather aceitou a lembrança de sua algoz, porque muitos de nós negamos nossos mortos? Porque julgamos nossos mortos com tanta dureza? Porque muitos de nós não aceitamos o que sobrou deles? Nem a latinha de chá, descolorida e triste? Nem uma caixinha? Nem um pequeno bordado, porque ?????? Essa dor não se apaga?????

Michael, após tantos desencontros consegue ficar em paz consigo mesmo, ao contar sua história de amor para a filha.

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